Por José Pedro Martins
No início do século 19, Revolução Industrial avançando, começaram a emergir vozes e ações pioneiras na proteção ambiental, inicialmente com um formato conservacionista. Foi neste cenário, favorável à emergência de vozes pioneiras, que apareceram contribuições fundamentais para a ideia da defesa do meio ambiente e, hoje, da sustentabilidade. Uma referência essencial nesse sentido, até hoje, é Henry David Thoreau, para alguns autores o primeiro “ambientalista” ou “ecologista”, no perfil que os termos assumiram.
Thoreau nasceu a 12 de julho de 1817, e sempre viveu na pequena cidade de Concord, no estado de Massachusetts. Era leitor compulsivo da literatura oriental e dos clássicos, que forneceram a base de sua proposta de vida simples e amor à natureza, radicalizada quando decidiu construir uma pequena casa às margens do lago Walden.
Por recusar-se a pagar impostos – que na sua opinião eram utilizados pelo governo em atividades bélicas – Thoreau foi preso. A escravidão, a militância partidária e a situação dos índios foram devidamente denunciados por Thoreau, que morreu em 1862. Defesa do meio ambiente natural e das vítimas humanas do modelo de desenvolvimento predador.
“A desobediência civil” é um dos textos mais conhecidos de Thoreau. Um paradigma de ação ética, de radicalidade em defesa de uma causa. Atitude pouco comum nos dias atuais, em que a prática muitas vezes está bem distante do discurso.
O período em que Thoreau viveu foi marcado por um dos maiores genocídios da história, ocorrido nos Estados Unidos. Populações indígenas inteiras foram dizimadas, como aconteceu com os Navajo, que ficaram reduzidos a poucos sobreviventes a partir de 1864. O exemplo de Thoreau, que protestava com suas atitudes pacíficas contra esse estado de coisas, ficou marcado na história como o do poder das ideias contra as armas.
Seu estilo de escrever é cortante, cheio de ironia, como nessa passagem para muitos profética…: “O que é este governo americano senão uma tradição, embora recente, que se empenha em passar inalterada à posteridade, mas que perde a cada instante algo de sua integridade? Não possui a vitalidade e a força de um único homem vivo, pois pode dobrar-se à vontade deste homem. É uma espécie de arma de brinquedo para o povo, mas nem por isso menos necessária, pois o povo precisa ter algum tipo de maquinaria complicada, e ouvir sua algazarra, para satisfazer sua ideia de governo”.
O seu livro “Walden, a vida nos bosques”, é a apologia da vida simples, junto à natureza, consumindo-se apenas o que realmente é necessário. Uma vida não competitiva e, portanto, não-violenta. Não por acaso, Thoreau foi uma fonte de inspiração para muitos apóstolos da não-violência, como Leon Tolstoi (1828-1910) e o próprio Mahatma Gandhi (1869-1948).
É notável a influência de Thoreau através dos tempos, pelo frescor de suas ideias, que permanecem novas, porque ainda dizem muito a respeito de como deve e pode ser uma vida simples e feliz. Em 1907 o poeta espanhol Antonio Machado (1875-1939) escreveu um comentário sobre “Walden”, assim encerrando o artigo: “Leiam, pois, intelectuais espanhóis, se ainda não o haveis aprendido de memória, o livro deste intelectual que sonhou como latino e como saxão pôs em prática o seu sonho”. Ainda sob o impacto da barbárie da Segunda Guerra Mundial, em 1948 B.F.Skinner (1904-1990) publicou “Walden Dois”, narrativa sobre utopia humanista, baseada em Thoreau.
Como um dos indicadores mais recentes da permanência do pensamento de Thoreau, em 7 de junho de 2004, na cidade do México, foi inaugurada a cátedra Henry David Thoreau, na Faculdade de Filosofía e Letras da Universidad Nacional Autônoma do México (UNAM). Mais um tributo à contribuição de Thoreau, que continua sendo referência para uma nova forma de pensar e viver a vida. Uma vida que, se espera, no século 21 seja sustentável, para a garantia de continuidade da própria vida.
– O governo, no melhor dos casos, nada mais é do que um artifício conveniente; mas a maioria dos governos é por vezes uma inconveniência, e todo o governo algum dia acaba por ser inconveniente.
– Deve o cidadão desistir da sua consciência, mesmo por um único instante ou em última instância, e se dobrar ao legislador?
– Todos reconhecem o direito à revolução, ou seja, o direito de negar lealdade e de oferecer resistência ao governo sempre que se tornem grandes e insuportáveis a sua tirania e ineficiência.