Ela é a matriarca da feira, a referência para os artesãos que há décadas trabalham com sonhos transformados em pulseiras, anéis, roupas e quadros. Aos 92 anos, Maria Nazareth (“é com th, não esquece”) Fernandes está lá, firme, todos os sábados e domingos, na feira de artesanato do Centro de Convivência Cultural, no Cambuí, Campinas. Durante a semana, participa da feira na praça Bento Quirino, no centro da cidade.
Em qualquer lugar, a disposição é a mesma. “Não fico em casa de jeito nenhum”, conta ela, magrinha, forte como uma rocha. A “vó”, como carinhosamente muitos a chamam, respeito absoluto à história de vida dessa mulher exemplar.
A fortaleza veio do contato com a terra, predominante em sua infância e adolescência, em Mogi Mirim e Mogi Guaçu. O pai plantava café, ela sempre ajudava na roça, enquanto não subia em árvore, nadava em rio, chupava laranja no pé. Sim, criancice invejável. Depois a família mudou para longe, região de Presidente Prudente, mas o contato com a agricultura continuava. Até que Maria Nazareth casou e mudou-se para Campinas.
Passou a trabalhar no comércio e se descobriu. Era a sua vocação, lidar com gente, conversar. Dirigiu caminhão, fazia carreto, mas o comércio sempre foi o forte. Morou um tempo na Baixada Santista, adorava pegar o bonde na praia, entre Santos e São Vicente. Cinco filhos, vários netos, uma grande família sempre por perto. Hoje mora com uma neta, que a ajuda no trabalho nas feiras.
“Meu espírito não é velho, não quero ficar no canto para as pessoas ficarem falando”, conta Maria Nazareth, que come pouquíssimo, talvez um dos segredos de sua vitalidade. Há poucos dias ela levou um tombo, ficou toda machucada, mas se recuperou muito rápido, para felicidade dos que a visitam sempre na feira do Cambuí.
Gosta de dizer que a rua, a feira, são “minhas faculdades”. O contato com o povo é a sua biografia. Por isso é uma trajetória tão longa e saudável. A vó Maria Nazareth faz suas pulseiras e outras peças à noite, em casa, quando já aproveitou bem o dia. Artesanato feito com a força de mãos pequenas no tamanho, enormes porque souberam como tocar a vida. (Por José Pedro Martins)