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Coronavírus pelo mundo: Vozes da resistência – III (Inglaterra e Cuba)
Nas ruas de Londres, as máscaras como nova peça essencial (Foto Érica Dahlström Dezonne)

Coronavírus pelo mundo: Vozes da resistência – III (Inglaterra e Cuba)

Por Fábio Gallacci

Especial para a Agência Social de Notícias

Campinas, 20 de maio de 2020

(Terceira reportagem da série com depoimentos de cidadãos moradores de vários países, sobre os impactos da pandemia.)

INGLATERRA

Érica Dahlström Dezonne – Londres

(GOVERNO BRITÂNICO HESITOU NO INÍCIO E ATÉ PRIMEIRO-MINISTRO FOI INFECTADO. PALMAS PARA OS TRABALHADORES DO NHS. LIVES DE ACADEMIA PELO BEM DO CORPO. TRABALHAR MAIS O CONSUMO CONSCIENTE.)

Dados de 20 de maio de 2020, 14 horas de Brasília

Dados de 20 de maio de 2020, 14 horas de Brasília

“Vivo no bairro Hackney. Moro perto de Old Street, que é uma área bem movimentada por ter vários escritórios nos arredores e estar próximo a Shoreditch e Brick Lane, as áreas mais hipsters de Londres. No final de abril, apenas na área onde resido, já havia mais de 500 casos confirmados de Covid-19. A situação aqui é de cafés, bares, restaurantes, escritórios e o que há de comércio nos arredores fechados desde o dia 23 de março, quando a quarentena para esses tipos de trabalhares se oficializou.

A arte de rua na capital britânica e os novos hábitos (Foto Érica Dahlström Dezonne)

A arte de rua na capital britânica e os novos hábitos (Foto Érica Dahlström Dezonne)

As pessoas estão confinadas desde então, mas é possível ver um número razoável de pessoas se exercitando pelas ruas ou indo fazer compras de supermercado. Eu estou trabalhando de casa desde o dia 24 de março. Moro com o meu namorado, Kasper, que é finlandês. Ele voltou para o país dele poucos dias antes das fronteiras se fecharem por estar desempregado e não morar oficialmente em Londres, para que tivesse auxílio financeiro do governo. Foi uma decisão muito difícil pois não sabemos daqui quantos meses estaremos juntos novamente. Ele, agora, recebe auxilio do governo do seu país. Então no momento estou sozinha.

O carinho com os trabalhadores dos serviços essenciais (Foto Érica Dahlström Dezonne)

O carinho com os trabalhadores dos serviços essenciais (Foto Érica Dahlström Dezonne)

Quando eu estava ainda indo trabalhar e a pandemia ainda chegava na Europa, comecei a sentir ansiedade por estar vulnerável, dependendo de transporte público e rodeada por pessoas do dia a dia do meu trabalho. Mas por ser fotojornalista, tenho um instinto em não temer as adversidades e, logo após o Primeiro Ministro (Boris Johson, que foi infectado pelo coronavírus e se recuperou) estabelecer o lockdown, eu tinha que começar a documentar o que eu podia.

Como fotojornalista sinto que preciso documentar o máximo possível.

Vivendo sozinha, sinto por estar longe da minha família, amigos e namorado, mas por incrível que pareça, a minha ansiedade diminuiu e tenho me sentido bem, particularmente. Como fotojornalista sinto que preciso documentar o máximo possível. O que as pessoas mais estão sentindo é o caos que essa pandemia trouxe sem que ninguém esperasse. Ingleses são completamente diferentes de italianos e espanhóis. Aqui, apenas temos batido palmas todas às quintas-feiras para os trabalhadores do NHS – nosso SUS daqui. Mas ingleses pouco interagem no geral.

Nos supermercados, as compras do que é fundamental (Foto Érica Dahlström Dezonne)

Nos supermercados, as compras do que é fundamental (Foto Érica Dahlström Dezonne)

Claro que mantenho contato direto com a minha família que está aí no Brasil e meu namorado na Finlândia. Sempre usamos o WhatsApp para mensagens e videocalls. Uso também o Houseparty para falar com amigos aqui em Londres.

Érica e a atenção para o movimento nas ruas (Foto Érica Dahlström Dezonne)

Érica e a atenção para o movimento nas ruas (Foto Érica Dahlström Dezonne)

Acredito estar enfrentando muito bem a situação. Melhor do que muita gente. Procuro sempre ter mais o pé no chão em situações de caos e sei que irá passar. Mas parte essencial nessa fase é ter ainda o meu trabalho, pois isso me faz ter o compromisso de acordar no mesmo horário nos dias da semana e seguir uma rotina. Eu adoro ficar em casa. Estou aproveitando muito esse tempo para fazer coisas que eu reclamava constantemente que não tinha tempo, como cozinhar e ler. E algo essencial que tenho valorizado muito nessa época são as lives de academias no Instagram. Eu tenho procurado me exercitar todos os dias, uma ou até duas vezes. E exercícios que ajudem a trabalhar a respiração também pois isso ajuda a ansiedade e o estresse irem embora. E nada como uma boa taça de vinho no fim do dia.

Acredito que as pessoas estejam aprendendo a apreciar mais o silêncio

Em relação ao comportamento do presidente Jair Bolsonaro, acho de extrema falta de respeito com a população brasileira. Ele está cometendo um crime, chamando pessoas para as ruas, as colocando claramente em risco de vida. Eu me entristeço demais com a situação que o presidente da República submete a nação brasileira, mas sei que tem muita gente que o apoia. Aqui, o Reino Unido também não tem sido o melhor dos exemplos. Nosso Primeiro Ministro foi infectado pela Covid-19 e foi parar na UTI. Nosso número de mortos sobe cada dia mais. Mas ainda temos pessoas nas ruas que preferem aproveitar o sol e pagar para ver.

Bicicleta, meio de transporte de muitos moradores de Londres (Foto Érica Dahlström Dezonne)

Bicicleta, meio de transporte de muitos moradores de Londres (Foto Érica Dahlström Dezonne)

Que fiquem em casa. Se não por eles, pelas pessoas que eles amam e valorizam e não gostariam de ver passar por um risco de morte tão grande como esse. Se forem sair, usem luvas, não toquem no rosto por nada nesse mundo. Não tocar no rosto é parte essencial. E saiam apenas para o essencial. Faça exercícios em casa, qualquer coisa que seja para mexer o corpo. E tente mentalizar a respiração. Isso ajuda e muito. Além do mais, isso vai passar e tudo vai ficar bem!

Metrô quase vazio, cena impensável há poucos meses (Foto Érica Dahlström Dezonne)

Metrô quase vazio, cena impensável há poucos meses (Foto Érica Dahlström Dezonne)

Eu sinceramente espero que as pessoas estejam refletindo sobre como crises vêm como lições de vida e que não vale a pena pensarmos apenas em nós mesmos. Eu estou curiosa também para ver como eu serei após isso passar. Mas acredito que as pessoas estejam aprendendo a apreciar mais o silêncio, de que não precisamos viver nesse mundo frenético que vivíamos antes. Há de se trabalhar o consumo consciente, principalmente de alimentos, e o quão esse círculo tem gerado devastações imensas e que a natureza está mandando de volta.

Portas da The National Gallery momentaneamente fechadas: à espera de novos tempos (Foto Érica Dahlström Dezonne)

Portas da The National Gallery momentaneamente fechadas: à espera de novos tempos (Foto Érica Dahlström Dezonne)

O que farei primeiro quando tudo isso acabar? Com certeza, fotografar o movimento das pessoas nas ruas. Mas também espero estar com o meu namorado assim que as coisas voltarem ao normal.”

O desejo de estar com os amigos depois do fim da pandemia (Foto Kira González)

O desejo de estar com os amigos depois do fim da pandemia (Foto Kira González)

CUBA

Kira González – Havana

(CONFIANÇA NO EXCELENTE SERVIÇO DE SAÚDE CUBANO. AS AULAS PELOS CANAIS DE TELEVISÃO. A IMPORTÂNCIA DA SOLIDARIEDADE.)

Dados de 20 de maio de 2020, 14 horas de Brasília.

Dados de 20 de maio de 2020, 14 horas de Brasília.

“Vivo em Havana, a capital, com minha mãe e meu padrasto. Atualmente, é a província com o maior número de casos de coronavírus. Todos nós continuamos em nossas casas e só saímos para coisas estritamente necessárias: comida, itens de higiene pessoal, etc. As escolas pararam as aulas, mas continuamos a manter contato com nossos professores por meio das redes. Os alunos do ensino fundamental, médio e pré-universitário recebem aulas através da rede de canais de televisão nacionais.

Os primeiros dias de isolamento social foram um pouco desconfortáveis. Eu estava ansiosa por não saber o que viria a seguir, mas sabia que todas as medidas necessárias seriam tomadas para manter a saúde da cidade.

Confiamos no sistema de saúde, mas não dá para negligenciar.

Bem, a grande maioria cumpre as medidas, embora exista uma minoria que ainda não tem percepção de risco. Em alguns casos, até protestam contra as demandas das autoridades, que estão fazendo um excelente trabalho de proteção e prevenção.

Todos nós confiamos muito no nosso sistema de saúde por sua eficácia, mas devido à situação atual que apresentamos, não nos permite negligenciar a nós mesmos. As pessoas acompanham a imprensa diariamente, que fornece informações atualizadas, ou seja, desinformação não se justifica.

Há algum tempo eu não tenho contato direto com outros membros da família, apesar de mantermos a comunicação por telefone. Eu me comunico com meus amigos através deste mesmo canal ou através das redes sociais. Passo meu tempo estudando, realizando tarefas domésticas e treinando em casa. Eu sempre tento assistir a todos os noticiários e programas de notícias.

"Sentarei como muitos no Malecón Habanero" (Foto Kira González)

“Sentarei como muitos no Malecón Habanero” (Foto Kira González)

Incentivar a ida às ruas é irresponsável

A ameaça do coronavírus é um problema real e podemos ver quanto dano causou ao mundo. É um comportamento totalmente irresponsável incitar as pessoas a ir às ruas. Está expondo-os ao perigo e minimizando as consequências que isso pode ter.

Eu diria ao povo brasileiro para que eles cumpram as medidas sanitárias estabelecidas; que não arrisquem suas vidas ou a de sua família, que cuidem de seus idosos, que sejam disciplinados e saibam que é a hora de se unir para agir com responsabilidade.

Aprenderemos a valorizar a vida e a cuidar do bem comum

Acho que aprenderemos a ser mais solidários, a ter uma maior percepção de risco, a sermos mais receptivos e disciplinados, também aprenderemos a valorizar a vida e a cuidar do bem comum. Vamos aprender a valorizar tudo ao nosso redor, família, amigos, tudo. Acho que começaremos a ser pessoas mais conscientes, mais reais e menos autodestrutivas.

Não há espaço para o egoísmo

A primeira coisa que farei quando sair de casa é visitar as pessoas de que sinto falta. Sentarei como muitos no Malecón Habanero e, acima de tudo, serei eternamente grata pelo trabalho que nossos médicos e profissionais de saúde estão fazendo. Não é apenas uma questão de fé. Em momentos como esses, apenas precisamos fazer o que é necessário para nós e para os outros. No momento, não há espaço para o egoísmo.

Com foto de João Paulo Ramos

Com foto de João Paulo Ramos

Sobre ASN

Organização sediada em Campinas (SP) de notícias, interpretação e reflexão sobre temas contemporâneos, com foco na defesa dos direitos de cidadania e valorização da qualidade de vida.