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Maneco de Gusmão leva a instabilidade quântica contemporânea ao centro de Campinas
No CCLA, a mescla de tempos: o projetor de cinema antigo e os Rostos Contemporâneos de Maneco de Gusmão (Fotos José Pedro Martins)

Maneco de Gusmão leva a instabilidade quântica contemporânea ao centro de Campinas

Primeiro o espanto do artista, que encontra na avenida Francisco Glicério o burburinho de sempre, aliado à movimentação especial provocada pelo projeto de revitalização da principal via pública da cidade. Barulho, corre-corre interminável, fluxo constante, buzina, pressa, ansiedade. Dobrando a esquina da rua Bernardino de Campos, ele sobe a longa escada que dá acesso ao andar principal do Centro de Ciências, Letras e Artes. Um pouco cansado, depois da viagem que também teve os seus percalços (foi obrigado a deixar o automóvel com problemas em Mogi-Mirim), ele finalmente chega à Galeria de Arte do CCLA para a concretização de um sonho: inaugurar uma exposição no mais tradicional espaço cultural de Campinas. Foi esta a tarde de Maneco de Gusmão nesta quarta-feira, 10 de junho, na abertura de sua exposição Quantic-Art – O Princípio da Incerteza.

É uma série de Rostos Contemporâneos, como o artista define. Rostos enormes, compostos sobre tiras de borracha de pneu de caminhão. A impressão é de rostos tremulando, de imagens retorcidas. Um pouco de cubismo, de figurativismo, de simbolismo. E de raízes barrocas mineiras como Emanuel de Gusmão, o Maneco, nascido em Ouro Fino, de onde saiu aos 18 anos para São Paulo.

Neo barroco, na Galeria de Arte do CCLA

Neo barroco, na Galeria de Arte do CCLA

Na capital paulista, a descoberta do poder da arte, quando deu aulas para detentos na Penitenciária do Estado. “Com esse trabalho, vi realmente o poder da arte, percebi como ela pode mudar as pessoas, mudar a percepção das coisas”, diz Maneco.

Veio 1990 e o pacote econômico de Zélia-Collor de Mello. Um susto nacional, quase pânico, e o artista decide ir para Paris, como “exilado político-econômico-financeiro” do pseudo-Caçador de Marajás. Foram 14 anos na capital francesa, tomando contato com toda a efervescência artística e expondo, depois de muita luta, em espaços alternativos e galerias. Algumas exposições na Alemanha e na Espanha, mais precisamente na Casa do Brasil.

A face da perplexidade do século 21

A face da perplexidade do século 21

Saudades de casa, questões de saúde da mãe, e o filho único retorna para Ouro Fino, onde atua na Coordenadoria Municipal de Cultura e funda a ONG Culturativa. Na terra nativa, constrói a Caixa Preta, como chama a sua casa-ateliê-centro cultural. “A Caixa Preta é o lugar de se guardar sonhos, desejos, ideias”, resume.

Maneco – ou Monsieur Manecô, no sotaque francês – entende que o mundo todo vive uma balbúrdia, um não-se-entende-nada-do-que-acontece, e o Brasil está no meio do turbilhão. Cabe ao artista o seu papel, o de provocar a reflexão, pegar com as mãos nuas a carne quente-fria da instabilidade contemporânea.

Abertura da exposição Quantic-Art O Princípio da Incerteza no CCLA

Abertura da exposição Quantic-Art O Princípio da Incerteza no CCLA

“Estamos passando pela maior transformação da história, isso é ótimo, mas ninguém sabe para onde estamos indo”, afirma, entre perplexo e esperançoso. “Hoje, post-humanos, em ligações físicas com a caixa de Pandora, descobrem novos códigos: A Física Quântica, a Caixa Preta, a cor negra do conhecimento universal, a negra luz que brilhou em Ouro Fino e se descobrem, novamente, barrocos. Contemporaneamente presentes. Sempre, em construção”, escreveu Maneco de Gusmão, no texto preparado para a exposição em Campinas.

No Brasil, admiração particular por Hélio Oiticica e Flávio de Carvalho. “Ele colocou saia há décadas atrás, imagine hoje!!, exclama. No plano internacional, a influência confessa de Marcel Duchamp, a mutação do objeto comum em obra de arte, a vida tornada obra de arte. Nos Rostos Contemporâneos, em exposição neste mês de junho no CCLA, centro de Campinas, a reutilização da borracha “que um dia fez a riqueza mas levou a miséria para a Amazônia”. A agonia e perplexidade da humanidade atual nas faces da instabilidade. (Por José Pedro Martins)

Emanuel (Maneco) de Gusmão: dentro da caixa Pandora universal

Emanuel (Maneco) de Gusmão: dentro da caixa Pandora universal

 

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