Em 1995, como presidente da Fundação FEAC, Luis Norberto Pascoal coordenou a Aliança de Campinas pela Educação, um movimento que visava articular a comunidade pela questão educacional e que resultou em várias iniciativas. Duas décadas depois, o empresário continua envolvido com o tema, como diretor da FEAC e membro do Compromisso Campinas pela Educação (CCE). Na manhã desta quinta-feira, 30 de julho, durante encontro do CCE, Pascoal pediu que a sociedade brasileira em geral, e a campineira em particular, “fique indignada com a qualidade da educação e coloque esta questão no centro de suas prioridades”. Ele fez o apelo logo depois da divulgação de estudo do Observatório da Educação, apontando vários desafios educacionais para a cidade (ver http://agenciasn.com.br/arquivos/4138).
“Será nossa responsabilidade, da sociedade de hoje, se não melhorarmos a educação para os nossos filhos e netos”, disse Pascoal. “Essa deveria ser a nossa maior motivação, pois a crise educacional é muito mais grave do que a crise econômica”, completou o empresário, encerrando mais um Encontro Mensal do Compromisso Campinas pela Educação, iniciativa coordenada pela Fundação FEAC e criada em 2007.
Durante o evento, Pascoal advertiu que “a melhoria da educação não acontece de uma hora para outra”, o que para ele justifica uma reação imediata por parte da sociedade em geral, junto com empresariado e poderes púbicos. O empresário lembrou que, desde o lançamento da Aliança de Campinas pela Educação, já são 20 anos com muita discussão e ações sobre a temática na cidade, e como os desafios ainda são muito expressivos é fundamental incrementar os esforços. “Agora temos o Compromisso Campinas pela Educação e um Plano Municipal de Educação. O momento é agora de ampliar a mobilização”, concluiu, lembrando a participação “de três grandes educadores” na Aliança de Campinas pela Educação, o colombiano Bernardo Toro, o escritor Rubem Alves e Antônio Carlos Gomes da Costa.
Como um dos responsáveis pelo ECA colaborou com a Aliança de Campinas pela Educação
Em 1989, Luis Norberto Pascoal criou a Fundação Educar DPaschoal. Ano seguinte à promulgação da Constituição Cidadã, que consolidou muitos direitos fundamentais, pela primeira vez na história brasileira. Entre eles, os direitos da infância e juventude, sedimentados no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), de 1990, que colocou o Brasil na vanguarda da adoção da Doutrina da Proteção Integral.
Um dos responsáveis pelo ECA foi o educador Antônio Carlos Gomes da Costa (ver artigo “Bastidores da construção do ECA, que chega aos 25 anos sob sério risco de descaracterização”, em http://agenciasn.com.br/arquivos/3916). Pois Gomes da Costa seria um dos nomes mais importantes da Aliança de Campinas pela Educação, lançada em 1995. O Compromisso Campinas pela Educação é uma das iniciativas surgidas no contexto das discussões iniciadas pela Aliança, de duas décadas atrás.
A Aliança é resultado de seminário interno em 1995, na FEAC. O seminário reafirmou a educação como uma das prioridades para a instituição nos anos seguintes. No biênio 1995-96 a diretoria executiva da FEAC era integrada por Luis Norberto Pascoal (presidente), Darcy Paz de Pádua (vice-presidente Área Social), José Carlos Vanucchi (vice Área Administrativa), Augusto Fernando Barros Pimentel Filho (vice Patrimonial) e Donald Peter Graber (vice Relações Externas).
Impulso importante foi dado em conversa entre técnicos e dirigentes da FEAC, em Belo Horizonte, com o educador Antônio Carlos Gomes da Costa, que havia sido um dos idealizadores e principais protagonistas do Pacto de Minas pela Educação. Evoluiu então a ideia de iniciativa semelhante em Campinas, visando a garantia de vagas para todas as crianças na escola e uma educação de qualidade.
Como subsídio às discussões internas na FEAC, Gomes da Costa preparou um documento, intitulado Infância, Juventude, Estado e Sociedade no Brasil – na Ante-Sala do ano 2000. O educador situava a importância estratégica do investimento maciço em Educação no Brasil perante o cenário internacional, caracterizando-o pelos impressionantes avanços tecnológicos; novas modalidades de organização do trabalho; emergência da economia do conhecimento; prevalência da qualificação do capital humano sobre outros fatores produtivos de bens e serviços; surgimento de um mercado global de capitais; e emergência e expansão dos blocos econômicos internacionais.
Nesse contexto, Gomes da Costa sublinhava o imperativo do envolvimento integral das comunidades em um projeto de fomento à Educação e de qualidade para todos. O texto concluía com as Dez razões para que a FEAC faça da Educação o eixo estruturador de sua atuação. Seriam essas, em síntese:
- É necessário introduzir mudanças radicais nas estratégias de educação básica, de modo a responder às necessidades do processo de transformação econômica, de equidade social e democratização política em que está imersa nossa sociedade.
- É preciso converter as políticas de Educação em políticas de Estado e, não, em políticas de governo. A experiência das últimas décadas nos ensina que uma das garantias de êxito na política educacional é a continuidade. Para que haja continuidade, é preciso que os compromissos com Educação sejam assumidos não apenas pelo governo, mas pelo conjunto das forças vivas da sociedade;
- É importante reconhecer que o requisito fundamental da nova estratégia educacional é fazer com que o sistema de ensino atenda às demandas da sociedade e, não, do aparato administrativo que o controla;
- A nova estratégia, baseada nos princípios da descentralização, da participação e da mobilização, exige uma nova divisão do trabalho educacional entre a União, os Estados e os Municípios e uma nova postura por parte da sociedade, convocada a participar na formulação das políticas e no controle das ações governamentais nos diversos níveis;
- A responsabilidade de compartilhar com a sociedade não significa diminuir a responsabilidade do Estado em garantir a universalização de um ensino fundamental de boa qualidade.
- As novas estratégias devem enfatizar a autonomia dos estabelecimentos escolares e a maior responsabilidade da família e da comunidade local nos resultados, acompanhados por mecanismos de avaliação externa e de controle social dos resultados.
- É preciso ainda sustentar o princípio de que o importante é que os alunos aprendam e, não, os anos de escolaridade ou os certificados que conseguirem. O objetivo é que os alunos tenham sucesso na sala de aula e na vida. Isso só poderá ocorrer pela satisfação das necessidades básicas de aprendizagem requerida pelos novos tempos:
- Domínio da lecto-escritura;
- Capacidade de calcular e de resolver problemas;
- Capacidade de descrever, analisar, compreender e sintetizar dados, informações e situações;
- Capacidade de receber criticamente os meios de comunicação;
- Capacidade de compreender e operar o seu entorno social;
- Capacidade de acessar informações;
- Capacidade de trabalhar em grupo.
- Estes objetivos não devem ser perseguidos apenas pela escola. Com base no conceito integrador de educação para a vida, preparar as novas gerações para dominar esse conjunto de conhecimentos e habilidades é responsabilidade da família, da escola e das organizações sociais;
- É como Fundação Social mobilizada pela educação que a FEAC decidiu dizer sim ao desafio de trabalhar e lutar pela melhoria da qualidade do ensino fundamental no Brasil, atuando de forma solidária com o governo e outros atores sociais;
- É importante reconhecer que o futuro coloca ao Brasil o desafio de inovar em termos de educação, implantando tendências irreversíveis na direção pretendida e realizando ações de médio e longo prazos.
Divisor de águas – Com este texto e com presenças constantes na FEAC, Antônio Carlos Gomes da Costa foi um dos pilares da Aliança de Campinas pela Educação, ao lado do empresário Luis Norberto Pascoal.
O seminário Educação para a Vida promovido pela FEAC foi realizado nos dias 6 e 7 de outubro de 1995, no Novotel Campinas-Norte. Com ativa participação de dirigentes e funcionários da FEAC, e voluntários do Grupo Vita, o seminário teve coordenação do próprio Gomes da Costa.
A lista de 54 convidados a participar incluía desde o prefeito José Roberto Magalhães Teixeira, o presidente da Câmara Municipal, Romeu Santini, secretários municipais e autoridades militares, até os reitores da Unicamp, José Martins Filho, e PUC-Campinas, Gilberto de Luiz de Moraes Selber, e representantes dos diversos segmentos da sociedade de Campinas, como centrais sindicais, sistema S, religiosos e representantes de organizações, como dra.Silvia Brandalise, do Centro Boldrini, e dra.Silvia Bellucci, do Centro Corsini.
Os participantes foram divididos em grupos. Em uma folha deveriam colocar suas impressões sobre as perguntas: Por que fazer um pacto pela Educação em Campinas? Quais os problemas que nos levar a fazer um pacto pela Educação em Campinas?
A decisão principal do seminário foi pelo empenho de todos segmentos na criação da Aliança de Campinas pela Educação, visando mobilizar a comunidade em várias ações para a conquista da educação para todos e de qualidade. E foi constituída uma Comissão Executiva para coordenar a Aliança. O lema escolhido foi: Campinas pela Educação – Todo mundo na escola. As palavras chave: Ingresso, Regresso, Permanência e Sucesso (IRPS) da Criança na Escola.
O lançamento oficial aconteceu no dia 7 de dezembro de 1995, na sede da FEAC, onde os representantes dos diversos segmentos assinaram um termo de compromisso. No mesmo dia foram apresentadas duas pesquisas encomendadas pela FEAC à Fundação Getúlio Vargas: Um estudo sobre jovens de cinco núcleos residenciais da periferia pobre de Campinas e Estratégias de vida e aspirações da população de baixa renda de Campinas.
Impactos da Aliança – A Escola 31 de Março, no Jardim Santa Mônica, um dos bairros de maior índice de vulnerabilidade social em Campinas, foi escolhida para ser sede de um projeto piloto da Aliança de Campinas pela Educação. Durante um final de semana de abril de 1996, jovens voluntários entrevistaram 2.238 pessoas, morando em 554 residências, basicamente em núcleos de favela. Foram identificados 501 crianças e adolescentes, e 29 deles estavam fora da escola. Os jovens e técnicos da FEAC, União Cristã Feminina e Escola 31 de Março trabalharam então pelo retorno das crianças à escola, e somente em um caso houve necessidade de se recorrer ao Conselho Tutelar.
Várias ações foram realizadas. Os jovens do Santa Mônica criaram uma entidade, a Agentes em Busca de Alunos Evadidos (ABAE), para garantir a presença de todas crianças na escola. Como reforço escolar, foi criado no bairro o projeto Lição de Casa, que teve o apoio de uma mini-biblioteca. A escola recebeu um Plantão de Dúvidas.
Uma pesquisa também foi realizada no Parque Itajaí, um dos bairros mais distantes do centro de Campinas na época. Foram identificados 24 crianças e adolescentes fora da escola. Inspiradas pela Aliança, outras ações movimentaram outros bairros. No Distrito de Barão Geraldo, nasceu um movimento local. Na Vila Lafayette Álvaro, houve mobilização semelhante à do Jardim Santa Mônica pela presença de todas crianças na escola, e o resultado foi o retorno de 31 das 39 que estavam fora. No Novo Flamboyant, houve intensa participação do Serviço Social Nova Jerusalém e Creche Semente da Vida. Nos bairros da Conquista e Vitória, atuaram o Centro Assistencial Romília Maria, a Associação São João Vianney e o Núcleo de Crianças da Vila Ipê.
Várias empresas e organizações empresariais se mobilizaram e se envolveram em ações da Aliança. A Fundação Educar DPaschoal lançou em 1998 o Selo Educação.
Censo Escolar no Campo Grande – Uma das ações mais importantes foi o estabelecimento de ampla coalizão pelo avanço da educação de qualidade na região do Campo Grande, uma das mais populosas de Campinas. Foram estabelecidas várias parcerias, com empresas e organizações como o Sindicato dos Especialistas de Educação do Magistério Oficial do Estado de São Paulo (Udemo) e o Conselho Regional das Associações Comunitárias da Região Campo Grande (Coregran).
O propósito era realizar um Censo Escolar na Região do Campo Grande, para identificar quantas crianças estavam fora da escola e quais as causas da ausência. Foram formados grupos de trabalho, houve um detalhado planejamento e processo de captação de recursos.
O Censo começou no dia 25 de maio de 1998 e foi realizado aos sábados e domingos, terminando a 6 de dezembro. Houve muito envolvimento comunitário e de empresas situadas ou atuando na região Campo Grande.
A Aliança continuou gerando frutos nos anos seguintes. Em 2007, a Fundação FEAC passou a coordenar o Compromisso Campinas pela Educação (CCE), lançado como uma célula local do movimento nacional Todos pela Educação, de 2006. O CCE tem promovido várias ações, com grande apoio na comunidade, e prepara a 6ª edição da Semana da Educação de Campinas, para o início de novembro, no momento em que estarão sendo lembradas as duas décadas da Aliança, que teve em Antônio Carlos Gomes da Costa um de seus principais protagonistas. Mas Luis Norberto Pascoal também cita o educador colombiano Bernardo Toro, como um dos inspiradores dos conceitos que levaram à criação da Aliança, e o escritor Rubem Alves, “por ajudar a pensar diferente os rumos da educação”. A educação ideal ainda em construção no Brasil, com uma importante contribuição de Campinas. (Por José Pedro Martins)