Por Fábio Gallacci
Especial para a Agência Social de Notícias
Campinas, 25 de maio de 2020
(Sexta reportagem da série com depoimentos de cidadãos moradores de vários países, sobre os impactos da pandemia.)
SUÉCIA
Carolina Carrijo – Lund
(PAÍS TEVE CONTROVERSA POLÍTICA DE ISOLAMENTO. VIDA CONTINUOU QUASE NORMAL. INCERTEZAS QUANTO AO FUTURO. GRANDE IMPACTO NA ECONOMIA)
“O primeiro caso na Suécia foi registrado no dia 30 de janeiro em uma jovem de aproximadamente 20 anos que veio de Wuhan/China. Ela ficou isolada e se recuperou; não passou para ninguém. Após quase um mês, surgiram os novos casos, que foram registrados logo após o Winter Break (terceira semana de fevereiro), em que toda a Europa pausa para uma mini férias de Inverno com o objetivo de praticar esportes, como esquiar. As pessoas costumam ir para o Norte da Itália. Aquele país estava com o seu pico de casos e, consequentemente, todos os novos casos daqui surgiram em pessoas que foram para lá. Quando o primeiro caso foi registrado, a Suécia se pronunciou como sendo um país de ‘Risco Baixo’ para proliferação da covid-19. Quando surgiram os novos casos, passou para ‘Médio/Alto’ e em poucos dias já se tornou ‘Muito Alto’.
Atualmente são 30.943 casos e 3.784 mortos (informação do dia 20/05), sendo a maioria na capital Estocolmo. Os números de novos casos por dia estão diminuindo, mas ainda são altos. No primeiro mês, eu só fiquei em casa, passeava na rua aqui da frente e fui a supermercados. Mas no último mês eu tenho voltado, aos poucos, a algumas atividades normais, pois estava literalmente sendo a única pessoa em total isolamento em um país com tudo liberado. Hoje eu evito restaurantes e shoppings. Só vou ao Centro quando preciso comprar algo e estou buscando conhecer novos bosques/florestas (muito comuns aqui) para passear com as crianças. Assim, evito locais com aglomerações.
Não compare o Brasil com a Suécia e fique em casa!
Após os primeiros casos, não houve nenhuma mudança de comportamento. Quando a Dinamarca fechou a fronteira (12/03), houve um certo desespero. As pessoas tiveram o impulso de fazer estoque de comida, papel higiênico e álcool em gel. Com o passar dos dias e sem aparecer nenhuma obrigatoriedade de isolamento, a população se acalmou. Mas se eu pudesse dar um conselho aos brasileiros eu falaria: Não compare o Brasil com a Suécia e fique em casa!
Logo na primeira semana de março, eu e todas as pessoas da minha família ficamos muito mal, com uma gripe super pesada, inclusive o meu filho mais novo, na época com 6 meses. Liguei para o Hospital para saber se poderia ir fazer o teste, mas não permitiram. O teste só está sendo feito em casos de risco. Apenas nos orientaram a ficarmos em casa e retornar se estivéssemos piorando, com falta de ar, sintomas mais fortes.
Logo após, o meu bebê passou pela consulta de rotina do pediatra e disseram que as chances de termos tido Covid-19 eram bem altas, de acordo com sintomas. Depois disso, soubemos que tivemos contato com pessoas que estavam com outras pessoas contaminadas, o que nos leva a crer que todos aqui já pegamos, mas nunca teremos certeza.
Vida (quase) normal
As medidas de proteção da Suécia são brandas e demoraram a acontecer. Num primeiro momento, as fronteiras foram fechadas, depois vetaram eventos com mais de 500 pessoas e logo depois passaram para 50 pessoas. Assim segue até hoje.
As empresas adotaram o home office para quem pode. As universidades, ginásios, escolas de idiomas e qualquer outro tipo de curso para adultos fecharam e estão sendo on-line. As escolas de ensino infantil (até 16 anos) funcionam normalmente. Segundo o primeiro-ministro, Stefan Löfven, fechar escolas poderia fazer com que profissionais essenciais deixassem de trabalhar para ficar com as crianças em casa ou que os pais deixassem os filhos com avós idosos, aumentando os riscos de propagação.
O respeito ao próximo é algo que sempre existiu aqui
Restaurantes e bares continuam funcionando, mas não podem ter serviço de balcão (self-service, coisas assim). Avisos de distanciamento foram colocados em todos os estabelecimentos. Algumas farmácias pedem que os clientes peguem senhas e esperem do lado de fora. Compra ou aluguel de imóveis está sendo feito on-line (sem visitas, você precisa alugar o apartamento confiando nas fotos). Academias continuam funcionando com restrições de horários e exigências de distanciamento e higiene.
Distanciamento social como cultura
Eu vejo que os suecos estão respeitando essas regras e vale destacar que já faz parte do comportamento deles manter distância de outras pessoas. Já era muito comum se posicionar a um metro de distância do outro em pontos de ônibus, mesas de restaurantes, filas. Na minha opinião, o sueco sempre viveu em distanciamento social.
O respeito ao próximo é algo que sempre existiu aqui, mas o sueco nunca gostou de abraços, de conversar muito perto, de receber visitas em casa. É um povo muito fechado. Outra característica daqui é que temos uma população muito pequena (10 milhões de pessoas aproximadamente) e eu tenho a sensação de que todos os lugares são muito vazios, não existe aglomeração nem em tempos normais. Na rua onde moro nunca tem ninguém, tudo é muito deserto por aqui.
Falta de registro no trabalho contribuiu para disseminação da doença
O grande número de casos de mortes na Suécia aconteceu em Estocolmo, principalmente em lares de idosos, onde os funcionários eram horistas e não tinham registro. Com isso, não receberiam nenhum benefício caso ficassem doentes. Sendo assim, muitos desses funcionários horistas acabaram indo trabalhar doentes e levaram o vírus para dentro dos lares e aconteceu essa catástrofe. O governo, quando constatou isso, mudou o regime de trabalho dessas pessoas e registrou todo mundo, garantindo que eles tenham benefícios e possam faltar em caso de doença.
Fora isso, nas outras regiões, a situação está mais tranquila e controlada. O clima aqui na Suécia é de tranquilidade. Eu acredito que os imigrantes estão mais preocupados. As comunidades brasileira e italiana, por exemplo, estão muito preocupadas. Mas o sueco, em sua maioria, confia no governo.
Vírus abala pequenos e gigantes da economia
Há total apoio para que o trabalhador fique em casa. O governo já anunciou um pacote econômico para ajudar as empresas que tiveram que reduzir jornada de trabalho e salários dos colaboradores. Meu marido trabalha em uma multinacional sueca e teve redução de salário de 30%. O governo irá cobrir essa redução.
Por outro lado, é possível ler notícias de quanto as empresas estão sofrendo o impacto. Grupos como Scania, Norwegian, SAS estão fechando operações aqui. Os pequenos negócios estão implorando para os clientes pedirem por entregas. Então, sim, há um grande impacto na economia”.