Um grande acordo global, para reduzir as emissões de gases que agravam o efeito-estufa, é o que se espera da realização no final do ano, em Paris, da Conferência das Partes da Convenção das Mudanças Climáticas (COP-21). Desde a assinatura da Convenção, em 1992, é o vigésimo terceiro ano seguido de negociações, que até o momento não foram positivas no sentido de evitar que o clima do planeta não aumente mais do que 2 graus centígrados em média até o final do século 21. Evitar que aconteça um novo fracasso na capital francesa é o propósito de uma série de ações que a sociedade civil internacional está preparando. Um fracasso em Paris será fatal para o futuro do planeta, que já convive com os impactos das mudanças climáticas, como a forte seca no Sudeste e Semi-Árido brasileiros.
São várias frentes abertas para a sociedade civil global incidir na COP-21. Uma delas é a da Coalition Climat 21, uma aliança de mais de 100 organizações de vários países, entre ambientalistas, sindicatos, movimentos sociais e outros campos de atuação. Foram criados vários grupos de trabalho para preparar o calendário de ações, antes, durante e depois da COP-21.
Nos dias 28 e 29 de novembro, manifestações serão promovidas nas ruas de Paris e de várias cidades ao retor do planeta, nas vésperas da COP-21. Será uma preparação para os eventos a seguir.
Entre 7 e 11 de dezembro, durante a Conferência, uma série de atividades será implementada na chamada Zona de Ação para o Clima (ZAC), no “104” (rua Curial, 5), instalação antigamente destinada a pompas fúnebres em Paris e agora transformada em centro cultural e artístico. Os organizadores esperam que seja um local “transbordante de vida, de propostas criativas e de alegre resistência”. Performances, exposições e exibição de filmes, além da informação on-line do que está acontecendo na Conferência oficial e de debates e palestras.
O momento culminante da mobilização será a grande manifestação de 12 de dezembro, com ações em todo mundo, e sobretudo Paris, pela justiça climática global. Essa manifestação, depois de concluída (se não houver prorrogação no calendário, como aliás tem acontecido) a Conferência oficial, será chamada de “A última palavra”.
Os organizadores esperam repetir o sucesso das mobilizações de setembro de 2014, antes da conferência de chefes de Estado na ONU sobre o clima. Mais de 400 mil pessoas foram às ruas em Nova York e mais de 2 mil atividades foram promovidas em dezenas de países, para chamar a atenção dos governantes sobre como os povos estão preocupados com o rumo incerto e errático das negociações sobre as mudanças climáticas.
Novo fracasso? – Um dos principais pontos da COP-21 será a aprovação de um mecanismo que substituta o Protocolo de Kyoto, de 1997. Válido inicialmente até 2012, Kyoto foi prorrogado para 2020. A partir daí, valerá o acordo que for firmado em Paris. Pelos termos de Kyoto, foram obtidas reduções de emissões de gases-estufa insuficientes diante das demandas globais. Os números mostram que, na prática, as emissões de gases de efeito-estufa continuaram aumentando em todo mundo, no âmbito de uma escalada geral de degradação ambiental.
Entre 1992 e 2012, anos respectivamente da Eco-92 e a Rio+20, ambas no Rio de Janeiro, as emissões mundiais de dióxido de carbono (CO2) aumentaram 66%, em sua maior parte, segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), pelo crescimento da produção industrial e mudança dos estilos de vida das populações.
Com maiores emissões, aumentou a concentração atmosférica de CO2, de cerca de 340 partes por milhão em 1990 para 388,5 ppm em 2010 e, atualmente, em mais de 400 ppm, um patamar considerado crítico pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC). Também aumentaram as concentrações de outros gases-estufa poderosos, como o metano (CH4) de 1.774,5 ppb em 2005 para 1.799,1 em 2010. Maior concentração atmosférica, maiores temperaturas. A Organização Meteorológica Mundial confirmou que 2014 foi o ano mais quente da história. 2015 pode bater esse recorde. Claros sinais de que as negociações ocorridas até o momento foram infrutíferas.
Megacidades – Na prática, Kyoto mostrou que não foi eficaz para reduzir as emissões de poluentes, embora muitos digam que, sem o Protocolo, a situação seria ainda pior. Ocorre que o mundo tem passado por mudanças muito rápidas e profundas, e Paris terá que aprovar algo que efetivamente faça frente aos desafios suscitados por essas transformações.
Desde 1992, ano em que foi firmada a Convenção das Mudanças Climáticas no Rio de Janeiro, o número de megacidades (com mais de 10 milhões de habitantes) cresceu 110%, de 10 para mais de 20. A maior parte da população mundial já vive em cidades, o que representou a mudança drástica de estilos de vida, com maior uso de energia, por exemplo. Desde 1992 a população mundial cresceu mais de 1,5 bilhão de pessoas. Hoje o cidadão médio consume 43 quilos de carne por ano, contra 34 quilos em 1992, ainda segundo o PNUMA.
Desde o início da década de 1990, a área de florestas diminuiu 300 milhões de hectares, com grande impacto na erosão da biodiversidade e, também, na perda de “sumidouros” naturais de carbono. Maior acidificação de oceanos, derretimento de geleiras, mais furacões em alguns lugares, mais seca em outros – como a forte estiagem que atingiu o estado de São Paulo em 2014 e tende a se repetir em 2015.
Corte nos subsídios – Está claro que o panorama ambiental global é cada vez pior, indicando que as negociações climáticas não foram suficientes até o momento. Serão agora, em que todos países – conforme a decisão da COP-20, no Peru, no final de 2014 – estão comprometidos com a redução das emissões, mas sem metas especificadas e medidas vinculantes para os maiores emissores? O princípio das “responsabilidades comuns, mas diferenciadas” permaneceu no papel após a COP-20 em Lima, mas na prática o compromisso de que todos devem contribuir para o corte de emissões, mas sem metas fixas e vinculantes, pode representar a sua extinção na prática no âmbito das negociações climáticas.
Paris será de fato um fracasso, especialmente se não houver uma clara sinalização de corte nos subsídios ao uso de combustíveis fósseis. Por causa destes subsídios o uso de petróleo, gás e carvão continuou a todo vapor, repercutindo nas emissões globais de dióxido de carbono e gases equivalentes, mesmo com todo avanço já alcançado pela energia renovável. (Por José Pedro Martins)
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