Por Eduardo Gregori, de Lisboa
Demorei mas aqui estou para a terceira parte da série Desejos de Verão. Era quase fim de verão e o sol já não tinha a mesma força, mas mesmo assim insisti em aproveitar cada momento fora de casa e longe da multidão.
Chego na Praia da Bela Vista como sempre e abro meu “chapéu de chuva” como dizem aqui e estendo minha toalha. A praia, que mesmo no verão tem pouca gente, parece quase um deserto nesta altura do ano, mas alguém ao longe me chama a atenção.
Uma senhora com seus bons 70 anos ou mais parece escondida entre as dunas e a vegetação. Ela segura um par de binóculos e parece compenetrada em sua missão de espreitar a vista. Imagino que ela esteja observando alguma espécie de pássaro porque na Costa de Caparica existem várias, ou então as pipas que elevam os surfistas acima das ondas e colorem os céus.
O dia passa, ondas vão e vêm e quase no fim da tarde ela ainda está no mesmo posto, quase ainda na mesma posição. Aquilo me intriga. O que uma senhora daquela idade estaria fazendo ali por tanto tempo? Levanto acampamento e me dirijo ao meu carro e no caminho faço questão de ir me aproximando dela para ver o que se passa.
Ela percebe a minha aproximação e se vira de costas para a praia. Ao passar por ela digo boa tarde, para ver se ela era portuguesa ou não. E me responde em português luso. Não resisto ao ímpeto de parar e tentar iniciar uma conversa para ver no que aquilo vai resultar.
Me apresento digo que adoro a praia e que sempre estou por lá. Ela responde dizendo que também aprecia a praia, mas que não tem mais idade para enfrentar as ondas fortes da Caparica e nem a água fria, mas sempre que pode, gosta de observar.
E lhe pergunto: O que a senhora observa? Ela respira por alguns instantes e eu espero que vá me dar uma má resposta. Então ela ergue a cabeça buscando meu rosto e me diz: “meu querido, eu tenho 79 anos e sou viúva há mais de 30. Gosto de ver os rapazes a correr para a água com seus corpos bem-feitos. Meu marido vinha aqui sempre para surfar e desde que ele morreu nunca tive mais ninguém. Tenho medo de esquecer como é o corpo de um homem e quando venho cá faz-me lembrar também do meu Manoel”.
Tenho pena pelo luto daquela senhora que dura já 3 anos, mas alegro-me que ela tenha encontrado uma maneira de lembrar de seu marido sem perder de vista e sem sentir culpa de observar corpos masculinos ao sol.
Digo isto a ela e lhe dou um conselho: “A senhora devia descer das dunas e caminhar pela praia. Quem sabe não encontra um novo amor?”. Ela sorri e responde: “obrigadinho, vou pensar nisto”.
Despeço-me enquanto ela vira novamente para a praia e levanta o binóculos. Entro no meu carro e vou embora. Quando voltei na semana seguinte não a vi mais nas dunas e torço para que ela tenha seguido o meu conselho.
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