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Festival Hercule Florence volta a abraçar Campinas com os encantos da fotografia
Família Barcellos, da Relojoaria Barcellos: Estão no mesmo endereço desde 1961. A foto da família toda foi tirada ao lado da placa que identifica a loja como um dos únicos locais que fazem gravações de nomes em alianças, placas de metal, canetas tinteiras e etc..., hoje em dia na cidade. Na foto estão João Marques Barcellos (pai), Cecília Pádua Barcellos (mãe) e o filho Antonio de Pádua Marques Barcellos (filho). É uma história de pai pra filho desde 1961 (Foto Adriano Rosa)

Festival Hercule Florence volta a abraçar Campinas com os encantos da fotografia

Com o tema Febre, de enorme atualidade, começa nesta quarta-feira, dia 19 de abril, a décima edição do Festival Hercule Florence, que mais uma vez trará grandes nomes da fotografia para Campinas. Serão várias atividades, divididas em dois eixos curatoriais: Fotografia de Rua e Imagem Mágica. O festival é a principal atividade realizada na cidade em homenagem ao francês Hercule Florence, que para muitos estudiosos inventou a fotografia em Campinas, onde passou a morar depois de participar da épica Expedição Langsdorff. Como a cidade costuma se esquecer da multifacetada obra do cientista e artista que nela viveu, o festival idealizado pelo fotógrafo Ricardo Lima é o momento de saldar a dívida histórica. O editor de fotografia da Agência Social de Notícias, Adriano Rosa, é um dos participantes da edição de 2017 do Festival Hercule Florence.

Workshops, exposições, fóruns, mesas de discussão, performances, intervenções urbanas, ações performáticas, lançamentos editoriais e grupos de trabalho coletivo são algumas das atividades que integram a 10ª edição do Festival Hercule Florence, que se estende até dia 23 em Campinas com as principais atividades na Unicamp e na Estação Cultura. Serão muitas ações independentes espalhadas pela cidade. Ilustram este texto fotos de Adriano Rosa, que integram a exposição que estará montada ao longo da Rua 13 de Maio, com personagens do mais tradicional centro de compras da cidade.

A divisão em dois eixos curatoriais foi pensada para possibilitar a discussão dos espaços ocupados pela fotografia na contemporaneidade e a persistência das técnicas retrospectivas na construção da imagem. “Trouxemos o Festival para a Unicamp para que a parte teórica da fotografia também seja aproveitada em um ambiente acadêmico, onde a produção de conteúdo é fundamental”, afirma Sylvia Furegatti, curadora do evento ao lado de Ana Angélica.

Onofre da Silva Marques: O Maringá, como é popularmente conhecido no centro da cidade, é o cara encarregado de engraxar e concertar as portas de aço das lojas de muitas das lojas da 13 de Maio. Isso desde os anos 50. Quando era mais jovem, o serviço dele também era de apagar as luzes das vitrines depois das 22hs. Na foto com sua inseparável antiquíssima bicicleta, onde carrega suas ferramentas (Foto Adriano Rosa)

Onofre da Silva Marques: O Maringá, como é popularmente conhecido no centro da cidade, é o cara
encarregado de engraxar e concertar as portas de aço das lojas de
muitas das lojas da 13 de Maio. Isso desde os anos 50. Quando era mais
jovem, o serviço dele também era de apagar as luzes das vitrines
depois das 22hs. Na foto com sua inseparável antiquíssima bicicleta,
onde carrega suas ferramentas (Foto Adriano Rosa)

Contemplado no Programa de Ação Cultural (ProAc) de 2016, o festival reúne nomes de peso da fotografia de Campinas e do Brasil como Miguel Chikaoka, Dirceu Maués, Cássio Vasconcelos, Érico Hiler, Ricardo Hantzschel, Fabiana Bruno e João Kulcsar para discutir os rumos da fotografia na atualidade, a urgência, o uso da tecnologia na imagem e as práticas editorias.

Painéis gigantes serão expostos no calçadão da cidade com imagens de transeuntes, um painel com milhares de fotografias formando uma grande imagem será produzido por Miguel Chikaoka, Dirceu Maués traz seus tambores para expor imagens, Érico Hiler fala sobre os Rinocerontes. O grupo No Future realiza uma interveção no túnel de pedestres e o conceituado Erro 99 traz seu imperdível show de likes e oficina de memes.

De 21 a 23 de abril, as atividades se concentram na Estação Cultura, com oficinas, workshops gratuitos e pagos, exposições, palestras, intervenções, mesas de discussões, aulas abertas, leitura de portfólios e a tradicional caminhada fotográfica.

Edson Roberto Lunardi, o Beto da Bicicletaria: O Beto é o proprietário da única bicicletaria da Rua 13 de Maio. Isso desde 1956, quando o pai dele abriu a loja um pouco pra baixo da estação de trens. Está lá até hoje e tem muita história pra contar. Como ele mesmo diz, a sua loja é um ser estranho no meio das outras lojas da 13. Mas muito atual, diante da febre das ciclovias. (Foto Adriano Rosa)

Edson Roberto Lunardi, o Beto da Bicicletaria: O Beto é o proprietário da única bicicletaria da Rua 13 de Maio. Isso
desde 1956, quando o pai dele abriu a loja um pouco pra baixo da
estação de trens. Está lá até hoje e tem muita história pra contar.
Como ele mesmo diz, a sua loja é um ser estranho no meio das outras
lojas da 13. Mas muito atual, diante da febre das ciclovias. (Foto Adriano Rosa)

Nos 10 anos de Festival na cidade, foram realizadas 40 oficinas. Mais de 80 fotógrafos brasileiros e estrangeiros vieram contribuir para o evento. Mais de 60 exposições estiveram em cartaz e 120 mil pessoas participaram do evento ao longo dos anos.

“Lembro que quando criei o Festival, minha ideia era apenas mexer com a fotografia na cidade. Hoje em dia, dezenas de fotógrafos são nossos parceiros. Temos parceria da Canon, da Canson, da Unicamp e apoio do Governo do Estado, através do ProAc. O festival colocou a fotografia em pauta e a cada ano temos novas discussões da imagem como linguagem. Acho interessante esse aspecto do festival, que além de tornar a imagem mais acessível ao conhecimento, discute o que está acontecendo na atualidade”, ressalta Ricardo Lima.

Mais informações no site: www.festivalherculeflorence.com.br

Montagem da exposição Urbanidades, uma das atividades que constam do Festival Hercule Florence (Foto Carlos Rincon/Divulgação)

Montagem da exposição Urbanidades, uma das atividades que constam do Festival Hercule Florence (Foto Carlos Rincon/Divulgação)

Hercule Florence, ainda um desconhecido em Campinas 

Apesar de sua importância histórica, Hercule Florence ainda é um quase desconhecido em Campinas, fora dos círculos da fotografia e do jornalismo. Nascido em Nice, na época italiana e hoje na França, em 1804, Antoine Hercule Romuald Florence herdou do pai a vocação para o desenho. Apaixonado pelo mar, e iluminado pelas aventuras de Robinson Crusoé, aos 18 anos se alista na Marinha. Em 1824 já está no Rio de Janeiro, trabalhando como livreiro, vendedor de roupas e tipógrafo, ofício que seria muito útil, depois, em sua estadia em Campinas.

Em 1825, Florence é recrutado para uma das mais importantes e turbulentas expedições científicas realizadas no Brasil Imperial, aquela liderada pelo conde e naturalista russo Georg Heinrich von Langsdorff. Até 1829, Florence foi um dos responsáveis pelo registro iconográfico da exposição que percorreu 13 mil quilômetros de vários estados e fez uma relevante documentação etnográfica e geográfica do “Brasil profundo”. Inicialmente o desenhista principal foi Johann Rugendas, papel depois assumido por Aimé Adrian Taunay.

A expedição foi marcada por tragédias. Em 1828, Taunay se afogou no rio Guaporé, no Mato Grosso. O próprio Langsdorff foi vítima de doenças tropicais, o que acabou inviabilizando a publicação dos achados científicos da forma como tinha sido idealizado.

Em 1830 Florence já está na Vila de São Carlos, o nome de Campinas até 1842. Ele se casa em primeiras núpcias com Maria Angélica Álvares Machado e torna-se inicialmente comerciante. Depois será proprietário rural.

Não havia tipografia, ainda, na Vila, e Florence desenvolve o próprio método, a Polygraphie. Ele também é precursor da ciência de registrar os sons dos pássaros, que denominou Zoophonie. Em 1858, sua tipografia imprimiu o primeiro jornal de Campinas, “Aurora Campineira”.

Mas a sua maior invenção, provavelmente entre 1832 e 1833, já morando em Campinas, foi a fotografia, pelos estudos pioneiros que realizava, de forma simultânea com nomes como Louis Daguerre (1787-1851). Morando no interior do Brasil, em uma época não muito aberta a inovações, Florence acabou não tendo o reconhecimento devido, como teve Daguerre em solo europeu.

Florence casou-se em segundas núpcias com Carolina Krug, nascida em 1828 em Kassel, na Alemanha, e desde 1852 residindo em Campinas. Em 3 de novembro de 1863 o casal inaugura o Colégio Florence, um marco na história da educação local, e que em 1889 será transferido para Jundiaí, em função da febre amarela que devastou Campinas.

Hercule Florence morreu em 27 de março de 1879. Seu nome e obra são muito citados e conhecidos no meio intelectual e acadêmico e entre os profissionais da fotografia, mas de forma geral Campinas ainda não conhece e reconhece devidamente o seu trabalho. O Festival de Fotografia de Campinas “Hercule Florence”, que agora soma dez edições, sob a coordenação e curadoria do fotógrafo Ricardo Lima, é uma das únicas iniciativas que lembram à altura o importante inventor. Mas a cidade ainda pode fazer muito mais. (Por José Pedro Martins)

 

 

 

 

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