A atual crise hídrica, afetando a região mais populosa e rica do Brasil, e os desafios ditados pelo aquecimento global são a comprovação da urgência de uma educação ambiental cada vez sólida e transformadora de hábitos e pensamentos. Entretanto, a educação ambiental que vem sendo praticada no meio escolar ainda “não tem impacto no chão da escola, no cotidiano de alunos, professores e demais membros da comunidade escolar”. A advertência é um dos maiores especialistas em educação ambiental no Brasil, Marcos Sorrentino, professor do Departamento de Ciências Florestais da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP), de Piracicaba. Para ele, que espera a multiplicação dos Coletivos Educadores, a educação ambiental deve estar “ligada a um projeto de Nação”.
Sorrentino tem uma rica trajetória no setor, desde os primeiros passos da educação ambiental no país. Ele tem doutorado em Educação (1995) e pós-doutorado no Departamento de Psicologia Social da USP e no Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília (UnB), onde também foi pesquisador colaborador. Entre abril de 2003 e junho de 2008, foi diretor de Educação Ambiental do Ministério do Meio Ambiente, na gestão de Marina Silva. Entre outros prêmios, recebeu a Medalha Defesa Civil Nacional (ano 2013) pela Secretaria Nacional de Defesa Civil do Ministério da Integração Nacional.
O especialista cita uma pesquisa do Ministério da Educação, indicando que 97,5% das escolas brasileiras relataram ter alguma modalidade de educação ambiental. Entretanto, na avaliação do professor da Esalq, apesar de alguns projetos isolados interessantes, de forma geral a educação ambiental praticada no meio escolar brasileiro ainda “não tem impacto no chão da escola, no cotidiano de alunos, professores e demais membros da comunidade escolar”.
Muitos projetos não têm continuidade, em outros casos as ações se limitam a eventos em datas cívicas ou semanas especiais. Projetos mais amplos, com um olhar mais estruturante dos desafios socioambientais, de fato transversais a várias disciplinas, “ainda são tímidos” na escola pública brasileira, entende Sorrentino.
Ele vê, porém, sinais promissores em algumas iniciativas, que podem repercutir na qualificação e ampliação do horizonte da educação ambiental praticada na escola pública. É o caso das Conferências Infantojuvenis pelo Meio Ambiente, que têm mobilizado um número cada vez maior de crianças e adolescentes e de escolas em todo país.
Outra ação muito promissora, destaca Sorrentino, é a experiência da Rede da Juventude pelo Meio Ambiente e Sustentabilidade (Rejuma), que também tem promovido a mobilização e articulação de jovens de todo país sobre o tema. A Rejuma esteve muito ativa, por exemplo, nos processos relacionados à Conferência Rio+20, em junho de 2012, e à Copa do Mundo no Brasil, em 2014.
O professor da Esalq também cita o Programa Nacional de Escolas Sustentáveis (PNES), que pode representar um novo marco para a educação ambiental praticada na rede escolar pública brasileira.
Projeto de Nação – Marcos Sorrentino entende que a educação ambiental deve estar essencialmente vinculada a “um projeto de Nação, de sociedade sustentável”. Para ele, não basta portanto que a escola pratique uma educação ambiental de fato, apesar de ser este um elemento fundamental para a construção da sociedade sustentável.
Na sua opinião, todo o município deve se tornar um educador ambiental, para a sustentabilidade, na medida em que “o aluno não aprende mais só na escola, ele aprende na rua, com os meios de comunicação, que também disseminam os seus valores”. Em resumo, a escola não será um território “para a educação ambiental transformadora, se todo o município onde o aluno vive não estiver voltado para sustentabilidade”.
Nesse sentido, destaca a relevância dos conceitos do Programa Municípios Educadores Sustentáveis, lançado pelo Ministério do Meio Ambiente quando ainda era o diretor de Educação Ambiental. O Programa foi levado como contribuição brasileira à Conferência Mundial de Educação para o Desenvolvimento Sustentável (EDS), realizada em Nagoya, Japão, de 10 a 12 de novembro de 2014.
O Programa Município Educador Sustentável visa apoiar a construção de municípios com foco na sustentabilidade, levando à formação de cidadãos que busquem soluções a questões sociais e ambientais locais através de processos educacionais. O enfoque educativo seria a forma de empoderar “os cidadãos e cidadãs, que passam a ser editores/educadores de conhecimento socioambiental, formando outros editores/educadores, e multiplicando-se sucessivamente, de modo que o município se transforme em educador para a sustentabilidade”, na definição oficial do Programa.
Esse Programa, salienta Marcos Sorrentino, um de seus idealizadores, tem interface com o Programa Coletivos Educadores, que tem o objetivo de estruturar uma rede de educadores ambientais populares a para trabalhar em todo o Brasil de modo permanente e com recursos necessários.
Os coletivos educadores, assinala o especialista, podem articular “pactos territoriais com escolas, organizações não-governamentais e poder público, visando um projeto de comunidade local sustentável”.
O Brasil já tem um Programa Nacional de Educação Ambiental, um dos frutos da Lei 9.597/99 que institui a Política Nacional de Educação Ambiental, lembra Sorrentino. “Já existe o arcabouço legal, uma produção acadêmica intensa, o que falta é a capilarização da educação ambiental por meio de uma política pública”, comenta ele. Para o professor da Esalq, que contribuiu para muito do que o Brasil já construiu em educação ambiental, a implementação e multiplicação dos Coletivos Educadores e do Programa Município Educador Sustentável poderiam ser a plataforma para essa necessária e imperativa capilarização. A crise hídrica, os dilemas do aquecimento global e tantos outros desafios de ordem socioambiental demandam um avanço substantivo da educação ambiental praticada no país. (Por José Pedro Martins)