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EC do Teto achatou investimentos públicos na educação (Dia 57, Art.26)
Um país desenhado pelas crianças, um urgente projeto (Foto José Pedro Martins)

EC do Teto achatou investimentos públicos na educação (Dia 57, Art.26)

POR JOSÉ PEDRO SOARES MARTINS

A Emenda Constitucional 95/2016, que institui Novo Regime Fiscal e ficou conhecida como PEC do Teto, foi promulgada no dia 15 de dezembro de 2016. A emenda estabeleceu um teto para os gastos públicos da União pelos próximos 20 anos, o que gerou e continua gerando muitas críticas nas áreas de educação, saúde e ação social.

Um incisivo alerta sobre as consequências legais da Proposta de Emenda Constitucional-PEC 241 (que antecedeu a EC 95) foi dado por Paulo Sena, assessor Parlamentar da Câmara dos Deputados e considerado um dos maiores especialistas em Direito e financiamento educacional no país. Em estudo sobre o tema, Sena observou que a PEC 241 visava alterar o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), de modo a instituir o chamado “novo regime fiscal”.

Sena citava então o artigo 104 da PEC 241, que estipula: “A partir do exercício financeiro de 2017, as aplicações mínimas de recursos a que se referem o inciso I do parágrafo 2º e o parágrafo 3º do art.198 e o caput do art.212, ambos da Constituição, corresponderão, em cada exercício financeiro, às aplicações mínimas referentes ao exercício anterior corrigidas na forma estabelecida pelo inciso II do parágrafo 3º e do parágrafo 5º do art.102 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias”.

Para o especialista, ao propor a mudança do ADCT e fixar nova norma (aplicação do ano anterior corrigida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA) de cálculo dos mínimos constitucionais de Educação e Saúde, o governo federal “não apenas muda a regra, mas atinge e fere princípio sensível, e assim viola cláusula pétrea” da Constituição brasileira, que acaba de completar 28 anos.

É a Constituição Federal, comentou Paulo Sena, que prevê que a vinculação de recursos da receita de impostos à manutenção e desenvolvimento do ensino, estabelecida no citado artigo 212, “não é apenas uma regra de locação, mas é, também e principalmente, um princípio constitucional. Um princípio constitucional sensível, na expressão de Pontes de Miranda”, diz Sena, se referindo a um dos grandes juristas brasileiros.

“Uma vez desrespeitado este princípio”, continuava o assessor legislativo, “ocorre a mais grave sanção no Direito Constitucional: a decretação de intervenção federal. Se a própria Federação, como forma de Estado, é objeto (art.60, parágrafo 4º, I) de cláusula pétrea, sanção da gravidade da intervenção federal não pode ter outra natureza”.

Sena completou: “A constatação de que a vinculação é um princípio constitucional, que enseja a intervenção federal (art.34, VII, “e”, CF), sob a qual sequer pode ser apreciada qualquer emenda constitucional (art.60, parágrafo 1º, CF) leva à conclusão inescapável de que se trata de cláusula pétrea. Cláusula pétrea violada pela PEC 241, de 2016″.

Impactos no orçamento –  Um estudo do consultor de Orçamento e Fiscalização Financeira Marcos Rogério Rocha Mendlovitz para a Câmara dos Deputados apontou uma perda de R$ 58 bilhões em recursos, resultantes da aplicação da PEC 241/2016 no âmbito da Manutenção e Desenvolvimento do Ensino (MDE). Segundo a projeção do consultor, as despesas federais com MDE, abrangendo pontos como transporte escolar, compra de material didático e pagamento dos salários dos profissionais de Educação, seriam reduzidos anualmente abaixo dos 18% da receita líquida dos impostos. Este é o percentual mínimo que a Constituição prevê para gastos do governo federal em Educação, com a receita líquida de impostos.

Reação da sociedade – Diante dos apontados impactos na ordem constitucional e nos recursos para o setor nos próximos anos, afetando diretamente a implementação do PNE 2014-2014, organizações da área educacional se mobilizaram.

No dia 18 de setembro de 2016, o presidente da Comissão de Educação da ONU, Gordon Brown, recebeu em Nova York um dossiê elaborado pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação (CNDE), com estudos e críticas sobre a PEC 241/2016 e seus efeitos na Educação no Brasil. No dossiê, a CNDE defendia que a PEC 241, assim como outras iniciativas do governo Temer no setor, “colocam em risco a garantia do direito à educação no Brasil”. A Campanha Nacional pelo Direito à Educação considera que a PEC 241 vai na direção contrária às recomendações dos Comitê sobre os Direitos da Criança das Nações Unidas.

Outras importantes organizações se manifestaram. “A Proposta de Emenda Constitucional nº 241/2016, que propõe o Novo Regime Fiscal (NRF), e seu Substitutivo, se aprovado nos termos em que está proposto, resultará em prejuízos irreparáveis às políticas sociais que garantem os direitos de crianças e adolescentes no Brasil”, defendeu em comunicado a Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do Adolescente, uma das mais respeitadas instituições da áreas social.

Para a Fundação Abrinq, a PEC nº 241/2016, e seu Substitutivo, “não incluem na Exposição de Motivos, no Parecer do Relator e no rol de indicadores a serem monitorados para medir o desempenho do Novo Regime Fiscal os indicadores sociais que serão impactados pela medida. A Fundação Abrinq acredita que o monitoramento dos impactos sociais – positivos e negativos – de quaisquer medidas de governo devem estar contemplados para uma efetiva avaliação de políticas públicas”, observou a instituição.

Para a Fundação Abrinq, ao não detalhar quais políticas são prioridade de governo e, consequentemente, de investimentos, “todas essas políticas e programas estão em risco de serem reduzidas a ponto de perderem a sua efetividade, ou descontinuadas, caso o texto da PEC nº 241/2016 permaneça como está – independente de uma análise mais aprofundada – e seja aprovado. Inclui-se no rol de efeitos danosos da PEC nº 241/2016 os impactos que a imposição de um limite de gastos para o Poder Judiciário terá sobre a operação – já deficiente – do Sistema de Garantia de Direitos de Crianças e Adolescentes”.

Impactos no PNE – A Fundação Abrinq avaliou os impactos da PEC 241 no Plano Nacional de Educação – PNE (Lei nº 13.005/2014), que estabelece 20 metas que devem ser alcançadas nos próximos dez anos para melhoria da qualidade da educação no Brasil, como: a erradicação do analfabetismo; o aumento do número de vagas em creches e a equiparação do rendimento médio dos profissionais do magistério da rede pública com o dos demais profissionais com escolaridade equivalente são metas que constam na citada lei.

O Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS), a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME) e o Colegiado Nacional de Gestores Municipais de Assistência Social (CONGEMAS) também se manifestaram, em nota conjunta, sobre os efeitos perversos da PEC 241/2016 na Educação, Saúde e outras áreas sociais a partir de 2017.

As organizações alertavam que o país passa por um rápido processo de mudança na estrutura demográfica, em decorrência do aumento da expectativa de vida e da queda da taxa de natalidade. “Em 2036, projeta-se uma população de 227 milhões de habitantes, 9,3% superior à população atual. No que se refere à estrutura etária, os resultados mostram que a população com 60 anos ou mais representará praticamente o dobro da atual, passando de 24,9 milhões para 48,9 milhões, o que pressionará o gasto público tanto para saúde, quanto para educação e assistência social”, afiram as entidades, entendendo que a PEC 241 afetaria os gastos nessas áreas.

“No caso da saúde as medidas propostas, uma vez implementadas, irão agravar ainda mais o quadro de asfixia financeira que atualmente o Sistema Único de Saúde (SUS) atravessa. Os aumentos do desinvestimento, do desemprego e da queda da renda da população forçam, naturalmente, a busca da população pelos serviços e ações de saúde no SUS. Para a educação, a PEC 241/2016 inviabilizará o cumprimento das metas e estratégias do Plano Nacional de Educação”, afirmam CONASEMS, UNDIME e CONGEMAS, no comunicado que resume o espírito de grande parte da sociedade civil brasileira em relação à PEC 241/2016, que coloca em dúvida o futuro do país em áreas estratégicas e essenciais.

(57º artigo da série DDHH Já, sobre os 30 artigos da Declaração Universal dos Direitos Humanos no cenário brasileiro. No 26º dia do mês de fevereiro 2019, o artigo corresponde ao Artigo 26: Todo ser humano tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior, esta baseada no mérito. A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos do ser humano e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz. Os pais têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus filhos.)

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