A Câmara Federal rejeitou na tarde e noite desta terça-feira, 10 de fevereiro, várias emendas que beneficiariam comunidades indígenas e de agricultores, no escopo da nova Lei da Biodiversidade. Nesta segunda-feira, à noite, a Câmara aprovou o substitutivo do deputado Alceu Moreira (PMDB-RS) para o Projeto de Lei 7735/14, que simplifica as regras para pesquisa e exploração do patrimônio genético de plantas e animais nativos e para o uso dos conhecimentos indígenas ou tradicionais sobre eles.
O plenário da Câmara rejeitou, por exemplo, emenda do PT, que visava excluir do texto do projeto de lei da biodiversidade (PL 7735/14, do Executivo) a referência à Lei de Cultivares (9.456/97) na garantia de venda de produtos que contenham patrimônio genético. De acordo com o deputado Alessandro Molon (PT-RJ), a medida garantiria o direito de populações indígenas e comunidades tradicionais a “usar ou vender livremente” seus produtos.
Já o relator do projeto, deputado Alceu Moreira (PMDB-RS), disse que o fim da remissão à Lei de Proteção dos Cultivares seria um risco enorme para o futuro. “A legislação tem de reportar aos cultivares para não perdermos anos de pesquisa”, disse Moreira.
Do mesmo modo, o plenário rejeitou a emenda do deputado Zé Silva (SD-MG) ao PL 7735/14, que pretendia incluir o agricultor familiar no conceito de agricultor tradicional, o que permitiria elegê-lo para recebimento de benefícios caso seu conhecimento tradicional fosse usado.
“Como vamos deixar fora o agricultor familiar na denominação? Esse agricultor familiar não exclui os demais”, perguntou o deputado Bohn Gass (PT-RS), que defendia a emenda. Já o relator Alceu Moreira afirmou que a redação proposta limitaria a concepção do termo. “Forçar para colocar a agricultura familiar seria particularizar apenas um setor. O conhecimento tradicional não tem relação com o tamanho da propriedade”, disse Moreira.
Outro destaque rejeitado pelo plenário da Câmara dos Deputados, do PCdoB, impedia que a pessoa jurídica sediada no exterior e não associada a instituição nacional de pesquisa científica e tecnológica, pública ou privada, pudesse acessar patrimônio genético ou conhecimento tradicional associado, assim como a remessa de material ao exterior.
A deputada Luciana Santos (PCdoB-PE) disse que a mudança no projeto de lei da biodiversidade (PL 7735/14) garantiria a defesa da soberania nacional e o avanço do conhecimento tecnológico brasileiro. Já o deputado Valdir Colatto (PMDB-SC) afirmou que os acordos na área de tecnologia assinados pelo Brasil impedem uma mudança no texto. “Precisamos manter os convênios internacionais. O Ministério da Agricultura vai regular essa questão.”
Foi igualmente rejeitada a emenda do deputado Sarney Filho (PV-MA) ao projeto de lei da biodiversidade (PL 7735/14, do Executivo) que pedia a substituição da expressão “população indígena” por “povo indígena” no texto, retornando ao termo usado no texto original do governo, que segue a denominação da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
A inclusão da pesquisa agropecuária, com sementes e melhoramento de raças, na discussão do marco regulatório da biodiversidade é a maior diferença do relatório do deputado Alceu Moreira (PMDB-RS), aprovado ontem, em relação ao texto original do Executivo (Projeto de Lei 7735/14). Com a inclusão da agricultura e da pecuária, segundo a Agência Câmara, Moreira colocou no texto uma das maiores reivindicações da Frente Parlamentar da Agropecuária: a isenção de royalties para pesquisa e desenvolvimento com soja, arroz, cana e outras commodities.
A matéria colocou novamente em disputa o agronegócio, de um lado, e grupos ambientalistas, cientistas e comunidades tradicionais, de outro, como já havia acontecido na controvérsia sobre o novo Código Florestal. Entretanto, apesar do que está em jogo, em uma matéria que envolve poderosos interesses econômicos e políticos, desta vez a polêmica não alcançou a mesma repercussão na mídia e na sociedade em geral. O Projeto de Lei 7735/14 do Poder Executivo trancou a pauta da Câmara em 2014 desde o dia 11 de agosto, o que indica a atenção com que a matéria foi tratada no Parlamento brasileiro. O valor da biodiversidade brasileira já foi estimado em mais de R$ 4 trilhões e ela tem sido alvo histórico de biopirataria.