Por Eduardo Gregori
O mar que banha Portugal é uma fonte inesgotável de inspiração. Seja cantado por Anamar, Dulce Pontes e Amália Rodriguez na Canção do Mar, seja na literatura, como em À Espera de Moby Dick, livro do jovem escritor Nuno Amado, e até mesmo Madonna, que gravou com a Orquestra de Batukadeiras de Portugal a faixa Batuka. O vídeo promocional da música teve como cenário a Praia de São Julião, em Sintra.
Assim como inspira, o mar luso, especialmente em Nazaré (a pouco mais de 120 Kms de Lisboa) é como uma sereia a cantar para os surfistas atraindo-os de todas as partes do mundo para lançarem-se em ondas que chegam aos 30 metros de altura, como o brasileiro Pedro Scooby, que ajudou, inclusive a criar a Surfer Wall, uma exposição no Forte de São Miguel Arcanjo sobre os surfistas que ousaram desafiar as temidas ondas que varrem a orla nazarena.
E nem mesmo as mulheres resistem à tentação de saír para o mar e desafiar as ondas em cima de uma prancha. Orgulho brasileiro, Maya Gabeira, filha de Fernando Gabeira triunfou sobre 20,72 metros e entrou para a história. É dela o título de maior onda surfada por uma mulher já registrada na história. Premiação concedida pelo Guinness Book em 2018.
Mas mesmo quem não pensa e se aventurar no mar, Nazaré, tem na sua parte alta, chamada de Sítio de Nazaré, uma vista que convida à meditar sobre o que é beleza e força. Força que deságua de forma soberana em forma de ondas na Praia do Norte.
Chegar lá em cima não é problema: pode-se ir de carro, de funicular ou, para os mais empolgados, à pé. Aliás, perdi a conta de quantos degraus é feita a escadaria que liga a Vila de Nazaré ao Sítio. Parecem infinitos, mas lá do alto, qualquer esforço vale a pena.
Nazaré é mesmo uma cidade linda e de gente simpática. A praça principal, onde fica o Santuário de Nossa Senhora da Nazaré, é um lugar muito acolhedor, com cafés, lojas de artesanato e comércio local. A ligação do povo nazareno com o mar é tamanha e tão antiga que não podia ser diferente. Uma boa lembrança dessa terra são as miniaturas de barcos em madeira ou cerâmica e as bonecas que reverenciam as senhoras que se vestem lindamente com o traje das Sete Saias.
E elas estão em todas as partes, inclusive no Sítio, a vender petiscos típicos, como tremoços e castanhas caramelizadas, estas que provei e não conseguia parar de comer de tão saborosas.
Aliás, a tradição das Sete Saias é um mito até mesmo para os nazarenos. Não há uma explicação coesa sobre como surgiu. Diz-se que representam os sete dias da semana, as sete ondas do mar e há ainda outras centenas de explicações. Porém, todos concordam que esse costume tem como fundamento é claro, o mar.
Depois de provar delicias nazarenas entrei no santuário. Não é preciso ser desta ou daquela religião para apreciar uma obra de arte arquitetônica e, em Nazaré não seria diferente. O santuário que abriga a imagem da virgem negra de Nossa Senhora de Nazaré lembra muito os templos barrocos erguidos no Brasil-Colônia, com muito ouro nas paredes e teto junto à nave principal.
A igreja é de uma beleza impar e está muito bem conservada. É, sem dúvida um patrimônio que os nazarenos devem se orgulhar. A visitação é aberta ao público, com entrada gratuita e pode-se tirar fotos. Anexo ao santuário fica o Museu Luis Nesi, com peças e obras sacras, além de objetos, trajes litúrgicos e oferendas para Nossa Senhora de Nazaré.
Prepare a câmera para tirar fotos de uma paisagem estonteante. O caminho entre o santuário e o Forte de São Miguel Arcanjo parece emoldurado pela praia de Nazaré lá em baixo, com o sol a varrer a areia e o casario a esparramar-se sobre o vale até a borda de uma montanha. Caminhei bem na beira da falésia, com a companhia constante de gaivotas que se jogavam no vazio até o mar. Que vontade de ter asas! Parei no Miradouro do Suberco, a 110 metros de altura e aproveitei o sol para ver Nazaré desde o ponto mais próximo ao mais longínquo. O caminho parece ter fim, mas é onde começa uma pequena estrada asfaltada que me leva para baixo, em direção ao forte. É bom ter fôlego porque na volta a subida será constante e íngreme.
Paga-se 1 euro para entrar e isso não é nada comparado à posição estratégica, principalmente para ver os surfistas, apreciar o mar bem aberto à sua frente ou, ao olhar para trás, ver a charmosa Nazaré de outro ângulo. O Forte de São Miguel Arcanjo foi erguido a partir de 1577 com o propósito de proteger esta parte da orla portuguesa de invasões estrangeiras, principalmente dos marroquinos e holandeses. Já sem esta função, tornou-se o principal ponto de pesca da região. Além da parte mais alta à céu aberto, o forte tem no primeiro piso um miradouro e ainda o espaço da exposição Surfer Wall e outra ala que conta sua história e importância histórica.
Quer ver de perto os surfistas ou, no verão, aproveitar para tomar um banho de mar? É só descer as trilhas ao lado do forte e pisar na areia da Praia do Norte. É bom lembrar que é ali que chegam as ondas gigantes, então não vai ser uma tarefa fácil e aliás, perigosa, se arriscar nestas águas. O risco é ainda maior quando há movimentação de surfistas e de tow-in e out, que são os rebocadores de surfistas que utilizam jet skis. Então, veja se está permitido o banho e em caso de não poder entrar, pelo menos molhe os pé na beira mar.
Já era fim de tarde quando desci as escadas em direção ao centro da cidade. O centro de Nazaré é tão gracioso quanto a parte alta. Antes do jantar recomendo sentar em algum bar na Avenida da República, a principal da cidade. Nos menus petiscos típicos com frutos do mar e um bom vinho, além de música ao vivo. Quem quiser antes fazer um comprinhas, basta caminhar pelas charmosas ruas do centro e vai encontrar deste lojas de artesanato à Joalheria. E quem acha que Nazaré é uma cidade de veraneio, digo que estive por lá em pleno inverno e o vaivém pela orla era tamanho que nem parecia estarmos sob uma temperatura de 8 graus e vento.
Fui jantar e aviso que há opção para todos os gostos e bolsos. Do fast food com sanduíches e pizzas ao menu a la carte. Opção é o que não falta.
Outros lugares
Um passeio a pé pela cidade revela lugares que não podem passar desapercebidos e que contam muito sobre Nazaré, seja pelo viés religioso, seja pela tradição e ligação de sua gente com o mar. Entre eles a Capela de Santo António, construída por pescadores na Avenida da República, a Capela da Memória (R. 25 de Abril 17), a Casa-Museu do Pescador (Rua Adrião Batalha) e o Museu Etnográfico e Arqueológico Dr. Joaquim Manso (R. Dom Fuas Roupinho 22).
Carro
Uma dica para quem vai de carro até Nazaré é deixar o veículo estacionado. Tudo é muito perto, as ruas do centro são estreitas então, estar à pé é, sem dúvida a melhor maneira de se locomover e de conhecer a cidade.
Veja o vídeo