Por José Pedro Martins
País rico em água, biodiversidade e possibilidades enormes em energia renovável, o Brasil está perdendo a oportunidade histórica de liderar o debate sobre as mudanças climáticas. A advertência foi feita em Campinas pelo pesquisador Paulo Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), durante o 24º Encontro e Assembleia anuais da Associação Nacional de Órgãos Municipais de Meio Ambiente (ANAMMA), que termina hoje, 25 de junho, à tarde no Hotel Solar das Andorinhas.
Paulo Nobre entende que o Brasil não está se posicionando como deveria e poderia no debate sobre as mudanças climáticas, que terá um momento decisivo no final do ano, em Paris, com a realização da Conferência das Partes da Convenção das Mudanças Climáticas (COP-21). A expectativa é de que, no encontro na capital francesa, seja finalmente estabelecido o acordo para redução das emissões de gases que alimentam o aquecimento global.
Para Nobre, o Brasil deveria incrementar os investimentos em ciência e tecnologia, para de fato viabilizar o enorme potencial que tem em energias renováveis e também em outras áreas que definem o desenvolvimento sustentável. “É preciso prover de insumos científicos, de modo que o Brasil participe ativamente, estabelecendo uma liderança, da nova fase que já está em curso, rumo à economia de baixo carbono”, disse o cientista, em entrevista exclusiva para a Agência Social de Notícias. “Infelizmente estamos lentos nesse caminho, que não representa uma equação simples, pelo contrário, implica em muita complexidade”, afirma.
Ele cita o exemplo dos Estados Unidos, onde durante muito tempo o discurso oficial, durante o governo Bush, principalmente, foi até de negar a participação humana nas mudanças climáticas. Hoje, entretanto, no governo Obama, “os Estados Unidos estão perfeitamente alinhados” com as discussões globais, observa. E o motivo é que as Universidades americanas, os seus centros de pesquisa, continuaram investindo e atentos para as demandas da economia de baixo carbono.
Apesar dos resultados práticos das negociações dos últimos 20 anos, desde a Eco-92, não terem sido totalmente satisfatórios em termos de reduções reais das emissões de gases que alimentam o aquecimento global, Paulo Nobre se diz otimista. “Se não acontecer na COP-21, será na COP-22 ou 23″, assinala.
Para ele, um indicativo de mudanças reais, em termos de posturas relacionadas às mudanças climáticas, é o “posicionamento de setores importantes do capital, percebendo que essas mudanças representam uma séria ameaça ao próprio capital”. Cita a respeito o caso do Fundo Soberano da Noruega, que envolve cerca de US$ 1 trilhão e que está reduzindo significativamente os investimentos em energias fósseis, para investir em fontes de fato renováveis. O mesmo tem ocorrido com outros fundos de investimento, acrescenta o cientista do INPE.
A mudança será inevitável, igualmente, diz Nobre, em função da percepção popular sobre o tema. “Estão acontecendo muitos eventos extremos e a população vai acabar exigindo mudanças, o que vai se refletir nos governos”, ele acredita.
Nesse sentido entra o papel dos municípios, disse Nobre, por ocasião do Encontro Nacional da ANAMMA. “Não é preciso esperar dos governos federal ou estaduais. Os municípios podem fazer coisas importantes”, defendeu, indicando o caso do município de Extrema, no sul de Minas Gerais, que adotou um programa pioneiro de pagamento por serviços ambientais, hoje referência nacional e internacional. “O gestor local também deve estar atento a essas oportunidades”, completou o cientista do INPE.
Programação – Na manhã desta quinta-feira está acontecendo, no Solar das Andorinhas, a Assembleia Anual da ANAMMA, com eleição de nova diretoria. À tarde, encerrando a programação, haverá visita técnica à usina solar de Tanquinho, da CPFL, e plantio de mudas de árvores, como compensação à emissão de carbono em função do evento.
Também à tarde, as duas últimas mesas. Uma sobre Oportunidades na economia de baixa intensidade de carbono frente às mudanças climáticas. E a outra sobre Agrotóxicos no Brasil: desafios para os municípios, com a participação da dra.Silvia Brandalise, presidente do Centro Boldrini; do dr.Carlos Eduardo Abrahão, médico da Prefeitura de Campinas; e de Luiz Henrique Bambini, da Prefeitura de São Paulo, que falará sobre o programa de introdução de alimentos orgânicos na merenda escolar na capital paulista.