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Programa do Conselho Mundial de Igrejas discute ecologia desde a década de 1980
Ato durante o encontro em Seul, Coreia do Sul, em 1990 (Foto Divulgação)

Programa do Conselho Mundial de Igrejas discute ecologia desde a década de 1980

Questões ecológicas são discutidas pelo Conselho Mundial de Igrejas (CMI) desde a década de 1980, no âmbito de seu Programa Justiça, Paz e Integridade da Criação (JPIC). Sediado em Genebra, Suíça, o CMI é a principal organização ecumênica internacional, reunindo mais de 350 Igrejas, como as chamadas denominações evangélicas históricas. Neste âmbito religioso, portanto, o CMI antecedeu e muito ao Vaticano, que entrou oficialmente e com força no debate ambiental planetário em 2015, com a encíclica Laudato si, do papa Francisco.

O apelo que resultou no Programa JPIC foi feito na Assembleia do CMI em Vancouver, Canadá, em 1983. Era o auge da Guerra Fria, a disputa entre capitalismo e comunismo liderada, respectivamente, pelos Estados Unidos e União Soviética, e que consumia bilhões de dólares anuais na corrida armamentista entre as grandes potências. Com o acúmulo do arsenal atômico, nunca a humanidade esteve tão próxima da autodestruição.

“A humanidade está vivendo agora nas sombras escuras de uma corrida armamentista e de sistemas de injustiça mais difundidos que o mundo já conheceu. Nunca antes a raça humana esteve tão próxima como agora da autodestruição total. Nunca antes tantos viveram sob o domínio de privação e opressão “, afirmou uma mensagem aprovada em Vancouver.

A contundente declaração aprovada na cidade canadense prosseguia com um apelo às Igrejas cristãs: “As igrejas hoje são chamados a confessar novamente sua fé e arrepender-se pelos tempos em que os cristãos têm-se mantido em silêncio diante da injustiça ou ameaças à paz. A visão bíblica da paz com justiça para todos não é uma das várias opções para os seguidores de Cristo, mas é um imperativo para os nossos tempos “.

E o documento acrescentava, nos termos daquela que deveria ser, para o CMI, a única resposta cristã possível naquele momento: ” O alicerce desta ênfase deve ser confessando Cristo como a vida do mundo e da resistência cristã aos poderes da morte do racismo, do sexismo, da opressão de castas, da exploração económica, o militarismo, as violações dos direitos humanos e o mau uso da ciência e tecnologia.

Atividade cultural no encerramento do encontro em Seul: pela justiça, paz e integridade da criação (Foto José Pedro Martins)

Atividade cultural no encerramento do encontro em Seul: pela justiça, paz e integridade da criação (Foto José Pedro Martins)

Desta declaração de Vancouver evoluiu o processo que resultou no JPIC. Em 1988, uma mensagem do Comitê Executivo do CMI fez a convocação para uma grande conferência de Igrejas sobre o JPIC, com o propósito de “fazer afirmações teológicas sobre justiça, paz e integridade da criação, e para identificar as principais ameaças à vida nestas três áreas e mostrar sua interconexão, e para propor às Igrejas atos de compromisso mútuo em resposta a elas”.

A conferência foi marcada para Seul, Coreia do Sul, um lugar muito simbólico, porque era um dos territórios em que a corrida armamentista entre capitalismo e comunismo deixou suas marcas, com a divisão de um país e de milhares de famílias. O encontro aconteceu em março de 1990, e foi convocado para discutir três grandes questões centrais, que deveriam resultar em pactos na comunidade cristã para equacioná-las: (1) A corrida armamentista, que consumia anualmente bilhões de dólares, que poderiam ser investidos em programas sociais em benefício de milhões de pessoas. (2) A dívida externa do então ainda chamado Terceiro Mundo, que igualmente consumia bilhões de dólares, destinados aos cofres de organizações financeiras internacionais. (3) O aquecimento global, ameaça que se tornava cada vez mais inquietante para cientistas, ambientalistas e outros setores sociais. Em 1988, por exemplo, a ONU havia criado o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC).

E, de fato, a conferência de Seul discutiu profundamente as três questões globais, resultando em pactos respectivos, mas pela firme ação de Igrejas africanas outro tema essencial foi debatido, com o estabelecimento de um quarto pacto, contra o racismo em geral e o apartheid na África do Sul em particular. A ação ecumênica foi tão eficaz que contribuiu para as pressões que levaram ao fim do apartheid no mesmo ano de 1990.

A nova assembleia do CMI, em Canberra, Austrália, em 1991, deu ainda mais destaque ao processo JPIC, que resultou em um Programa amplo, que movimentou as Igrejas cristãs do campo evangélico nas décadas seguintes. Em função desse processo, o CMI esteve ativo na preparação da histórica Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Rio-92 ou Eco-92, realizada no Rio de Janeiro, em junho de 1992. Em 1995, uma petição patrocinada pelo Conselho Mundial de Igrejas foi assinada por 500 mil pessoas e entregue na primeira Conferência das Partes (COP-1) da Convenção das Mudanças Climáticas, realizada em Bonn, Alemanha. Em 1999 foi editada a publicação “A Terra como Mãe”, resultado do trabalho de uma equipe de especialistas e com referências a questões ambientais globais e aos povos indígenas.

Para analisar e refletir sobre a justiça, a paz e a criação, em sua interrelação, para promover os valores e práticas que contribuem para uma cultura de paz, e trabalhar em direção a uma cultura de solidariedade com os jovens, mulheres, povos indígenas e povos racialmente e etnicamente oprimidos“. Esta tornou-se a missão do processo Justiça, Paz e Integridade da Criação, que continua animando as Igrejas e organizações ligadas ao CMI, como ocorreu durante a recente COP-21, em Paris. (Por José Pedro Martins)

Crianças nas ruas de Seul, em março de 1990: cidade foi escolhida por ser simbólica da Guerra Fria que dividiu o mundo e países (Foto José Pedro Martins)

Crianças nas ruas de Seul, em março de 1990: cidade foi escolhida por ser simbólica da Guerra Fria que dividiu o mundo e países (Foto José Pedro Martins)

 

 

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