Diante de um público formado essencialmente por jovens, na Câmara Municipal de Campinas, o filósofo Roberto Romano, professor durante muitos anos de Filosofia e Ética na Unicamp, disse na tarde deste dia 9 de dezembro lamentar profundamente “ter visto polícia bater em criança”, por ocasião da ocupação de escolas por estudantes, como protesto pelo projeto de reorganização escolar do governo estadual. A suspensão do projeto foi anunciada pelo governador Geraldo Alckmin. Romano participou de evento relacionado ao Dia Municipal de Combate à Corrupção, que é lembrado justamente a 9 de dezembro.
Para o filósofo, a repressão policial contra estudantes, nesse episódio da ocupação das escolas, deriva da “herança autoritária do Estado brasileiro”. “No lugar de tentar dialogar com os pais dos alunos e os próprios alunos, jogou-se a polícia contra eles, e um dos resultados foi a importante queda de popularidade do governo estadual”, observou Romano, para quem o projeto de reorganização das escolas repetiu um perfil tecnocrático presente em ações do Estado no Brasil.
A gênese desse autoritarismo, assinalou o professor da Unicamp, está na formação colonial brasileira, “toda durante o período do Estado absolutista, que foi um dos mais corruptos e autoritários da história”. A origem dessa visão autoritária de Estado, relembrou, está na decadência das cidades-estado da Grécia, berço da democracia como é conhecida hoje, e na ocupação do território grego por Roma.
Depois de vigorar durante séculos, o autoritarismo foi questionado por quatro grandes revoluções, recordou Romano: a reforma protestante liderada por Martim Lutero as revoluções Inglesa, Americana e Francesa. O Brasil, pelo contrário, em função da presença da corte portuguesa desde 1808, reforçou a estrutura autoritária do Estado. “No século 19, tivemos revoluções libertárias em vários estados brasileiros, mas foram todas massacradas”, observou.
A própria República, proclamada em 1889, herdou traços autoritários, destacou o filósofo, acrescentando que, no século 20, foram poucos os períodos de ensaio democrático. “Tivemos duas ditaduras que duraram anos”, lembrou, referindo-se ao primeiro governo de Getúlio Vargas (1930-1945) e à ditadura militar (1964-1984).
E a estrutura autoritária permanece no Brasil contemporâneo, protestou. “A grande parte dos impostos arrecadados pelos municípios vai para o governo central e as autoridades ainda se colocam acima do povo, que é a origem do governo em um regime democrático”, assinalou.
Esse formato apenas será alterado, na sua opinião, começando com a democratização da estrutura dos partidos políticos. “Os partidos têm uma estrutura envelhecida, com direção gerontocrática, que não abre espaço para os jovens, para a renovação”, protestou.
Na sua opinião, os movimentos de junho de 2013 e, recentemente, de ocupação de escolas de São Paulo por jovens são respostas a esse panorama. “Diante de uma grande crise, os jovens foram para as ruas”, sintetizou Romano, que também lamentou o que denominou “aparelhamento do movimento estudantil por partidos políticos”.
Roberto Romano falou sobre “O pressuposto autoritário da corrupção”, a convite do vereador Luiz Caros Rossini, autor da lei criando o Dia Municipal de Combate à Corrupção. “O combate à corrupção deve ser permanente, inclusive nos gestos diários do cidadão, mas é importante ter um dia para uma reflexão maior sobre o que é a corrupção e a urgência de combatê-la”, esclareceu. (Por José Pedro Martins)