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LISBOICES: As damas da estrada
(Foto: crédito Pixabay)

LISBOICES: As damas da estrada

Por Eduardo Gregori

O verão chegou a Lisboa, ainda não tão firme, mas chegou. Bem, depois de meses de frio e chuva, o que a gente quer mesmo é se jogar numa boa praia. Neste quase um ano e meio que estou em Portugal tenho trabalhado muito e me sobra pouco tempo para desfrutar a vida. Mas nas minhas folgas, quando não vou malhar ou tratar da casa, me obrigo a sair, ver gente e curtir.

Na semana passada o dia amanheceu incrivelmente lindo e com muito sol e calor. Decidi conhecer uma das praias mais faladas da grande Lisboa: O Meco. Falam de tudo, que é praia nudista, que é no meio do nada, mas que é linda.

Decidi ir, mas conto essa história em outra coluna porque o que vou contar agora foi para mim uma grande surpresa. Em Lisboa a prostituição não está tão à mostra. Talvez pelo conservadorismo do país. O certo quem quer ter encontros sexuais encontra prostitutas perto do Parque Eduardo VI, próximo a praça Marquês de Pombal, enquanto que as travestis ficam no Conde Redondo.

Um parêntesis neste texto: A imprensa portuguesa tem cada vez mais noticiado a chegada de brasileiras para a prostituição, principalmente no Porto e em Lisboa. Verdade ou fake news, a comunidade de brasileiros, nos grupos das redes sociais, têm ficado cada dia mais apreensivo com a situação, com medo que os portugueses associem prostituição à mulher brasileira. Vamos torcer para que isso não avance, afinal muitas mulheres de fato estão chegando, mas não apenas pra prostituir-se.

Sigo para Sesimbra, concelho na Margem Sul onde fica o Meco. Na estrada, percebo uma cena inusitada. O sol a pino e mulheres sentadas em cadeiras de praia na beira da estrada. Uma a seguir da outra, uma verdadeira multidão delas. Acho aquilo estranho. O que essas mulheres estariam fazendo no meio do nada, bem vestidas e a tomar sol?

Ligo para um amigo português e o indago. Logo descubro que a zona é de prostituição. Sinto pena delas, o sol está rachando a terra e o calor é sufocante. Encosto o carro e observo. Um carro para, ela negocia o preço, cerca de 20 euros e seguem para um motel, o único da região.

Tomo coragem, ligo o carro e paro bem ao lado se uma senhora, com uns 40 anos. Digo que gostaria de passar um tempo com ela. Me cobra 25 euros e lhe digo que, na verdade gostaria que ela me contasse um pouco de sua vida por ali. Ela, creio que aliviada por não ter que se submeter a mais um cliente, abre seus segredos.

Chama-se Mariza, tem na verdade 45 anos e chegou da Venezuela há poucos meses. Ainda está a tratar de sua legalização e como não consegue trabalhar formalmente, decidiu partir para este trabalho. Diz que ganha o suficiente para se manter, pagar o aluguel e comprar sua comida e ainda roupas para ficar atraente.

Fugiu do caos de Maduro e mesmo trabalhando com o corpo se sente segura. Lhe indago se não tem medo de vender o corpo em um país machista e com muitos casos de feminicídio, alardeados pela imprensa todos os dias. Ela diz-me que não. Lembra que a violência era muito maior na América do Sul e que o português, busca mais um bom momento a dois do que algo bizarro e repugnante.

Vamos até o Meco e voltamos para o ponto que a encontrei. Desejo-lhe sorte e agradeço lhe dizendo que estou torcendo para que sua documentação saia e ela possa trabalhar em algo menos perigoso. Ela abre a porta, dá-me um beijo no rosto e diz adeus. Logo um carro para na frente do meu e ela entra e parte, levantando a poeira. Volto para a estrada rumo a praia, mas no caminho vejo alguns rapazes na pista… bem isso é tema para um próximo Lisboices

Sobre Eduardo Gregori

Eduardo Gregori é jornalista formado pela Pontifícia Católica de Campinas. Nasceu em Belo Horizonte e por 30 anos viveu em Campinas, onde trabalhou na Rede Anhanguera de Comunicação. Atualmente é editor do blog de viagens Eu Por Aí (www.euporai.com.br) e vive em Portugal