Conhecidos os resultados das urnas, o governador reeleito Geraldo Alckmin (PSDB) deve finalmente admitir, a partir desta segunda-feira, 6 de outubro, a grave crise hídrica que ameaça o abastecimento, o desenvolvimento e a qualidade de vida no estado mais rico e populoso do país. Racionamento e outras medidas até agora negadas por Alckmin devem finalmente entrar para a agenda do governo paulista. Como equacionar o quadro dramático das águas é um dos principais desafios imediatos e a médio e longo prazo de Alckmin em sua quarta passagem pelo Palácio dos Bandeirantes.
A iminência de uma crise hídrica em São Paulo já era cogitada há muito por ambientalistas, cientistas e em círculos do poder. Um estudo promovido no âmbito da própria Secretaria de Saneamento e Recursos Hídricos, para a formulação do Plano Estadual de Recursos Hídricos 2012-2015, já havia ratificado a existência de vários problemas na bacia do Alto Tietê, onde está a Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), a mais atingida pela crise hídrica de 2014, ao lado das bacias dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (PCJ). (Ver na ASN http://agenciasn.com.br/arquivos/481)
Com uma estiagem inédita, e com sérias falhas na gestão dos recursos hídricos em São Paulo, a crise hídrica tem atravessado todo transcurso de 2014, e deve se prolongar por mais alguns anos, a menos que chuvas muito acima do normal aconteçam durante a Primavera atual e próximo. De fato, a atual estiagem é histórica. Na série histórica de vazões afluentes ao Sistema Cantareira, de 1930 a 2013, a média de vazão em janeiro é de 63,4 metros cúbicos por segundo (m3/s), com máxima de 127,9 m3/s. A última seca mais intensa foi a de 1953, quando a média foi de 24,5 m3/s em janeiro, mês normalmente chuvoso. Pois a média de janeiro de 2014 foi de 14,3 m3/s.
As médias abaixo das médias históricas continuaram a ser observadas nos meses seguintes, o que levou a Sabesp – a estatal que administra o Sistema – a solicitar o uso do chamado Volume Morto do Cantareira. O Sistema Cantareira é o conjunto de reservatórios, com águas da bacia do rio Piracicaba, que garante o abastecimento de metade da RMSP. Aqui está a grande falha de gestão do governo paulista, em relação aos recursos hídricos do estado.
Apesar das advertências antigas, e dos riscos climáticos derivados do aquecimento global, a Sabesp e o governo paulista têm adiado um conjunto de ações que teriam evitado a crise hídrica atual, como a redução das perdas na RMSP (que chegam a mais de 30%), o avanço substantivo no tratamento de esgotos (pouco mais de 30% dos efluentes domésticos da região recebem tratamento hoje), o incentivo ao uso racional (por meio de um permanente e eficiente programa de educação ambiental), a cobrança pelo uso da água prevista na legislação brasileira e paulista e a busca de alternativas concretas para abastecimento da Grande São Paulo, diminuindo a pressão sobre o Cantareira, cujo uso preferencialmente para a RMSP tem penalizado a bacia do rio Piracicaba, onde as águas são captadas.
Pois todas essas medidas agora se tornam inadiáveis, de São Paulo ainda deseja manter o seu ritmo de desenvolvimento. O estado, aliás, há anos já diminui sua participação no PIB brasileiro, em função das políticas de descentralização adotadas nas últimas décadas. Mas o processo pode ser acentuado, se a crise hídrica permanecer por muito mais tempo.
A crise educacional é outra séria ameaça às dinâmicas de desenvolvimento em São Paulo. E a crise perpassa todos os níveis de ensino no estado, do infantil e fundamental ao médio e superior. De acordo com dados do Ministério da Educação, de 2012, o estado de São Paulo tinha 38,5% da população de 0 a 3 anos acolhidos em creche, média bem acima da nacional, de 22,53%, mas muito abaixo do ideal.
Alguns desafios na área da educação em São Paulo foram apontados na publicação da Fundação Abrinq, “Desafios na Infância e na Adolescência no Brasil – Análise Situacional nos 26 estados brasileiros e Distrito Federal”. Diz o estudo: “No estado de São Paulo, 6,80% dos alunos matriculados no ensino fundamental não estão cursando a série adequada à sua faixa-etária, porém no Ensino Médio esse índice aumenta drasticamente: 32,90% dos alunos matriculados nessa etapa de ensino não se encontram na faixa-etária adequada”.
Em termos de qualidade na educação, o desempenho paulista também é insuficiente. O Ideb do ensino médio de São Paulo caiu de 3,9 em 2011 para 3,7 em 2013. No ensino superior, duas das três universidades estaduais, USP e Unicamp, consideradas as melhores do país, passaram por crises inéditas em 2014.
Mas os desafios para o governador reeleito de São Paulo não param na solução da crise hídrica e educacional. O estado mais poderoso do país fica a dever em muitos indicadores sociais. Segundo o Censo 2010 do IBGE, 6,62% dos habitantes de São Paulo moram em favelas, mais do que a média brasileira, de 6,01%. A cidade de São Paulo, a mais rica do Brasil, tem 11,42% da população morando em favelas. Sintoma dos índices de pobreza que permanecem no estado mais rico do país.
Na segurança pública, a situação paulista é de crise frequente. Fica o desafio para o governo paulista encontrar outras saídas, do que apenas a recorrente construção de presídios. São Paulo tem a maior população carcerária do Brasil, 297.096 presos, mais de 40% do total nacional, de 715.655, segundo levantamento deste ano do Conselho Nacional de Justiça.