Bordeaux, Dijon e Saint-Denis, na França. Uppsala, na Suécia. Münster, na Alemanha. Oslo, na Noruega, e Melbourne, na Austrália. O que estas grandes cidades têm em comum é que já anunciaram o desinvestimento em combustíveis fósseis, os maiores responsáveis pela emissão de gases que agravam as mudanças climáticas. O desinvestimento em fósseis é o mote de uma campanha mundial da organização 350.org, que já tem a adesão de 500 instituições cujos ativos, somados, representam US$ 3,4 trilhões. É assim, à margem das negociações oficiais da COP-21, a Conferência do Clima, em Paris, que avança o movimento pela descarbonização da economia, já contando com o apoio de renomadas instituições acadêmicas, como a London School of Economics e outras universidades britânicas.
Quem vai pagar a conta pela redução das emissões de dióxido de carbono (CO2) e outros gases-estufa? Esta é, no fundo, a grande pergunta que movimenta as negociações voltadas para o acordo de Paris, esperado como o grande resultado do evento na capital francesa. O acordo, que vai substituir o Protocolo de Kyoto, de 1997, e que vigorou até 2012, representará o compromisso da comunidade internacional pela redução das emissões de gases-estufa a partir de 2020, de modo que o aumento da temperatura média global não seja maior do que 2 graus celsius até o final do século 21.
Entre os pontos em discussão em Paris estão a transferência de tecnologia e o financiamento para a descarbonização da economia. Pelo princípio das “responsabilidades comuns, mas diferenciadas”, os maiores responsáveis historicamente pelas emissões, Estados Unidos e União Europeia à frente, deveriam ser os grandes financiadores das medidas pela descarbonização da economia. Entretanto, os países industrializados, e principalmente os EUA, vêm resistindo à ideia de “pagar a conta” sozinhos, e estão defendendo há tempos, e também na COP-21, que os países em desenvolvimento também devem dar sua cota de contribuição. Por isso o princípio das “responsabilidades comuns, mas diferenciadas” vem sendo muito questionado pelas grandes potências.
Sociedade civil – Este é o roteiro das negociações oficiais. Na sociedade civil e em muitas áreas da economia, entretanto, vem crescendo com força o movimento pela descarbonização da economia, o que implica em maiores investimentos nas energias renováveis e de fato limpas, como eólica e solar, e incentivo ao corte de investimentos e subsídios aos combustíveis fósseis.
Dias antes da COP-21 foi divulgado o documento “Empty promises: G20 subsidies to oil, gás and coal production” (“Promessas vazias: o subsídios do G20 para a produção de petróleo, gás e carvão”), elaborado pelo Overseas Development Institute, de Londres, e o Oil Change International, de Washington, revelando que o G20 – que reúne as 20 maiores economias do mundo – é responsável pela destinação de US$ 452 bilhões anuais em subsídios para os combustíveis fósseis. Reduzir drasticamente esses subsídios, para as duas organizações, é um grande passo para a redução das emissões de gases que contribuem para as mudanças climáticas.
O documento foi obviamente produzido para influenciar nos rumos da Conferência do Clima em Paris, mas foi divulgado antes, por ocasião do encontro do G20 na Turquia. Isto porque a questão dos subsídios aos fósseis seria um dos pontos de discussão no G20, antes do encontro de Paris. Na prática o encontro do G20 se transformou em um grande fórum de repúdio ao terrorismo, em função dos atentados de 13 de novembro na capital francesa.
Ainda há dúvidas se o acordo de Paris vai ser enfático em relação a cortes de subsídios aos fósseis. Enquanto esse grande passo pela descarbonização da economia não acontece, são intensificadas as ações no âmbito da sociedade civil e em algumas áreas dos grandes negócios. A principal iniciativa nessa linha é o movimento pelo desinvestimento nos fósseis, coordenado pela organização 350.org.
Quando a ação foi lançada, em setembro de 2014, 181 instituições, representando US$ 50 bilhões em ativos, firmaram o seu compromisso em reduzir ou eliminar investimentos em combustíveis fósseis. O movimento foi crescente e em 21 de setembro de 2015, por ocasião da Semana do Clima, realizada em função da reunião dos chefes de Estado e governo na ONU, em Nova York, já eram 400 instituições, representando US$ 2,6 trilhões em ativos.
Nesta quarta-feira, dia 2 de dezembro, a organização 350.org anunciou em evento paralelo à COP-21 oficial que já são 500 instituições signatárias do compromisso, somando US$ 3,4 trilhões em ativos. A própria 350.org observa que esse é o total dos ativos das instituições que apoiam a causa, não significando que esse será o total de recursos que deixará de ser investido em fósseis. Mas a organização nota que, efetivamente, grandes investidores, além de cidades e instituições como universidades, têm anunciado cortes importantes em investimentos em fósseis, redirecionando os recursos para energias renováveis.
É o caso da Allianz, maior seguradora da Europa, que anunciou o desinvestimento de 630 milhões de euros em carvão e, por outro lado, vai investir 4 bilhões de euros em energia eólica nos próximos seis meses. Do mesmo modo, a APRA AMCOS, maior organização da indústria da música no hemisfério sul, anunciou a deflagração do processo de desinvestimento em combustíveis fósseis. Instituições como o Museu de Ciência de Londres, Igrejas protestantes da Alemanha e várias universidades britânicas (como Oxford Brookes University, University of the Arts London, University of Surrey, University of Sheffield, Wolfson College, Birmingham City University, University Cranfiled, Heriot-Watt University, University of Hertfordshire, University of Portsmouth e University of Westminster) também anunciaram desinvestimento em fósseis.
Além das citadas cidades de várias partes do mundo, outras esferas públicas estão caminhando no mesmo sentido. No dia 25 de novembro, cinco dias portanto antes do início da COP-21, o próprio Parlamento Francês (Assembleia Nacional) aprovou resolução voltada a incentivar o desinvestimento em fósseis, como primeiro passo para a elaboração de legislação a respeito.
Por ocasião da COP-21, outros gestos foram divulgados na mesma trilha da descarbonização da economia. um dos destaques nessa linha foi o lançamento da Aliança Internacional pela Energia Solar, anunciada pela Índia e França no dia 30 de novembro, na abertura da Conferência do Clima.
São vários movimentos apontando para a descarbonização da economia, ainda que as complexas negociações diplomáticas não avancem tão rapidamente. Este talvez seja o grande alento em relação à COP-21. (Por José Pedro Martins)