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“Fábrica de Marianas” é condenada por ANAMMA e mais de 250 organizações e pesquisadores
Organizações sociais atentas a propostas de mudança no licenciamento ambiental (Foto Adriano Rosa)

“Fábrica de Marianas” é condenada por ANAMMA e mais de 250 organizações e pesquisadores

Um conjunto de mais de 250 organizações, entre as mais representativas da sociedade civil, e pesquisadores divulgou nota de protesto contra medida que deve ser votada nesta quarta-feira, 14 de dezembro, na Câmara dos Deputados, flexibilizando o licenciamento ambiental no Brasil. O substitutivo do deputado federal Mauro Pereira (PMDB/RS), membro da bancada ruralista no Congresso Nacional, também foi repudiado em Carta Aberta pela Associação Nacional de Órgãos Municipais de Meio Ambiente (ANAMMA). A ameaça representada pela flexibilização no licenciamento ambiental vem sendo considerada em órgãos de imprensa e por organizações sociais como “fábrica de Marianas”, em referência ao acidente com uma barragem no município mineiro no final de 2015.

Assinada por organizações de peso como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Observatório do Clima e WWF-Brasil, além de pesquisadores renomados como a antropóloga Manuela Carneiro da Cunha e o professor de Ecologia da Unicamp Thomas Lewinsohn, a nota conjunta observa que o Projeto de Lei n.º 3.729/2004 “pretende estabelecer a nova Lei Geral do Licenciamento Ambiental, tema altamente complexo e com destacada relevância para a sociedade brasileira”.

Apresentado em 15 de setembro de 2016, o substitutivo do deputado federal Mauro Pereira (PMDB/RS), para as organizações e pesquisadores signatários,  “não foi objeto de nenhum debate, audiência pública, sessão deliberativa ou qualquer outra forma de apreciação e aprofundamento, seja por parte dos Deputados Federais, seja por parte da sociedade nacional”.

A nota prossegue: “Considerando-se a recente divulgação de escândalos de corrupção para privilegiar interesses privados em detrimento de interesses públicos; a notória importância do licenciamento ambiental para todos os setores da sociedade, incluindo o papel do Poder Público no âmbito do desenvolvimento nacional; e a complexidade e profundidade dos temas envolvidos, além das diversas lições aprendidas a partir da experiência acumulada em casos práticos, é preciso que a Câmara dos Deputados esteja adequadamente apropriada das diversas facetas que a matéria apresenta, para que possa, ao final, tomar decisões acertadas, ao encontro do interesse público e do atendimento à Constituição Federal”.

É fundamental, defendem os signatários, “que haja um amplo debate nacional sobre o tema. O substitutivo apresentado pelo Deputado Federal Mauro Pereira figura, entre os textos em tramitação, como aquele que pretende impor os mais graves retrocessos à legislação atualmente em vigor, além do notável baixo nível de técnica legislativa, o que prejudica a interpretação dos dispositivos, podendo gerar insegurança jurídica e ampliação de ações judiciais. Exemplos de retrocessos incluídos no texto: dispensa de licenciamento para atividades poluidoras específicas, criação de licenciamento autodeclaratório, permissão aos Estados e Municípios para flexibilizar exigências ambientais sem qualquer critério, possibilidade de autorizações tácitas por vencimento de prazos e de suspensão de condicionantes ambientais por decisão unilateral do empreendedor, bem como eliminação da responsabilidade socioambiental de instituições financeiras por atividades por elas apoiadas, entre outros”.

A eventual aprovação da referida proposta, conclui a nota, “ainda mais sem os imprescindíveis debates públicos, geraria inúmeras consequências negativas, como o significativo aumento de risco de ocorrência de desastres socioambientais, a exemplo do rompimento da barragem de rejeitos em Mariana (MG), a ausência de prevenção, mitigação e compensação de impactos decorrentes de empreendimentos, a reiterada violação de direitos das populações atingidas, a ampliação dos conflitos sociais e socioambientais e a absoluta insegurança jurídica aos empreendedores e ao Poder Público”. As organizações e pesquisadores signatários afirmam então repudiar “qualquer tentativa de aprovação do substitutivo ao Projeto de Lei n.º 3.729/2004 apresentado pelo Deputado Mauro Pereira, principalmente sem que sejam realizados debates amplos, mediante audiências públicas, com a participação dos mais diversos especialistas de diferentes setores da sociedade em relação aos complexos temas envolvidos na matéria”.

A ANAMMA também se posicionou frente ao substitutivo do deputado Mauro Pereira. “Essa carta visa esclarecer a sociedade sobre os riscos de açodada votação do Projeto de Lei Substitutivo, elaborado pelo Deputado Mauro Pereira (PMDB/RS), que, se aprovado como está, irá causar prejuízos à gestão ambiental no país, em especial às atividades a cargo dos órgãos municipais de meio ambiente”, afirma logo no primeiro parágrafo o documento, assinado pelo presidente da ANAMMA, Rogério Menezes, secretário municipal do Meio Ambiente, do Verde e do Desenvolvimento Sustentável de Campinas.

A nota da ANAMMA também bserva que o Projeto de Lei Substitutivo, assim como o original PL 3729/2004, de autoria do deputado Ricardo Trípoli, “visa compilar outros PLs de mesma natureza e disciplinar sobre o licenciamento ambiental em nível nacional, abarcando o modus operandi de todos entes federativos (nacional, estadual, distrital e municipal)”.

O substitutivo, especificamente, informa a ANAMMA, “é fruto de um trabalho da Comissão de Tributação e Finanças e não dialoga com outras comissões e muito menos com a sociedade. Note-se que sequer foi aberto algum canal hábil a oitiva da sociedade quanto ao conteúdo do referido documento”, protesta a organização.

“Ocorre que o citado documento normativo enseja revisão no interesse não somente nacional, mas também local. Seu conteúdo abarca uma federalização do licenciamento ambiental em que se quer resolver problemas de grandes empreendimentos, deixando outros entes federativos à margem da discussão e amordaçados por regras federais, especialmente os Municípios”, adverte a ANAMMA.

Ao contrário do que prevê o substitutivo, a ANAMMA reitera a defesa do papel dos municípios no licenciamento ambiental. Afirma o documento: “Esse é um dos mais críticos pontos do Projeto de Lei Substitutivo, eis que a retirada dos documentos basilares como certidão de conformidade com o plano diretor e lei de uso e ocupação solo, bem como exame técnico municipal acarretará não somente um transtorno aos empreendedores, como também para o órgão licenciador, uma vez que não analisa em sede do impacto ambiental de sua competência (nacional, regional ou estadual) questões peculiares de ordem local, sejam urbanísticas, sejam, ambientais.

“Além disso, corre-se o risco de proceder ao licenciamento ambiental antes de tomar conhecimento se a atividade ou empreendimento podem se dar naquele local, acarretando em desperdício de tempo e recursos financeiros, caso a inviabilidade (ou não conformidade com a legislação local) só venha a ser identificada em um momento posterior.

“De fato, o conhecimento das condicionantes e restrições do Plano Diretor do Município se dá pela razão de que o referido documento abarca as diretrizes tanto da área urbana quanto rural, nos termos do Estatuto da Cidade (Lei Federal nº 10.257/01), sendo que o referido documento é detalhado por outras legislações de cunho urbanístico, como a lei de uso e ocupação do solo, parcelamento do solo, código de obras, tombamentos ou outras áreas com regramento de ocupação, que podem interferir na decisão de emissão da primeira licença ambiental a ser concedida, especialmente no que toca ao fator localização do empreendimento (zoneamento, diretrizes viárias, equipamentos urbanos, entre outros).

“Ademais, caso se mantenha a visão de total exclusão dos Municípios, os órgãos licenciadores apenas analisarão os impactos quanto as obras/atividades, não se atentando sequer para as condições de infraestrutura já existentes do local.

“O exame técnico municipal, de caráter ambiental, dá-se pelo fato de que o documento veicula a política, normas e estudos ambientais locais, o que possibilita que o órgão licenciador e o empreendedor de antemão já conheça as políticas restrições de caráter ambiental constante da legislação municipal, trazendo maior segurança ao processo de licenciamento de impacto nacional, regional ou estadual.

“Ademais, a atual legislação já prevê a exigência do Exame Técnico Municipal, conforme preconiza a Resolução Conama 237/97, arts. 4º, §1º e 5º, parágrafo único, Resolução Conama 01/86, arts. 5º, parágrafo único e 6º, parágrafo único, e Lei Complementar 140/11, art, 13, §1º.

“De qualquer forma, ambos os documentos municipais informam ao outro ente federativo as peculiaridades locais, em igual consonância com a Lei Complementar 140/11, art. 3º, IV, em que se pretende garantir a uniformidade da política ambiental para todo o País, respeitadas as peculiaridades regionais e locais.

“Por fim, é importante aduzir que o exame técnico municipal consiste numa excelente e singular oportunidade para o Município elencar suas condicionantes, restrições e dialogar com a sociedade (comumente representada pelos Conselhos Municipais de Meio Ambiente) sobre os aspectos e impactos ambientais da obra, empreendimento ou atividade que ocorrerão nos seus limites territoriais”, completa a ANAMMA, sobre a questão específica da participação dos municípios no licenciamento ambiental.

Depois de citar vários outros argumentos, a ANAMMA expressa finalmente “a sua preocupação com a aprovação do Projeto de Lei Substitutivo, que demanda debate técnico qualificado do ponto de vista científico, institucional e, especialmente junto a sociedade civil como forma de assegurar, inclusive, o aperfeiçoamento da legislação ambiental brasileira e de nossa democracia”.

 

 

Sobre ASN

Organização sediada em Campinas (SP) de notícias, interpretação e reflexão sobre temas contemporâneos, com foco na defesa dos direitos de cidadania e valorização da qualidade de vida.

Um comentário

  1. Le concessionnaire du barrage à une part de responsabilité ! mais l’état est responsable aussi , car il doit exiger des contrôles par des services compétant. Donc l’état dans cette affaire fait part d’une grande incompétence de gestion du patrimoine qui lui est confier.

    Imaginer le pire ! quand l’état Brésilien décidera d’investir dans l’énergie nucléaire ….ce sera la fin des haricots

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