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LISBOICES: Imitação da vida
"Bem, amanhã é mais um dia para imitar a vida e manter a sanidade mental". (Foto Acervo Pessoal)

LISBOICES: Imitação da vida

Por Eduardo Gregori

Dos dias 9 a 13 de abril o cerco se fechou em Portugal. Para conter deslocamentos desnecessários da população o governo decretou a proibição da saída do município de residência. Eu vivo em Almada e vejo Lisboa do outro lado do Tejo e mesmo tão perto não pude sair. Aliás, eu não tinha mesmo motivo.

Para além disso, as fronteiras com Espanha foram totalmente fechadas neste período. Ninguém saiu e ninguém entrou, nem mesmo portugueses ou residentes. Os aeroportos fecharam e não houve voos para nenhum lugar dentro ou fora de Portugal.

Enquanto vamos nos sentindo mais sufocados pelo confinamento, cada dia mais restrito, tento aliviar o estresse imitando a vida que levava antes dessa pandemia. Há duas semanas já estou a trabalhar em casa. Aqui o home office é chamado de teletrabalho.

Então, eu vou seguindo o que fazia. Levanto-me cedo e vou assistir o jornal da manhã. Preparo café e torradas e enquanto ficam prontos olho o movimento pela janela da varanda. Vejo o Tejo sem barcos a navegar. É estranho, mas é a realidade.

Tomo café e termino de ver o jornal. Vou checar meus emails, postar alguma coisa no blog e parto para a academia. Coloco a toalha no chão da varanda e faço meus abdominais. Comprei halteres e aproveito para puxar um pouco de ferro. Sinto falta de pular corda.

Não quero incomodar o vizinho de baixo. Já há muito estresse no ar para causar outro. Quarenta minutos, uma hora depois do treino, passa das 10h da manhã e Paulo acorda. Ele prepara seu café e conversamos sobre os novos dados da pandemia que são apresentados pela TV. Falamos também de amenidades, o que vamos comer no almoço, o que é preciso comprar e assim vai.

Vou tomar banho e como habitual vou acertando o corte da barba. Confesso que desisti de pintá-la. Os fios brancos já não são mais páreo para a tinta. Enquanto a água do chuveiro esquenta olho pela janela e não há uma viva alma passando pela praceta onde meu prédio divide espaço com outros três.

Saio do banho e escolho uma roupa para sair de casa. Uma roupa que usaria normalmente em um dia de trabalho. Só não escolho uma para dias chuvosos, que nesta altura do ano são muito comuns. Procuro algo confortável, que eu me sinta bem e a certo ponto elegante.

Volto ao banheiro, escovo os cabelos e passo o secador na barba para estica-la e deixa-la bem alinhada. Passo perfume e um primer no rosto para espantar a oleosidade da pele. A esta altura o almoço já está pronto e Paulo e eu sentamos para comer a assistir o jornal que começa à 1h da tarde.

Depois do noticiário, mais conversa e um cafezinho. Desço com o lixo, vou checar a caixa de correios e se precisa comprar algo dou uma esticada até o supermercado. Confesso que gosto quando tenho que ir comprar algo. É uma boa desculpa para sair de casa sem sentir que está fazendo algo que não deveria.

Volto para casa, faço todo o ritual de higienização. Sigo para a cozinha e preparo quase uma cafeteira completa de café. Ele vai ser meu companheiro pela tarde juntamente com o rádio. Arrumo a cama, tiro os tapetes, aspiro e passo um esfregão com anti-bactericida no chão. Tiro o pó dos móveis e limpo o espelho do banheiro. Vejo se deixei algo por fazer e me lembro da louça. Guardo a louça na lavadora e quando me dou conta já está na hora de trabalhar.

Troco de computador. Não quero ter a sensação de continuar no mesmo espaço e na mesma máquina. Abro meu outro notebook e começo minha jornada. São 5h da tarde e nesta hora estaria tomando café e comendo torradas com os amigos na cafeteria de empresa. Pois vou até a cozinha e preparo as torradas. Vou até a janela da varanda mais uma vez e observo desde o outro lado da rua até ao longe.

Às 9h da noite, como usualmente, paro para jantar. A cozinha imita o refeitório da empresa. Esquento a comida no micro-ondas, exatamente como faria no trabalho. Apenas estranho o silêncio. Na empresa, a esta hora, haveriam quase 100 pessoas comendo juntas. Muito barulho, muitos idiomas e um corre-corre de lá pra cá. Talvez esta seja a parte do dia mais distante da minha realidade.

Termino meu dia de trabalho, reencontro Paulo na sala a ver suas novelas brasileiras. Mais um cafezinho e uns biscoitos cream crackers para manter o peso. Um pouco de TV, mais um bate-papo e vamos para a cama. Bem, amanhã é mais um dia para imitar a vida e manter a sanidade mental.

contato: info@euporai.pt

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Sobre Eduardo Gregori

Eduardo Gregori é jornalista formado pela Pontifícia Católica de Campinas. Nasceu em Belo Horizonte e por 30 anos viveu em Campinas, onde trabalhou na Rede Anhanguera de Comunicação. Atualmente é editor do blog de viagens Eu Por Aí (www.euporai.com.br) e vive em Portugal