A presidente reeleita Dilma Rousseff acenou nesta noite, em Brasília, com a reforma política como uma de suas primeiras prioridades. Com o capital político alcançado na reeleição, a presidente deverá apresentar propostas de reformas logo no inicio do seu segundo mandato, sob pena de não conseguir ver executadas muitas medidas que anunciou na campanha eleitoral. A diminuição das bancadas do PT e trabalhista e a eleição de expressivas bancadas evangélica, empresarial, ruralista e de parentes, configurando um Congresso classificado de mais conservador por analistas, projetam quatro anos de delicadas negociações, apesar da reeleição.
Com 70 deputados a bancada do PT continua sendo a maior na Câmara, mas com 18 parlamentares a menos do que atualmente. O PMDB, do vice-presidente Michel Temer, também encolheu, dos atuais 72 para 65 deputados. O PSD, também aliado do governo, viu igualmente a redução de sua bancada, de 45 para 37 deputados, e com isso deixou de ser a terceira maior na Câmara, lugar que passa a ser ocupado pelo PSDB, que elegeu 53 deputados, contra os atuais 44.
Os partidos que integram a coligação (PT / PMDB / PSD / PP / PR / PROS / PDT / PCdoB / PRB) que reelegeu a presidente Dilma terão 300 deputados, o que indicaria uma certa folga na Câmara, mas acontece que sempre há dissidências e realinhamentos de acordo com a matéria apreciada e votada. Muitas vezes predominam os blocos de interesse, acima das cores partidárias, e nesse aspecto o novo Congresso, começando pela Câmara, é teoricamente mais conservador.
A bancada trabalhista diminuiu de 83 para 46 deputados e será quatro vezes menor do que a bancada empresarial, que elegeu pelo menos 190 deputados, nas estimativas do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP). Também nas projeções do DIAP, a bancada evangélica elegeu ao menos 74 deputados (com tendência de crescimento), quatro a menos do que os atuais 78. A bancada ruralista elegeu pelo menos 139, no levantamento preliminar do DIAP. A bancada de parentes elegeu pelo menos 83 deputados, contra 78 deputados e deputadas com vínculos familiares eleitos em 2010.
A coligação que apoiou a candidatura do senador Aécio Neves (PSDB / PMN / SD / DEM / PEN / PTN / PTB / PTC / PTdoB) elegeu 126 deputados. Já a coligação que apoiou a candidatura de Marina Silva (PHS / PRP / PPS / PPL / PSB / PSL) elegeu 51 deputados.
Deve haver, por exemplo, um forte embate em torno de leis trabalhistas. Para o analista político Antônio Augusto de Queiroz, diretor de Documentação do DIAP, a redução da bancada sindical é extremamente preocupante do ponto de vista dos trabalhadores. Ele teme uma investida, por parte de setores empresariais, visando o abrandamento das leis trabalhistas, e em especial em termos da regulamentação da terceirização.
“Uma bancada sindical menor vai reduzir o poder de enfrentamento com a agenda empresarial”, afirma Queiroz. Ele observa que na própria campanha presidencial a temática dos direitos trabalhistas não foi tratada de forma adequada pelos candidatos. O assunto apenas ganhou força, nota, quando foi divulgado o “contraditório programa de governo na área do trabalho” da candidata Marina Silva (PSB). “Essa divulgação forçou os outros candidatos a se posicionarem”, lembra.
Reformas política e tributária – As reformas política e tributária devem gerar polêmica. O analista político Antônio Augusto de Queiroz, diretor de Documentação do DIAP, entende que uma ampla reforma política, incluindo uma Constituinte exclusiva, não deverá interessar, por exemplo, aos novos partidos com representação no Congresso Nacional. Atualmente o Congresso tem 22, mas a nova legislatura terá 28 partidos representados, com a inclusão de PSD (Partido Social Democrático, de Gilberto Kassab), SD (Solidariedade, de Paulinho da Força), Pros (Partido Republicano da Ordem Social, dos irmãos Ciro e Cid Gomes), PSDC (Partido Social Democrata Cristão), PEN (Partido Ecológico Nacional) e PTN (Partido Trabalhista Nacional).
“Para os novos partidos uma reforma que mudasse as atuais regras do jogo não interessaria”, diz o analista do DIAP. Para ele, uma reforma com Constituinte exclusiva apenas teria chance de ser implementada com três condições: 1. Se houver “o empenho do Executivo”, o que deve ser difícil, porque qualquer presidente eleito terá maiores dificuldades em negociar com o Congresso. 2. Se houver “uma forte pressão popular sobre os parlamentares”. 3 Se as novas regras forem “generosas”, não sendo aplicadas na eleição subsequente. E mudanças no texto constitucional, nota Antônio Augusto de Queiroz, dependem de 308 votos na Câmara, “o que nunca é uma tarefa fácil”.
Para o filósofo Roberto Romano, professor da Unicamp, a reforma política terá muitas dificuldades de ser implementada. “Na nossa história política, quando não se quer mudar nada, se fala daquilo o tempo todo. E está se falando muito em reforma política”, destaca. Uma verdadeira reforma, salienta Romano, deveria começar “por uma completa mudança na atual estrutura partidária, e os partidos brasileiros são tudo, menos democráticos”.