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Subversão de poderes
Cena de The Boys (Foto Divulgação)

Subversão de poderes

Por Eduardo Gregori

Série The Boys revela lado sombrio que habita os super-heróis

Se há algo que o ser humano sempre sonhou é ter superpoderes. Do ocidente com o Super-Homem ao oriente com o Ultraman, os super-heróis habitam o nosso imaginário. Além de seus fantásticos poderes, super-heróis são o bastião da moral, zeladores da democracia e do patriotismo.

Mas e se todos esses predicados fossem apenas uma fachada para esconder do mundo a verdadeira identidade de uma pessoa com super-poderes? E se o herói que você foi fã algum dia não fosse bem como você imaginava. Esse é o tema da série The Boys, que acaba de estrear sua segunda temporada na plataforma de streaming Prime Vídeo, da Amazon.

Em The Boys, um grupo formado por sete super-heróis tem suas imagens públicas gerenciadas pela Vought, uma poderosa empresa de marketing que, além de cuidar da imagem, enche os próprios bolsos com a venda de produtos licenciados, aparições em eventos e principalmente com o engajamento de ações armadas nas redes sociais. Pense em Hollywood na era de ouro do cinema, quando cada passo de uma estrela era ditado pelos estúdios.

O que faz de The Boys tão atraente é o fato de o enredo desconstruir a imagem certinha que temos  dos super-heróis. Na pauta dos episódios assuntos recorrentes no nosso mundo comum: assédio sexual, consumo de drogas, desvio de moral e por aí vai… ladeira a baixo.

O que pensar de um Capitão Pátria (Antony Starr), um Super-Homem genérico, que se recusa em salvar pessoas em um avião sequestrado por terroristas e depois aparecer em rede nacional para lamentar a morte dos passageiros. E Translúcido, personagem de Alex Hassell que tem o poder da invisibilidade e o usa na maioria das vezes para espreitar mulheres em banheiros. Já o Trem-Bala, personagem de Jessie Usher, corre tanto como The Flash, principalmente quanto está sob efeito de uma droga chamada Componente V.

O grupo dos sete heróis é amado pela população e essa unanimidade é garantida pela Vought, que trata de limpar os estragos que eles deixam pelo caminho, como a morte de pessoas por vingança, pelo uso de drogas e pela disputa de poder.

Os antagonistas que dão nome a série são um grupo de homens liderados por Billy (Karl Urban), um ex-agente da CIA que vive atormentado pelo desaparecimento de sua esposa, o qual ele atribui ao Capitão Pátria. A missão é descobrir os podres dos super-heróis e destruí-los, seja matando-os ou expondo publicamente suas fraquezas. É uma inversão de valores interessante, ao colocar heróis como vilões com superpoderes e mocinhos que contam apenas com coragem e uma dose de inteligência.

A trama de The Boys trata de questões muito atuais como a idolatria por influencers que vendem um mundo perfeito, a manipulação da imagem pública, disputa pelo poder custe o que custar e até a falta de moral no jogo pela soberania entre nações. Ao subverter os valores, ou a falta deles em um super-herói, a série joga um holofote sobre como podemos estar observando e vivendo em um mundo distorcido e manipulado.

Outra frente que abre portas para reflexões está ligada diretamente às duas mulheres que fazem parte do grupo dos sete heróis. Starlight (Erin Moriarty), descobre, ao ser admitida no grupo, que a perfeição vendida pelos heróis não tem nada de verdadeiro. Em seu primeiro dia como membro da equipe, ela é assediada sexualmente por Profundo (Chace Crawford), uma espécie de Aquaman de segunda categoria. Starlight também questiona sua própria visão sobre fé ao ter que falar em um evento religioso e no qual precisa vender a imagem de uma garota virgem e temente a Deus, o que definitivamente ela não é.

Já a Rainha Maeve (Dominique McElligott), uma espécie de Mulher-Maravilha se questiona porque ainda faz parte do grupo. Ela sente o peso do mau-caratismo de seus companheiros e do preço alto que tem de pagar para manter sua imagem imaculada.

The Boys é um bom divertimento por suas cenas de ação e tramas bem amarradas, mas também é uma série para refletir sobre questões que povoam o nosso cotidiano. Não deixe de ver desde a  primeira temporada.

 

 

Sobre Eduardo Gregori

Eduardo Gregori é jornalista formado pela Pontifícia Católica de Campinas. Nasceu em Belo Horizonte e por 30 anos viveu em Campinas, onde trabalhou na Rede Anhanguera de Comunicação. Atualmente é editor do blog de viagens Eu Por Aí (www.euporai.com.br) e vive em Portugal