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Em Campinas, a arte coletiva que fala a língua dos anjos
Lisa França, curadora e anfitriã, com André Ceolin, um dos expositores (Fotos José Pedro Martins)

Em Campinas, a arte coletiva que fala a língua dos anjos

Por José Pedro Martins

“Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver amor, serei como o sino que ressoa ou como o prato que retine” (Coríntios, 13-1). Os anjos não são patrimônio exclusivo do Ocidente e muito menos do Catolicismo. Estão no imaginário coletivo e presentes em múltiplas matrizes espirituais. O universo angelical é plural, assim como é plural a percepção humana sobre esses seres que nos acompanham, queiram ou não os céticos, há milênios (e até um cético especialmente doce, Drummond, se rendeu a um anjo, torto, que lhe aconselhou ser gauche na vida). A visão multifacetada sobre esses personagens imemoriais fica evidente na mostra coletiva Anjos II, aberta na noite desta segunda-feira, 28 de setembro, no Ateliê Lisa França, no Distrito de Sousas, em Campinas.

Peças de Célia Paulino

Peças de Célia Paulino

A arte fala a língua dos anjos, nos diz esta exposição de desenhos, pinturas, esculturas e fotografias, que permanece até 01 de novembro, podendo ser visitada de 14 às 18 horas no Ateliê, na rua Monsenhor Emilio José Salim, 118. Diversas linguagens falando a língua dos anjos, na 30a exposição do espaço aberto há três anos por Lisa França, uma artista e professora de artes plásticas que reuniu artistas já conhecidos, com carreira consolidada, mais profissionais de trajetória em ascensão e alunos do seu próprio Ateliê.

Lisa França, com Mario Gravem Borges e Robinson José da Silva: vernissage plural

Lisa França, com Mario Gravem Borges e Robinson José da Silva: vernissage plural

Este amálgama de saberes e olhares é que o justamente faz a diferença em Anjos II, diz Mário Gravem Borges, um dos expositores mais renomados e inquieto ativista cultural. “É essa sinergia que torna a arte bela como expressão da beleza da vida, é a visão da diversidade que não sabe ficar enclausurada”, define o artista.

Sandra Zini e seus anjos cosmopolitas: mescla de técnicas

Sandra Zini e seus anjos cosmopolitas: mescla de técnicas

Em Anjos II, a diversidade também está presente no repertório de técnicas utilizadas. Sandra Zini mesclou pintura e fotografia, em um método que vem desenvolvendo há dois anos e que, ao sintetizar a força de duas expressões milenares, produz o novo que surpreende e seduz. A cidadania global, típica do mundo contemporâneo, está presente na obra de Sandra Zini, que concebeu peças utilizando as fotografias que fez em vários pontos do planeta, de Paris a Budapeste, passando por Viena e Berlim.

Carla Stancati: anjo contemporâneo como o estilo

Carla Stancati: anjo contemporâneo como o estilo

A soma de técnicas, que gera encantamento, é a marca, igualmente, da pintura exposta por Carla Stancati, artista plástica com 20 anos de carreira. Acrílico, pastel e colagem de jornais, dialogando no fluir do anjo que escapa do humano, para que continue perto dele. Técnicas conversando, mas com um suporte mais do que tradicional e eterno. “Estamos em tempos digitais, mas a tela sempre terá o seu lugar especial e privilegiado”, defende a artista.

Robinson José da Silva e seu anjo de tecido, suporte para o barco da esperança à deriva

Robinson José da Silva e seu anjo de tecido, suporte para o barco da esperança à deriva

Muitas são as esculturas que ajudam a compor Anjos II. Um dos destaques fica para o trabalho de Robinson José da Silva, um desenhista e ilustrador que vem emergindo nos últimos anos com uma proposta de renovação da linguagem do cartunismo, caricaturismo e da charge. Foi com uma escultura em metal do compositor Cartola que ganhou, em 2014, o Salão Internacional de Humor de Piracicaba, na categoria caricatura. Pois em Anjos II Robinson comparece com um anjo enorme, de tecido, leve como requer a dureza dos tempos atuais, simbolizados pelo barco que ele colocou no alto da peça. “Esse barco pode ser aquele que transporta os anjos refugiados que morrem na travessia do Mediterrâneo”, relata, apontando para a dimensão social, crítica e política inseparável da arte.

Hugo Carreira e sua modelagem em argila

Hugo Carreira e sua modelagem em argila

Da arte que fala a língua dos anjos e dos mitos, como o de Miguel e Eva, título da modelagem em argila de Gregory William, um dos mais novos da exposição, aluno do Ateliê Lisa França. Modelagem em argila foi, do mesmo modo, o material e técnica utilizados por Hugo Carreira, um biólogo que já vinha trabalhando em madeira e começa a fazer novas incursões no território da escultura.

Vera Orsini e seu anjo de vidro: transparência necessária

Vera Orsini e seu anjo de vidro: transparência necessária

Ainda da língua dos anjos que a arte pronuncia, o vidro não poderia faltar em Anjos II.  O vidro que é a própria manifestação da metamorfose, da possibilidade de transformação, o anúncio de que novos horizontes são possíveis. Areia, água, fogo, ar, os quatro elementos conjugados. O vidro tão nobre foi o material empregado por Vera Orsini para conceber um anjo reluzente, que brilha com ou sem o artifício da eletricidade. O vidro que é a própria tradução da transparência, mais do que necessária em uma era que de vez em quando emite sinais de obscurantismo.

Coral do Regatas e maestro Jairo Perin Silveira: síntese da música universal

Coral do Regatas e maestro Jairo Perin Silveira: síntese da música universal

Tão necessária, urgente, como a música e a poesia, que não poderiam faltar na vernissage de Anjos II – que teve a presença da primeira-dama de Campinas, Sandra Ciocci. A música com o Coral do Clube Campineiro de Regatas e Natação, com regência do maestro Jairo Perin Silveira e que apresentou peças do folclore, do erudito e do popular – coquetel de estilos, em total sintonia com o espírito da mostra coletiva. A poesia, com a própria anfitriã, que recitou versos de “Via Láctea”.

O artista de Paulínia André Ceolin, mais Ana Maria Duprat, Luciana Pupo, Paulo Branco, Renato Stegun, Synnöve Hilkner são outros dos nomes da coletiva Anjos II, que nos diz muito sobre o potencial da arte. A arte que sempre falará a língua dos anjos. Aqueles que, talvez, habitem estrelas. Ora, direis, ouvir estrelas? “Amai para entendê-las!/ Pois só quem ama pode ter ouvido/ Capaz de ouvir e de entender estrelas”. O amor, de São Paulo a Olavo Bilac, é a língua dos anjos, é a língua da arte, generosa e libertadora.

Anjos II pode ser vista até 01 de novembro, no Ateliê Lisa França, em Sousas

Anjos II pode ser vista até 01 de novembro, no Ateliê Lisa França, em Sousas

 

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Organização sediada em Campinas (SP) de notícias, interpretação e reflexão sobre temas contemporâneos, com foco na defesa dos direitos de cidadania e valorização da qualidade de vida.

Um comentário

  1. Muito boa a matéria sobre os Anjos. Obrigada pela menção de meu nome e trabalho..
    Grata,
    Vera Orsini

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