José Pedro Martins
A mobilização da sociedade civil e a capacitação dos envolvidos no processo são ingredientes fundamentais para a continuidade e a eficácia das práticas de Orçamento Participativo e para o fortalecimento desse e outros instrumentos como política pública de participação democrática no Brasil. A opinião é de Ailton de Souza, bacharel em Ciências Sociais, mestre em Ciências Sociais pela Universidade de Brasília e doutorando em Ciência Política pela Unicamp, e professor licenciado na Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul.
Membro do Núcleo de Pesquisa em Participação, Movimentos Sociais e Ação Coletiva (Nepac), do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp, Ailton de Souza fez um trabalho de pesquisa justamente sobre o processo de Orçamento Participativo em Porto Alegre (RS), o pioneiro da prática no país. Como consequência da mobilização pela redemocratização do país pós-ditadura e das conquistas obtidas com a Constituição Federal de 1988, o OP passou a ser praticado em Porto Alegre, no governo de Olivio Dutra, do Partido dos Trabalhadores (PT), desde 1989. Depois da capital gaúcha, o Orçamento Participativo foi adotado em várias outras cidades brasileiras.
Adotado em outras cidades do mundo
Em 1996, a Conferência Habitat II, em Istambul, na Turquia, reconheceu o Orçamento Participativo como “Prática Bem Sucedida em Gestão Local”. Trata-se, portanto, de um conceito sólido e difundido internacionalmente. Instrumentos semelhantes foram adotados por cidades como Rosário (Argentina), Montevideu (Uruguai), Bruxelas (Bélgica) e Toronto (Canadá). Em outubro de 2007 foi criada a Rede Brasileira de Orçamento Participativo.
O foco da pesquisa de Ailton de Souza foi verificar como se deu a continuidade do Orçamento Participativo em Porto Alegre, com a mudança de governos do PT (depois de 16 anos no poder) para o PMDB, com José Fogaça (inicialmente no PPS), em 2005. Fogaça foi reeleito em 2008, permanecendo no cargo até 30 de março de 2010, quando renunciou para se candidatar ao governo do Rio Grande do Sul.
Em sua pesquisa, Ailton de Souza identificou “um declínio em Porto Alegre do Orçamento Participativo, que tinha muito a marca do PT”. Um dos sinais da redução de seu impacto foi a diminuição significativa do percentual do orçamento municipal reservado à destinação para obras definidas pelo Orçamento Participativo. Houve no governo Fogaça, nota o pesquisador, a criação do instrumento denominado Governança Solidária Local (GSL), “que na prática competia com o OP”, observa Souza. No caso de Porto Alegre, ficou evidente como o OP dependeu da agenda do gestor público municipal.
Empoderamento
Um ponto essencial, para o pesquisador do Nepac-Unicamp, é que a continuidade e a própria eficácia das práticas do OP dependem “da mobilização da sociedade civil, e e se existe uma capacitação para o empoderamento dos participantes dos processos”, destaca. Souza lembra que, em Porto Alegre, contribuiu historicamente para o fortalecimento (no governo petista) do OP como política pública a capacitação dos envolvidos, por organizações da sociedade civil como o Cidade – Centro de Assessoria e Estudos Urbanos.
Mais recentemente, informa Souza, instituições universitárias – como a Universidade Federal de Minas Gerais – têm se preocupado com a capacitação de agentes de instrumentos como o OP, mas também de Conselhos Municipais. “As capacitações são fundamentais, para a difusão de conceitos de teoria política, teoria democrática”, diz Souza, lembrando que muitos membros de Conselhos Municipais, em vários pontos do país, “ainda não têm clareza, por exemplo, sobre o papel desses Conselhos, se eles são consultivos ou deliberativos”.
As conferências, municipais, estaduais e nacionais, são outra modalidade emergente de participação da sociedade, diz Ailton de Souza. Mas, assim como os OPs e Conselhos Municipais, também são instrumentos em construção, de qualquer forma fundamentais para a ampliação da democracia no Brasil. “Um ponto importante a ser analisado hoje é a efetividade dessas práticas, o que esses instrumentos têm significado em termos de mudanças reais para a população. Essa é uma linha de pesquisa que tem avançado”, acrescenta o pesquisador do Nepac-Unicamp.