Nesta segunda-feira, 8 de dezembro, começou a segunda e decisiva semana da Conferência das Partes (COP-20) da Convenção das Mudanças Climáticas, em Lima, no Peru. Até sexta-feira, dia 12, os negociadores diplomáticos e ministros têm a missão de elaborar um rascunho para o grande acordo que será fechado na COP-21, em dezembro de 2015, em Paris, com metas para a redução de emissões de gases que agravam o aquecimento global. Os participantes da Conferência estão tomando conhecimento nestes dias de um relatório que denuncia “violações de direitos no estado do Acre” pela chamada Economia Verde. É forte a crítica no documento a processos da Economia Verde como o REDD, mecanismo oficial ligado ao combate ao aquecimento global.
O documento é um informe preliminar da Relatoria do Direito Humano ao Meio Ambiente (RDHMA), ligada à Plataforma de Direitos Humanos (Dhesca Brasil), que é formada por um conjunto de organizações da sociedade civil brasileira, como Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB), Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Comissão Pastoral da Terra (CPT), IBASE, INESC e Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH). O relatório “Economia Verde, Povos das Florestas e Territórios: violações de direitos no estado do Acre”, assinado por Cristiane Faustino e Fabrina Furtado, foi publicado em espanhol com apoio da Fundação Rosa Luxemburgo e de fundos do Ministério Federal para a Fundação de Cooperação Econômica da Alemanha (BMZ).
Referência em Economia Verde – O relatório nota que o estado do Acre tem se destacado “como referência no contexto da construção e implementação da economia verde no Brasil, que envolve desde discussões em torno da criação de um mercado de carbono nacional, propostas de legislação, projetos de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) e de Redução de Emissões Derivadas do Desmatamento e Degradação das Florestas (REDD) e bolsas de valores ambientais (como a Bolsa Verde, no Rio de Janeiro”.
O documento observa ainda que o Acre é “pioneiro em concessões e explorações florestais no Brasil. Com base na promessa da conservação ambiental e da geração de renda, o Manejo Florestal Sustentável (MFS) busca, de acordo com o governo do Estado, promover o ´desenvolvimento sustentável´, a conservação ambiental, o uso racional de recursos naturais, a redução da pobreza e a criação de uma economia de base florestal`”.
Entretanto, notam as autoras, um conjunto de organizações e coletivos sociais do Acre “questiona essa política, identificando impactos sociopolíticos, econômicos e ambientais negativos, em especial sobre os territórios e as populações tradicionais”.
Os principais problemas encontrados pela missão da Relatoria do Direito Humano ao Meio Ambiente, segundo o documento, estão relacionados “com a existência e aprofundamento de conflitos territoriais – tanto nos territórios já conquistados pelas comunidades e por povos locais, como em territórios em situação de insegurança jurídica – que, por sua vez, afetam a capacidade das comunidades de garantir sua subsistência e a preservação e promoção de sua cultura e identidade”.
Esses problemas foram identificados pela visita da missão a várias comunidades afetadas pelos projetos associados à chamada Economia Verde, como os projetos de REDD e Manejo Florestal Sustentável já citados. O documento cita, entre outros, o depoimento de Dercy Teles de Carvalho Cunha, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri e posseira no Seringal Boa Vista, sobre os impactos desses projetos para a vida das comunidades locais: “é a perda de todos os direitos que os povos têm como cidadão. Perdem todo o controle do território. Não podem mais roçar. Não podem mais fazer nenhuma atividade do cotidiano. Apenas recebem uma Bolsa para ficar olhando para a mata, sem poder mexer. Aí, tira o verdadeiro sentido da vida do ser humano”. Xapuri é onde morreu o líder ecologista e seringueiro Chico Mendes.
Impactos igualmente importantes de projetos de Economia Verde em áreas indígenas do Acre, como as do povo Jaminawá, conforme o relato da missão da Dhesca. A missão manteve reuniões com várias organizações oficiais que atuam no Acre, como Embrapa, INCRA e Funai, além de diversas secretarias estaduais. De um modo geral, afirma o documento, “os representantes do poder público justificam a política de economia verde como um esforço institucional para a gestão socioambiental e o aproveitamento das condições do Estado no enfrentamento de problemas históricos sociais e econômicos”.
Entre as conclusões da Relatoria, está a de que, ainda que os representantes públicos afirmem “que realizam todos os esforços para garantir a participação das comunidades nos processos que formam parte dos projetos de economia verde, os testemunhos das comunidades e as queixas das organizações evidenciam que existe uma insuficiência de participação social nos processos decisórios da política”.
Uma das recomendações do relatório é a de que “sejam estabelecidos processos e mecanismos de debate a nível nacional sobre as políticas de economia verde no Brasil, tendo como exemplo o caso do Acre, dando, assim, visibilidade aos impactos territoriais, sociais, ambientais e culturais das mesmas”.