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Aos 70 anos, Declaração Universal dos Direitos Humanos é desrespeitada todos os dias no Brasil
Violência no meio rural agride direitos humanos no Brasil (Foto Adriano Rosa)

Aos 70 anos, Declaração Universal dos Direitos Humanos é desrespeitada todos os dias no Brasil

Por José Pedro Soares Martins

Campinas, 20 de julho de 2018

A expressão “direitos humanos” tem um significado negativo para boa parte da sociedade brasileira, que a interpreta como “defesa de direitos de bandidos”. São várias as razões pelas quais essa parcela da população desconsidera a origem, o sentido e o processo histórico relacionado à luta pelos direitos humanos desde a Revolução Francesa, que levou à publicação, em 1789, da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.

Elemento particularmente preocupante é a perseguição aos defensores dos direitos humanos no Brasil, como têm alertado, de forma recorrente, organizações como a Anistia Internacional. O cenário de violência contra os ativistas pelos direitos humanos foi mais uma vez denunciado pela organização no relatório “Anistia Internacional – Informe 2017/2018 – O Estado dos Direitos Humanos no Mundo” (aqui).

Alcançou repercussão mundial o assassinato da vereadora Marielle Franco, do Rio de Janeiro, reconhecida defensora de direitos humanos, e de seu motorista, Anderson Pedro Gomes, no dia 14 de março de 2018, na capital fluminense.

Um dos motivos da percepção negativa que faixas significativas da população brasileira ainda nutrem em relação ao tema é o desconhecimento em relação à Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela Assembleia das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948. “Antes tínhamos iniciativas como a do poeta amazonense Thiago de Mello, para popularizar a Declaração, mas agora, nem isso”, protesta o líder indígena Ailton Krenak.

Após o golpe militar de 31 de março de 1964, e de ter renunciado ao posto de adido cultural no Chile, Thiago de Mello publicou “Os Estatutos do Homem”, poema que foi uma inspiração aos grupos que resistiram à ditadura. Baseado na Declaração Universal dos Direitos Humanos, os Estatutos são uma celebração poética da vida e da liberdade. “Fica decretado que agora vale a verdade/ agora vale a vida,/ e de mãos dadas,/ marcharemos todos pela vida verdadeira”, diz o primeiro dos 14 artigos dos Estatutos (aqui).

Outro grande divulgador da Declaração Universal dos Direitos Humanos foi o ex-cardeal-arcebispo de São Paulo, D.Paulo Evaristo Arns, falecido em 14 de dezembro de 2016, aos 95 anos.

Pois se a Declaração Universal dos Direitos Humanos, documento central para a cidadania planetária, é ainda pouco conhecido, ele é rasgado na prática, diariamente, em todos os cantos do Brasil. Esta é a conclusão de líderes de organizações sociais e movimentos e de alguns dos principais nomes da luta pelos direitos humanos nas últimas quatro décadas no país, ouvidos pela Agência Social de Notícias.

Um passo importante, de acordo com os defensores dos direitos humanos no Brasil, seria a execução do terceiro Programa Nacional de Direitos Humanos, instituído pelo Decreto nº 7.037, de 21 de dezembro de 2009, e atualizado pelo Decreto nº 7.177, de 12 de maio de 2010. O Programa (aqui) apresenta as bases de uma Política de Estado para os direitos humanos e é marcado pela indivisibilidade e interdependência de seus dispositivos, estruturando-se em torno de Eixos Orientadores, Diretrizes, Objetivos Estratégicos e Ações Programáticas.

A ASSINATURA BRASILEIRA NA DECLARAÇÃO UNIVERSAL

A Declaração Universal dos Direitos Humanos é fruto do processo de reorganização que se seguiu à barbárie da II Guerra Mundial. O respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião, seria um dos princípios da Organização das Nações Unidas (ONU), de acordo com o documento que marcou a sua fundação, em 1945: a Carta de São Francisco.

No dia 10 de dezembro de 1948 a Declaração Universal dos Direitos Humanos foi aprovada em Assembleia Geral da ONU, com 48 votos favoráveis, oito abstenções e sem voto contrário. Papel determinante na arquitetura e aprovação do documento teve Eleanor Roosevelt, primeira-dama dos Estados Unidos entre 4 de março de 1933 e 12 de abril de 1945 – ela era esposa do presidente Franklin Delano Roosevelt.

Fato pouco conhecido é que a Declaração Universal de 1948 tem uma assinatura verde-amarela. O jornalista Austregésilo de Athayde, pernambucano de Caruaru, que integrou a delegação brasileira à Assembleia da ONU que aprovou a Declaração, deu importante colaboração na redação do documento, como reconheceria o próprio René Cassin, autor do primeiro esboço da Declaração Universal. “Não me sentiria bem nesta hora se não dissesse que quero dividir as honras deste prêmio com o grande pensador brasileiro Austregésilo de Athayde a quem muito devemos na obra realizada”, declarou o jurista e filósofo francês aos jornalistas, logo após receber a notícia de que havia sido contemplado com o Prêmio Nobel da Paz. Athayde foi presidente da Academia Brasileira de Letras de 1958 a 1993, quando faleceu, aos 95 anos, no dia 13 de setembro.

Coleta e destinação de resíduos continuam sendo um dilema em grande parte do Nordeste,região com muitas doenças consideradas negligenciadas (Foto Adriano Rosa)

Coleta e destinação de resíduos continuam sendo um dilema em grande parte do Nordeste, região com muitas doenças consideradas negligenciadas, um dos sintomas da desigualdade social (Foto Adriano Rosa)

Artigo 1

Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos

O dia 14 de julho é, por coincidência, a data de aniversário de Campinas (fundada a 14 de julho de 1774) e a data nacional da França – a 14 de julho de 1789, a Queda da Bastilha foi o episódio central da Revolução Francesa, um marco na história mundial em defesa dos direitos humanos. Pois nesse 14 de julho de 2018, quando a cidade comemorou 244 anos, mais uma vez a Comunidade Jongo Dito Ribeiro celebrou o Arraial Afro-Julino na Fazenda Roseira. Mais de 3 mil pessoas, representando a comunidade afro-brasileira de Campinas e suas tradições religiosas e culturais, mas também de muitos outros grupos, em uma festa democrática, um tributo à igualdade.

Igualdade que não tem sido a marca da história do país e muito menos para a população negra. “Nós temos avançado muito em termos de conhecimento do que são os direitos humanos. Hoje todos os grupos, independente de raça, etnia, religião ou classe social, sabem que têm direitos e estão lutando e procurando dialogar e discutir. Há um grande debate público por direitos. Também avançamos no sentido de reconhecer que, sim, somos um país racista e machista. Então, o que é preciso é avançar, e muito, em políticas para termos igualdade de fato”. As palavras são da Dra. Alessandra Ribeiro, gestora cultural da Casa de Cultura Fazenda Roseira e liderança da Comunidade Jongo Dito Ribeiro, referências da comunidade afro-brasileira em Campinas e anfitriãs do 15º Arraial Afro-Julino.

Todo o elenco de políticas públicas e programas implantado até o momento não conseguiu apagar a impressão digital da desigualdade. É o que apontam estudos como a tese de Pedro Herculano Guimarães Ferreira de Souza (aqui), para obtenção de título de doutor pela Universidade de Brasília (UnB), mostrando que entre 1926 e 2013 o 1% mais rico da população brasileira somou entre 20% e 25% da renda nacional em média. O estudo revelou que a concentração no topo “teve idas e vindas que, mesmo temporárias, foram significativas, coincidindo com os grandes ciclos políticos do país”. Os períodos de maior concentração de renda pelo 1% mais rico, segundo Pedro Herculano Guimarães Ferreira de Souza, coincidiram com os regimes mais autoritários: o Estado Novo (1937-1945) de Getúlio Vargas e a ditadura militar de 1964-1984. Nos anos de 1942-43, 1988 e 1998 foram registradas as maiores proporções de concentração de renda pelo 1% mais rico: cerca de 30%. Os anos de 1960 e 1962 foram aqueles de menor concentração pelo 1% mais rico: cerca de 18%.

Arte de Junião para o cartaz do 15º  Arraial Afro-Julino, da Comunidade Jongo Dito Ribeiro, citando Marielle Franco, assassinada a 14 de março de 2018

Arte de Junião para o cartaz do 15º Arraial Afro-Julino, da Comunidade Jongo Dito Ribeiro, citando Marielle Franco, assassinada a 14 de março de 2018

Entendimento semelhante foi apresentado pela Pesquisa Desigualdade Mundial 2018, coordenada em esfera global pelo economista francês Thomas Piketty, autor do best-seller “O Capital no Século XXI” (Editora Intrínseca, 2014). A Pesquisa, fruto do trabalho coletivo de centenas de especialistas, mostrou que o 1% mais rico do Brasil contabilizou 27,8% da renda do país em 2015. Assim o Brasil lidera o ranking global de concentração de renda pelo 1% mais endinheirado, à frente dos mais ricos do Oriente Médio, que somam 26,3% da renda, segundo a Pesquisa Desigualdade Mundial 2018 (aqui).

“As pessoas nascem em diferentes contextos, em situações diversas, mas a dignidade humana é inerente à cidadania. Os direitos devem ser iguais para todos, para que todos tenham as mesmas condições para o seu desenvolvimento. Infelizmente não é o que ocorre no Brasil, onde há, por exemplo, milhares de crianças em registro de nascimento e um número ainda maior de crianças sem filiação completa em seus registros”, afirma Vital Didonet, ex-vice-presidente mundial da Organização Mundial para a Educação Pré-Escolar (OMEP) e duas vezes vice-presidente da OMEP para a América Latina. Didonet é uma das principais referências em primeira infância no continente.

Alessandra, a líder da Comunidade Jongo Dito Ribeiro: é preciso avançar muito para a igualdade de fato (Foto José Pedro S.Martins)

Dra. Alessandra, a líder da Comunidade Jongo Dito Ribeiro: é preciso avançar muito para a igualdade de fato (Foto José Pedro S.Martins)

Artigo 2

Todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição –

Se o Brasil é campeão mundial em desigualdade de renda, a situação é ainda mais grave para a população negra no país. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2015 (aqui) revelou que a população de negros e pardos somava 54% da população brasileira e 75,5% dos 10% mais pobres do país – essa proporção é praticamente a mesma desde 2005. A mesma pesquisa mostrou que entre 2005 e 2015 os domicílios da população negra com acesso a saneamento cresceu de 44,2% para 55,3%, enquanto a evolução nos lares de população branca foi de 64,8% para 71,9%.

Para a Dra. Alessandra Ribeiro, gestora cultural da Casa de Cultura Fazenda Roseira e liderança da Comunidade Jongo Dito Ribeiro, as diferenças salariais e de acesso ao mercado de trabalho são evidências incontestáveis do racismo existente no país. Ela diz esperar que as eleições de outubro sejam um momento de renovação na política brasileira. “Precisamos de políticos com novas visões, novas práticas, para que os direitos humanos virem políticas garantidas na realidade e não só no papel”, completa.

Fundador em 1995 do primeiro grupo LGBT de Campinas, o Expressão – Grupo de Defesa dos Direitos Humanos de Homossexuais, o advogado Paulo Tavares Mariante entende que o respeito ao direito de toda pessoa não ser discriminada, por qualquer tipo de motivação, nos termos do artigo 2º da Declaração Universal, “certamente ainda se encontra muito distante na maioria dos estados pelo mundo”.

Artigo 3

Todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal -

Durante 20 anos o padre Ricardo Rezende Figueira atuou na região de Rio Maria e Conceição do Araguaia, no Sudeste do Pará, um dos principais focos de conflito pela terra no Brasil. O religioso recebeu muitas ameaças de morte, sua casa foi metralhada, mas continuou a militância, agora como professor na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), atuando no Núcleo de Estudos de Políticas Públicas em Direitos Humanos.

“A violência no meio rural ainda está distante dos meios de comunicação. Há muita omissão da grande mídia. Às vezes é preciso que um caso seja denunciado na imprensa internacional para que tenha repercussão aqui”, diz o padre Ricardo Rezende, que foi um dos principais responsáveis pela projeção internacional alcançada pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), órgão ligado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e que monitora a violência no meio rural.

De acordo com a CPT, somente em 2017 foram registrados 71 assassinatos por conflitos de terra.  Foram casos como o de Damião Lima da Silva, o “Dão”, de 28 anos, atuante liderança Indígena Xukuru-Kariri. Ele foi morto no dia 8 de março de 2017, na Terra Indígena Xukuru-Kariri em Palmeira dos Índios (AL).

A CPT Nacional nota que desde 2013 tem aumentado ano a ano o número de assassinatos em conflitos de terra no Brasil. Foram 29 em 2013, 36 em 2014, 47 em 2015, 58 em 2016 e 71 em 2017.

Os dados sobre a violência urbana confirmam que o direito à vida é um dos menos respeitados no Brasil. Segundo o Mapa da Violência 2016 (aqui), da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (FLACSO), o Brasil registrou impressionantes 967.851 mortes por armas de fogo entre 1980 e 2014. O Mapa da Violência observa que a Região Nordeste foi a que apresentou as maiores taxas de homicídios por arma de fogo (HAF) entre 2004 e 2014. A taxa média em 2014 foi de 32,8 HAF por 100 mil habitantes, “bem acima da taxa da região que vem imediatamente a seguir, Centro-Oeste, com 26,0″. Em 2015 foram 59.080 homicídios no Brasil, segundo o Atlas da Violência (aqui), produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).

A violência contra as mulheres continua assustadora no Brasil. A taxa de homicídios de mulheres por 100 mil habitantes, que era de 2,3/100 mil em 1980, saltou para 3,5/100 mil em 1990 e para 4,6/100 mil em 1996, decaindo um pouco em seguida para voltar a crescer, chegando a 4,8/100 mil em 2013. O ano de 2014 foi o mais violento para as mulheres na história recente do Brasil, com 4.836 assassinatos, segundo o Mapa da Violência.

O conjunto de 120.207 mulheres assassinadas no Brasil, desde 1980, representa 12 vezes mais o total de 9891 mortes nos 30 piores atentados terroristas registrados entre o ataque ao World Trade Center, em 11 de setembro de 2001, e o ataque à casa de shows Bataclan, em Paris, em 13 de novembro de 2015.

Após a Constituição de 1988 foram aprimorados os instrumentos e as estruturas oficiais de enfrentamento da violência contra a mulher no Brasil. Foram implantados os Conselhos Municipais de Mulheres, as Delegacias da Mulher, as Casas Abrigo para vítimas e mecanismos como o Ligue 180, número de telefone pelo qual podem ser feitas denúncias anônimas de qualquer modalidade de violência contra as mulheres. Desde 2005, quando foi criado, o serviço recebeu mais de 6 milhões de ligações.

Um dos maiores avanços nesse enfrentamento à violência contra a mulher brasileira, muitas vezes levando a vítima ao óbito, por misoginia ou racismo, foi a edição da lei 11.340, de 2006. Lei conhecida como Lei Maria da Penha, em razão da biografia de Maria da Penha Maia Fernandes, que sofreu violência doméstica durante 23 anos e tornou-se paraplégica em razão das agressões.

A simples edição da Lei Maria da Penha e a criação de novos mecanismos não foram suficientes para barrar a escalada da violência contra as mulheres e os feminicídios, mostram dados recentes. O  Mapa da Violência revelou que após a entrada em vigor da Lei Maria da Penha o número de vítimas caiu 2,1% entre as mulheres brancas e aumentou 35,0% entre as negras. O índice de vitimização negra nos homicídios de mulheres no Brasil cresceu de 22,9% em 2003 para 66,7% em 2013.

Também têm sido registrados retrocessos inquietantes. Um deles foi a retirada do status de Ministério da Secretaria Nacional de Políticas para Mulheres, transformada em secretaria do Ministério da Justiça, quando o presidente Michel Temer assumiu o poder, após o impeachment da presidente Dilma Rousseff, em 31 de agosto de 2016. Impeachment decretado pelo Congresso Nacional, formado por uma maioria absoluta de homens: mais de 85% do parlamento brasileiro são do sexo masculino.

Tem crescido, em contrapartida, a força e a abrangência da ação de grupos feministas, coletivos e organizações sociais que lutam pelos direitos das mulheres. Caso do SOS Ação Mulher e Família, de Campinas, que em 36 anos de atividades acolheu mais de 22 mil pessoas, para um trabalho pluridisciplinar, psicológico, jurídico e social. Um dos focos atuais do SOS, de acordo com sua coordenadora, Gislaine Rossetto, é a prevenção, “com ações junto às famílias, para a interrupção do ciclo de violência”.

Banner eletrônico de campanha do Ministério Público Federal contra o trabalho escravo

Banner eletrônico de campanha do Ministério Público Federal contra o trabalho escravo

Artigo 4


Ninguém será mantido em escravidão ou servidão; a escravidão e o tráfico de escravos serão proibidos em todas as suas formas –

O padre Ricardo Rezende Figueira descobriu que o trabalho escravo continua sendo praticado no Brasil quando chegou à região de Conceição do Araguaia, no Pará, em 1977. Ele estava na escadaria de uma Igreja quando viu um trabalhador saindo correndo de um automóvel, logo sendo seguido por duas pessoas, que o acabaram capturando. A princípio, o religioso pensou que era algum tipo de brincadeira. Em pouco tempo percebeu que era muito sério: quem foge de situações análogas à escravidão, sobretudo no paraíso tropical da Amazônia, entra rápido para o inferno das ameaças de morte, muitas delas cumpridas.

Tendo se tornado um dos personagens centrais da discussão e mobilização contra o trabalho escravo no Brasil, o padre Rezende admite que o país passou a ter uma legislação avançada em relação ao tema, mas continua a conviver com a prática da escravidão por vários motivos. “Temos um cenário de desigualdade social e pobreza que produz o trabalho escravo. Onde há precariedade há maior possibilidade de aliciamento para o trabalho escravo”, define.

“A escravidão não continua a existir apenas no Brasil. Está presente na África, na Ásia, também por questões econômicas e ecológicas, por deslocamentos forçados que colocam a pessoa em situação de vulnerabilidade. E a escravidão existe porque é sempre do outro que se trata. É o estrangeiro absoluto, na definição do antropólogo Claude Meillasoux”, comenta.

Rezende assinala que houve, sim, avanços em termos legais e institucionais no Brasil, desde o reconhecimento pelo Estado, a partir de 1995, da existência de trabalho escravo no país, levando a medidas como a criação do Grupo Interministerial para Erradicar o Trabalho Escravo (Gertraf), substituído em 2003 pela Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae) e, depois, Coordenação Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conaete).

Foram igualmente criados o Grupo Especial de Fiscalização Móvel (GEFM) e a Lista Suja do Trabalho Escravo, um instrumento de visibilidade das empresas que praticam ou usam o trabalho escravo em suas cadeias produtivas. Como decorrência da criação desses mecanismos e da própria mobilização nacional e internacional, a CPT calcula que, desde 1995, mais de 40 mil pessoas foram resgatadas da condição de trabalho escravo no Brasil.

Entretanto, o professor da UFRJ afirma estar muito preocupado com os retrocessos na legislação trabalhista, praticados pelo governo do presidente Michel Temer. “No lugar de avançarmos ainda mais, nós retrocedemos. Agora pode tudo, inclusive jornadas de trabalho acima de oito horas, dependendo do acordo entre empregador e empregado. Não há mais intermediação do sindicato, o negociado se sobrepõe ao julgado”, alerta Rezende, para quem a situação favorece a continuidade de casos de trabalho análogo à escravidão.

Além disso, nota que tem ocorrido a diminuição dos recursos para o trabalho de fiscalização do trabalho escravo. “Sem recursos não há como fiscalizar, denunciar e resgatar da escravidão”, adverte.

A CONDENAÇÃO DO BRASIL

No dia 15 de dezembro de 2015, em sentença histórica, a Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o Estado do Brasil pela prática de trabalho escravo e tráfico de seres humanos, abrangendo 85 funcionários da Fazenda Brasil Verde. “O Estado brasileiro não demonstrou ter adotado medidas específicas e nem ter atuado com a devida diligência para prevenir a forma contemporânea de escravidão à qual essas pessoas foram submetidas, nem para por fim a essa situação”, declarou a CIDH na sentença.

Artigo 5


Ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante -

Como nota o mesmo Ricardo Rezende Figueira, professor da UFRJ, a condenação da escravidão e da tortura é absoluta, em espaços como a Corte Europeia dos Direitos Humanos e Comissão Interamericana dos Direitos Humanos. “Mesmo em situações de guerra ou catástrofe, a escravidão e a tortura não são de forma alguma admitidas para essas instâncias”, comenta o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Entretanto, a tortura continua ocorrendo no Brasil, conforme têm denunciado organizações como a Anistia Internacional e a Conectas Direitos Humanos. No ano 2000 o então Relator Especial das Nações Unidas sobre Tortura, Nigel Rodley, afirmou em relatório, após visita ao Brasil: “O período do regime militar de 1964 a 1985, caracterizado pela tortura, desaparecimentos forçados e execuções extra-judiciais, ainda paira sobre o presente regime democrático”.

A permanência da prática de tortura foi reconhecida no mesmo ano pelo Estado brasileiro, que reiterou a posição em 2008, por ocasião do envio de relatório nacional ao Conselho de Direitos Humanos da ONU, na Revisão Periódica Universal: “No Brasil continuam sendo frequentes as acusações de abuso de poder, tortura e uso excessivo da força cometidos, principalmente, por policiais e agentes penitenciários” (no parágrafo 51).

Em 2015, o assunto voltou a ser discutido p0r um novo Relator Especial das Nações Unidas sobre Tortura, Juan Mendez, que ressaltou em relatório que “A tortura e os maus-tratos por parte da polícia e dos agentes penitenciários segue sendo um fato alarmante e de ocorrência regular, principalmente contra pessoas que pertencem a minorias raciais, sexuais, de gênero e outros grupos minoritários”.

Um dos avanços na área, de acordo com organizações humanitárias, foi o estabelecimento pelo governo federal do Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (CNPCT) e do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), resultantes da Lei nº 12.847, sancionada no dia 2 de agosto de 2013, pela presidente Dilma Rousseff, instituindo o Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura.

Agora, organizações de Direitos Humanos se empenham pela criação do Mecanismo de Prevenção e Combate à Tortura no Estado de São Paulo, nos moldes do Mecanismo Nacional e a exemplo de Mecanismos já criados em Alagoas, Espírito Santo, Maranhão, Minas Gerais, Paraíba, Pernambuco, Sergipe, Rio de Janeiro e Rondônia.

Artigo 6

Todo ser humano tem o direito de ser, em todos os lugares, reconhecido como pessoa perante a lei -

No final de 1987, quando a Assembleia Nacional Constituinte discutia a elaboração de uma nova Constituição para o Brasil, um forte lobby anti-indígena tentava impedir que os direitos dos povos nativos fossem reconhecidos na Carta Magna. O quadro mudou depois que um jovem líder indígena subiu à tribuna do Congresso Nacional e pronunciou discurso histórico, enquanto pintava o rosto com pasta de jenipapo. As suas palavras comoveram a opinião pública e contribuíram para que os direitos dos povos indígenas fossem inscritos no artigo do novo texto constitucional. O discurso teve um trecho incluído no filme “Índio Cidadão?”, de Rodrigo Siqueira, com estreia mundial no dia 19 de abril de 2014, conforme publicado acima no canal do documentário no Youtube.

Para Ailton Krenak, o auge do impacto da Declaração Universal dos Direitos Humanos foi a década de 1980, com manifestações e mobilizações em escala global, coincidindo com a própria edição da nova Constituição brasileira. A partir dos anos 1990, contudo, “os princípios apontados pela Declaração Universal foram esmaecendo, seu sentido foi esvaziando”, lamenta.

Na sua opinião, um dos motivos do esvaziamento da Declaração Universal dos Direitos Humanos foi o fato de que “os Estados-Nação perderam a sua força, diante do avanço do poder das corporações e da globalização”. Uma nova ordem internacional foi estruturada, na órbita dos Estados Unidos. “Os Estados-Nação se tornaram vassalos das grandes potências, os direitos de cidadania passaram a ser atacados em todo planeta, abrindo espaço para o crescimento de forças fascistas”, diz Ailton Krenak.

Indígenas presentes no I Encontro dos Povos Indígenas do Xingu, em Altamira, em 1989, reproduziram aspectos de seu modo de vida do lado de fora do local onde o evento  estava sendo realizado: a defesa das raízes da cultura brasileira  (Foto José Pedro Soares Martins)

Indígenas presentes no I Encontro dos Povos Indígenas do Xingu, em Altamira, em 1989, reproduziram aspectos
de seu modo de vida do lado de fora do local onde o evento
estava sendo realizado: a defesa das raízes da cultura brasileira (Foto José Pedro Soares Martins)

Artigo 7

Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação –

No dia 27 de junho de 2018, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) manifestou a sua “profunda preocupação” com a violência incessante e as mortes nos centros socioeducativos para adolescentes em conflito com a lei penal no Brasil. “A informação recebida indica que, em menos de um mês, pelo menos 10 adolescentes foram mortos em um Centro no estado de Goiás e um adolescente no estado do Ceará. A esses se somam outros eventos semelhantes que ocorreram nos primeiros meses deste ano”, destacou a CIDH.

Artigo 8

Todo ser humano tem direito a receber dos tribunais nacionais competentes remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei –

A equidade na Justiça ainda parece longe de muitas situações de violações aos direitos humanos no Brasil. De acordo com dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT), em menos de 10% dos mais de 1700 casos de assassinatos de trabalhadores rurais ocorridos desde 1985 houve julgamento dos acusados e em um número menor ainda houve condenação e prisão dos culpados.

Artigo 9


Ninguém será arbitrariamente preso, detido ou exilado -

Um processo que tramita na Corte de Roma pode levar ao que ainda não aconteceu como regra no Brasil da redemocratização: a penalização, após devido julgamento, de responsáveis por violações aos direitos humanos durante o regime militar. “É um processo histórico, com uma mensagem muito clara: se continua o manto de impunidade cobrindo quem cometeu violações aos direitos humanos no Brasil na ditadura, isso não acontece em outras partes do mundo”, descreve Jair Krischke, fundador e presidente da organização Movimento de Justiça e Direitos Humanos (MJDH).

Uma das vozes que continuam clamando pela punição dos responsáveis por prisões arbitrárias e desaparecimentos de opositores ao regime militar, Jair Krischke foi ouvido em duas oportunidades pela Justiça italiana, no processo relativo ao sequestro e desaparecimento do ítalo-argentino Lorenzo Viñas Gigli, ocorrido em Uruguaiana (RS), em 26 de junho de 1980. Krischke depôs pela primeira vez em 1999, na embaixada italiana em Buenos Aires, e em novembro de 2017, em Roma, em audiência sobre o caso.

Lorenzo Viñas Gigli, que já havia sido preso em 1974 na Argentina por sua militância no movimento Montoneros, desapareceu quando viajava de ônibus de Buenos Aires para o Rio de Janeiro, de onde embarcaria com a esposa para a Itália. Preso em Uruguaiana, como se descobriu depois, Viñas foi transportado para Paso de los Libres e, posteriormente, para uma prisão clandestina, onde manteve contato com outra prisioneira, Silvia Tolchinsky – uma das testemunhas ouvidas, por vídeo-conferência, na audiência da Corte romana. Estão sendo julgados quatro ex-militares brasileiros, de acordo com o Procedimento  Penale  n.  21192115   R.G.N.R.   e  5/16  RG,  III  Corte  di  Assise  di Roma, nei confronti  di “DA  SILVA  Marco  Aurelio  ed altri”, nos termos do Tribunale di Roma.

O presidente do MJDH lembra que no mesmo dia 26 de junho de 1980 desapareceu o sacerdote argentino Jorge Oscar Adur, que vivia exilado na França mas regressou clandestinamente à Argentina. De Buenos Aires, também de ônibus, estava em viagem para Porto Alegre, onde se encontraria com representantes das Mães da Praça de Maio, que haviam conseguido, por intermédio de Jair Krischke, uma audiência com o Papa João Paulo II, em viagem ao Brasil. Mas o padre Adur também desapareceu, na fronteira de Paso de los Libres e Uruguaiana.

Krischke nota que na ação que moveu sobre os episódios responsabilizou 13 autoridades brasileiras que, na sua opinião, tiveram relação direta com os desaparecimentos. A primeira delas, o presidente da República na época, o general João Figueiredo, seguido das demais autoridades militares, até aqueles que teriam relação direta com o caso.

“Dos 13 réus, dez já morreram. A sentença, no caso do processo que corre na Justiça italiana, deve sair até o final deste ano e pode representar um puxão de orelhas no Brasil, que ainda não teve a coragem e a dignidade de julgar os responsáveis por crimes durante a ditadura militar”, reitera.

O presidente do MJDH lembra que o episódio aconteceu em 1980, portanto após a Anistia concedida em 1979. “Não existe justificativa jurídica para que o caso não tenha sido julgado no Brasil”, nota.

O que acontece, continua Krischke, “é que a Anistia, da forma como foi praticada no Brasil, levou ao esquecimento da memória, mas o resgate e a punição dos responsáveis são fundamentais para a nossa história. Em todos os nossos vizinhos, que também passaram por ditaduras, os responsáveis foram punidos. Na Argentina, mais de 400 militares foram condenados. O ex-presidente (general Jorge Rafael) Videla morreu na prisão (em 2013). No Uruguai, do mesmo modo, o general Gregorio Álvarez morreu na prisão (em 2016). No Brasil, nem o cabo da guarda respondeu a nenhum inquérito”, completa o gaúcho, fundador da organização que já atuou em vários casos relacionados a violações aos direitos humanos no Cone Sul.

O Movimento de Justiça e Direitos Humanos foi fundado em 25 de março de 1979, embora o registro jurídico tenha sido obtido em 11 de agosto de 1980. Em colaboração com o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) e várias outras organizações, e com atuação sobretudo na área do Cone Sul, o MJDH participou de diversos casos, como na denúncia do sequestro dos uruguaios Lilian Celiberti, seus dois filhos menores, e Universindo Díaz, ocorrido em Porto Alegre, no dia 12 de novembro de 1978.

O caso teve repercussão mundial. Depois de cinco anos presos no Uruguai, o casal foi solto com o fim da ditadura em seu país. Em 1980 dois policiais brasileiros que participaram da operação foram condenados pela justiça brasileira – eles tinham sido flagrados, no apartamento onde Lilian era mantida prisioneira, pelos jornalistas da sucursal de “Veja” em Porto Alegre, Luiz Cláudio Cunha e João Baptista Scalco.

Jair Kritschke entende que o processo que tramita em Roma é expressivo, pela contribuição que pode dar ao esclarecimento sobre a Operação Condor, a cooperação existente entre os governos militares na América Latina. Ele defende a tese de que a Operação Condor foi lançada na prática no Brasil.

“Em 11 de dezembro de 1970, o Brasil deu inicio a esta prática ao atuar em conjunto com o aparelho repressivo da Argentina, no caso do sequestro em Buenos Aires do coronel do exército brasileiro, Jefferson Cardim de Alencar Osorio, seu filho e um sobrinho. Trata-se do primeiro caso fartamente documentado”, comenta.

O “batismo” da Operação Condor aconteceu na reunião ocorrida no Chile, entre os dias 25 de novembro e 01 de dezembro de 1975, com a participação de representantes dos governos militares da região. Krischke observa que os representantes brasileiros não assinaram a data de “fundação” da Operação Condor. “Este elemento levou algumas pessoas a afirmarem que o Brasil não participou da Operação, o que absolutamente não é verdade, como demonstra farta documentação”, completa.

“O que aconteceu no Brasil foram crimes lesa-humanidade e sou daqueles que acreditam que, se um ser humano foi violado em seus direitos, toda humanidade foi. Portanto, se conseguirmos uma condenação na justiça italiana, será fundamental para uma acerto de contas históricos no nosso país, onde uma transição da ditadura para a democracia foi na realidade uma transação, que deixou muitos impunes”, conclui Jair Krischke, presidente da organização que fundou com outros ativistas pelos direitos humanos e cujo modesto escritório, no centro de Porto Alegre, mantém em destaque na parede um cartaz com o primeiro artigo da Declaração Universal dos Direitos Humanos traduzido em várias línguas.

Jair Krischke aplaudiu a recente decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), que responsabilizou o Estado brasileiro por não investigar crime de lesa-humanidade cometido contra o jornalista Vladimir Herzog. Na mesma deliberação, no último dia 4 de julho, a Corte Interamericana também responsabilizou o Estado pela violação dos direitos a conhecer a verdade e à integridade pessoal dos familiares de Vladimir Herzog.

Em 25 de outubro de 1975, lembrou a CIDH em sua deliberação, o jornalista Vladimir Herzog “foi privado de sua liberdade, interrogado, torturado e, finalmente, assassinado em um contexto de ataques sistemáticos e generalizados contra civis considerados “opositores” da ditadura brasileira, em especial contra jornalistas e membros do Partido Comunista Brasileiro”.

Decisões em Brasília afetam direitos de todos os cidadãos do país (Foto Adriano Rosa)

Decisões em Brasília afetam direitos de todos os cidadãos do país (Foto Adriano Rosa)

Artigo 10

Todo ser humano tem direito, em plena igualdade, a uma justa e pública audiência por parte de um tribunal independente e imparcial, para decidir seus direitos e deveres ou fundamento de qualquer acusação criminal contra ele – 

Para a Anistia Internacional, foi um retrocesso a edição da Lei Federal Nº 13.491/2017, assinada pelo Presidente  Michel Temer em 13 de outubro de 2017, estabelecendo que violações de direitos humanos, inclusive homicídio ou tentativa de homicídio, cometidas por militares contra civis seriam julgadas por tribunais militares. “Esta lei viola o direito a um julgamento justo, uma vez que os tribunais militares no Brasil não oferecem garantia de independência judicial”, acrescenta o relatório da Anistia Internacional de 2017-2018.

Artigo 11

1.Todo ser humano acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa.
2. Ninguém poderá ser culpado por qualquer ação ou omissão que, no momento, não constituíam delito perante o direito nacional ou internacional. Também não será imposta pena mais forte de que aquela que, no momento da prática, era aplicável ao ato delituoso.

Vários juristas e organizações manifestaram a sua preocupação com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que introduziu modificações no entendimento sobre a presunção de inocência. Em 2009, o STF havia decidido, por ampla maioria, que as eventuais prisões só poderiam ocorrer após  o  trânsito  em  julgado.  Em  2016, contudo,  por  seis  votos  contra  cinco,  os  ministros do STF decidiram pela possibilidade de prisão em segunda instância, o que para muitos juristas e organizações seria uma posição contrária à presunção de inocência.

Manifesto nesse sentido foi assinado por organizações como ABRACRIM (Associação  Brasileira  dos  Advogados  Criminalistas), IGP (Instituto  de Garantias Penais), IAB (Instituto dos Advogados Brasileiros), IDDD (Instituto de Defesa do Direito de Defesa), ABJD (Associação Brasileira dos Juristas pela Democracia, Sindicato dos Advogados do  Estado  de  São  Paulo),  IBCCRIM (Instituto  Brasileiro  de  Ciências  Criminais), ANADEP (Associação  Nacional  dos  Defensores  Públicos,  Defensoria  Pública  do  Estado  Rio  de  Janeiro), Defensoria Pública do Estado de São Paulo (DPE-SP), Núcleo de Defesa Criminal da Defensoria Pública do Rio Grande do Sul (NUDECRIM/DPERS, ACRIERGS), Associação dos Advogados Criminalistas do Rio Grande do Sul, CAAD (Coletivo Advogadas e Advogados pela Democracia), ADJC (Advogados e Advogadas pela Democracia, Justiça e Cidadania), dentre outras.

“Advogados/as, defensores/as público/as, juizes/as, membros do Ministério Público, professores de Direito, e demais profissionais da área jurídica que abaixo subscrevem vêm, através da presente nota, em defesa da Constituição, bradar pelo respeito aos direitos e garantias fundamentais, notadamente da presunção de inocência, corolário do Estado Democrático de Direito”, afirmam as organizações, no primeiro parágrafo da “Nota em Defesa da Constituição” (aqui). No documento, os signatários questionam a deliberação do STF e reafirmam a presunção de inocência como um dos fundamentos do Estado de Direito.

Artigo 12


Ninguém será sujeito à interferência na sua vida privada, na sua família, no seu lar ou na sua correspondência, nem a ataque à sua honra e reputação. Todo ser humano tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques -

A Anistia Internacional, em seu relatório 2017/2018, mostrou que violações a esse direito foram cometidas, no âmbito das operações policiais no Rio de Janeiro. No começo de 2017, lembra a Anistia Internacional, “policiais militares da Unidade de Polícia Pacificadora efetuaram buscas em diversas casas na favela do Complexo do Alemão, na cidade do Rio de Janeiro. Essas ações ilegais da polícia prosseguiram mesmo com uma ordem judicial determinando que a polícia deixasse aquela área. As pessoas que denunciaram as violações policiais foram ameaçadas e intimidadas. Após meses de mobilizações, o Ministério Público ofereceu denúncia contra dois policiais que estavam no comando da operação e eram responsáveis pela área”, registrou a Anistia.

Artigo 13


1. Todo ser humano tem direito à liberdade de locomoção e residência dentro das fronteiras de cada Estado.

2. Todo ser humano tem o direito de deixar qualquer país, inclusive o próprio e a esse regressar.

O direito de locomoção é assegurado no Brasil, de acordo com o artigo  5º da Constituição Federal, inciso XV: “é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens”. Esse direito de ir e vir, contudo, é limitado na prática por vários fatores, como a violência no trânsito, que mata anualmente milhares de brasileiros.

Segundo dados do Ministério da Saúde, somente em 2015 morreram 38.651 pessoas em vias públicas brasileiras, o que coloca o país como o quinto no mundo em vítimas no trânsito. A mesma fonte indica que 82,38% dos mortos no trânsito naquele ano foram do sexo masculino e 17,62%, do sexo feminino.

Lançamento da Cátedra “Sergio Vieira de Mello” e do Pacto Universitário (Foto Martinho Caires)

Lançamento em Campinas da Cátedra “Sergio Vieira de Mello” e do Pacto Universitário (Foto Martinho Caires)

Artigo 14


1. Todo ser humano, vítima de perseguição, tem o direito de procurar e de gozar asilo em outros países.

2. Esse direito não pode ser invocado em caso de perseguição legitimamente motivada por crimes de direito comum ou por atos contrários aos objetivos e princípios das Nações Unidas.

A guerra civil que resultou em mais de 5 milhões de refugiados sírios tem sido acompanhada pelo mundo todo e em Campinas, no interior de São Paulo, o drama se materializa nos casos de famílias que chegaram à cidade. Como a família Zinou, que chegou ao Brasil em abril de 2014. Após as dificuldades esperadas de adaptação e o enfrentamento dos trâmites burocráticos, a família se instalou em Campinas e ficou conhecida por abrir um restaurante, com a saborosa comida síria. O restaurante foi batizado de Castelo, como uma homenagem ao Castelo de Aleppo, que seria um dos mais antigos do mundo. Aleppo é a cidade de origem da família Zinou. “Houve dificuldades no início, mas a cidade tem sido generosa conosco”, diz a médica  Ayla Zinou, filha do casal M.Suhib e Chaza.

Estima-se em 1600 o número de imigrantes ou refugiados que chegaram a Campinas no fluxo pós-2010. O maior grupo, de 1200 imigrantes, é o de latinoamericanos e caribenhos, incluindo o mais numeroso, de 900 haitianos. Mas também há bolivianos, peruanos, colombianos, venezuelanos e cubanos, muitos deles atuando na cidade e região como integrantes do Programa Mais Médicos. O Programa é uma ação do governo federal e que incluii parceria com o governo cubano, para que profissionais cubanos atuem no Sistema Único de Saúde no Brasil, preferencialmente em regiões onde há carência de médicos.

A cidade de Campinas vem procurando criar uma política de acolhimento aos migrantes dos fluxos recentes. O mais importante serviço público estruturado para atender a essa nova onda migratória em Campinas é o Serviço de Referência ao Imigrante, Refugiado e Apátrida. Como destaca o diretor de Cidadania da Secretaria Municipal dos Direitos da Pessoa Com Deficiência e Cidadania, o Serviço de Referência trabalha em cinco eixos, para proporcionar amplo atendimento aos novos imigrantes e refugiados: Interculturalidade, Regularização de Documentação, Atenção Básica, Processos Formativos e Trabalho e Geração de Renda.

O esforço de Campinas é reconhecido pela representante do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) no Brasil, Isabel Marquez. “Campinas é uma cidade que procura acolher muito bem os refugiados e imigrantes”, disse a representante do ACNUR no Brasil. “A Cátedra na Unicamp e o apoio da Prefeitura são exemplos disso”, completou Isabel, no momento de lançamento oficial em Campinas da Cátedra “Sérgio Vieira de Mello” e do Pacto Universitário para a Promoção do Respeito à Diversidade, a Cultura de Paz e os Direitos Humanos.

O Brasil recebeu 33.866 pedidos de refúgio em 2017, um recorde, contra os 6.287 pedidos em 2016, 13.383 em 2015 e 11.405 em 2014. Foram 17.865 solicitações apenas de venezuelanos, em fuga da crise no país vizinho. Depois vieram os cubanos (2.373), os haitianos (2.362) e os angolanos (2.036), de acordo com o relatório (aqui) “Refúgio em Números”, do Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE).

A edição da Lei da Migração, nos termos da Lei nº 13.445/17, foi considerada um avanço por várias organizações, em relação ao Estatuto do Estrangeiro anterior, em vigor desde o regime militar. A Lei de Migração criou novas categorias de residência e simplificou procedimentos para obtenção da residência no Brasil. Há grande expectativa em relação à adoção, pelo conjunto de países, do Pacto Global para Refugiados, o novo marco regulatório mundial sobre deslocamento forçado, que deve ser assinado em setembro na Assembléia Geral da ONU, em Nova York, do qual, espera-se, o Brasil será signatário.

Artigo 15
1. Todo ser humano tem direito a uma nacionalidade.
2. Ninguém será arbitrariamente privado de sua nacionalidade, nem do direito de mudar de nacionalidade.

De acordo com o artigo 12, inciso I, da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 54/2007, são brasileiros natos: a) os nascidos na República Federativa do Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que estes não estejam a serviço de seu país; b) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que qualquer deles esteja a serviço da República Federativa do Brasil; c) os nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam registrados em repartição brasileira competente ou venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira. O Itamaraty afirma que os brasileiros nascidos no exterior devem ser registrados na repartição consular brasileira.

Artigo 16


1. Os homens e mulheres de maior idade, sem qualquer restrição de raça, nacionalidade ou religião, têm o direito de contrair matrimônio e fundar uma família. Gozam de iguais direitos em relação ao casamento, sua duração e sua dissolução.

2. O casamento não será válido senão com o livre e pleno consentimento dos nubentes.
3. A família é o núcleo natural e fundamental da sociedade e tem direito à proteção da sociedade e do Estado.

No dia 14 de maio de 2013, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou a Resolução Nº 175, dispondo sobre a “habilitação, celebração de casamento civil, ou de conversão de união estável em casamento, entre pessoas de mesmo sexo” (aqui). A norma obriga os cartórios a registrarem uniões entre pessoas do mesmo sexo. Desde a publicação da Resolução, foram registrados nos cartórios 19,5 mil casamentos homoafetivos, somente até 2016, último ano com dados disponíveis.

Capa de relatório anual publicado pelo CIMI

Capa de relatório anual publicado pelo CIMI

Artigo 17


1. Todo ser humano tem direito à propriedade, só ou em sociedade com outros.

2. Ninguém será arbitrariamente privado de sua propriedade.

O artigo 231 da da Constituição Federal de 1988 é taxativo: “São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”. Por este artigo e seus respectivos parágrafos um dos direitos fundamentais dos povos indígenas do Brasil, o direito a sua terra, deveria ser respeitado e garantido pelo Estado. A demarcação das terras indígenas seria o caminho jurídico natural para a garantia desse direito, mas 30 anos depois da edição da Constituição ainda não é o que se verifica, considerando o conjunto da população nativa do país.

De acordo com o último relatório “Violência contra os povos indígenas no Brasil” (aqui), lançado no final de 2017 pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI), das 1296 terras indígenas existentes no país, somente 401, ou 30,94% do total, tiveram demarcação concluída e registrada no Cartório de Registros de Imóveis da Comarca e/ou no Serviço do Patrimônio da União.

O desrespeito ao direito dos povos indígenas brasileiros a suas terras tem sido denunciado em várias instâncias. Foi citado, por exemplo, no Relatório da Missão ao Brasil da Relatora Especial das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas. Como nota o documento, a Relatora Especial sobre os direitos dos povos indígenas, Victoria Tauli-Corpuz, visitou o Brasil de 7 a 17 de março de 2016 a convite do Governo. “O propósito da visita era identificar e avaliar os assuntos mais importantes que atualmente os povos indígenas enfrentam no país e acompanhar as principais recomendações feitas pelo anterior titular do mandato após sua visita ao Brasil”, destaca o relatório.

UDR, que lutou contra a reforma agrária na Assembleia Constituinte, apoiou usina de Kararaô (depois Belo Monte)em manifestações paralelas ao I Encontro dos Povos Indígenas do Xingu, em Altamira, em 1989 (Foto José Pedro Soares Martins)

UDR, que lutou contra a reforma agrária na Assembleia Constituinte, apoiou usina de
Kararaô (depois Belo Monte)em manifestações paralelas ao I Encontro dos Povos Indígenas do Xingu, em Altamira, em 1989 (Foto José Pedro Soares Martins)

No seu relatório (aqui), Victoria Tauli-Corpuz cita vários episódios e situações de violência contra os povos indígenas brasileiros e acentua, com relação à demarcação das terras indígenas.

Ainda em 2016, no dia 24 de novembro, o Parlamento Europeu aprovou Resolução (aqui) sobre os Guarani-Kaiowá, no estado do Mato Grosso do Sul. O Parlamento Europeu discutiu a situação desse povo indígena, considerando, entre outros fatores, que desde o início do século 21 foram “assassinados pelo menos 400 indígenas e 14 líderes indígenas, nomeadamente Simeão Vilharva e Clodiodi de Souza, quando procuravam reivindicar as suas terras ancestrais em manifestações pacíficas”.

Comunidades das religiões afro-brasileiras na lavagem das escadarias da Catedral: a forte influência na cultura de Campinas e do Brasil (Foto Martinho Caires)

Comunidades das religiões afro-brasileiras na lavagem das escadarias da Catedral: a forte influência na cultura de Campinas e do Brasil (Foto Martinho Caires)

Artigo 18


Todo ser humano tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; esse direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença pelo ensino, pela prática, pelo culto em público ou em particular -

O ritual se repete há 33 anos. Aos poucos, a praça em frente à Catedral Metropolitana de Campinas, dedicada à Nossa Senhora da Conceição, padroeira da cidade, é tomada por uma multidão de pessoas vestindo branco. Mulheres, homens e crianças, de diversas idades, tomando posição para lavar as escadarias da Catedral.

A cerimônia de lavagem da Catedral de Campinas começou em 1985 e é realizada sempre no Sábado de Aleluia, pelas comunidades das religiões afro-brasileiras.

Em quase toda história do Brasil, e até boa parte do século 20, comenta a Dra.Alessandra Ribeiro, líder da comunidade Jongo Dito Ribeiro, liberdade religiosa era sinônimo de liberdade para exercer a fé católica. Entre o final do século 20 e inicio do século 21, houve um expressivo avanço de expressões de fé protestantes, com reflexos inclusive na eleição de grandes bancadas nos Parlamentos, nacional, estaduais e municipais. E, agora, completa, “o próprio tensionamento contribuiu para que o budismo, o terreirismo e outras expressões religiosas deixassem os seus espaços para promover um grande debate, um grande diálogo sobre a verdadeira diversidade religiosa”.

Imagem do primeiro encontro do Movimento Nacional de Direitos Humanos, em janeiro de 1982, em Petrópolis (Foto Acervo MNDH)

Imagem do primeiro encontro do Movimento Nacional dos Direitos Humanos, em janeiro de 1982, em Petrópolis (Foto Acervo MNDH)

Artigo 19

Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; esse direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras –

O jornalista e cientista político Dermi Azevedo é um dos profissionais de Imprensa que mais lutaram pela liberdade de opinião e expressão durante o regime militar. Preso político na ditadura, exilou-se no Chile entre 1970 e 1971. Atuou em alguns dos principais órgãos de comunicação do Brasil, como “Folha de São Paulo”, “Manchete” e “Veja”.

Em 1982, Dermi Azevedo foi um dos fundadores do Movimento Nacional dos Direitos Humanos (MNDH), no I Encontro Nacional de Direitos Humanos realizado de 20 a 24 de janeiro, no Centro de Estudos Franciscanos e Pastorais para a América Latina (Cefepal), em Petrópolis (RJ).

Para o jornalista e cientista político, “apenas recentemente a opinião pública passa a ter uma maior consciência crítica diante da manipulação das informações que lhe dizem respeito. Mas esses dados do cotidiano da cidadania são contaminados, de forma quase automática, pelas chamadas fakes, ou seja, pelas falsas informações que invadem a mídia”, alerta.

Artigo 20


1. Todo ser humano tem direito à liberdade de reunião e associação pacífica.

2. Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação.

O relatório de 2017/2018 da Anistia Internacional sinaliza que o direito à liberdade de reunião e associação pacífica continua sendo violado no Brasil. A organização cita as manifestações ocorridas em várias cidades, em 31 de março de 2017, contrárias às reformas propostas para a legislação trabalhista e as políticas de previdência social. Em 28 de abril, movimentos sociais, estudantes e sindicatos convocaram uma ‘greve geral’, e dezenas de milhares de pessoas protestaram por todo o país depois que as reformas trabalhistas foram aprovadas. “Em muitos locais, como na cidade do Rio de Janeiro, a polícia usou força desnecessária e excessiva contra manifestantes pacíficos”, protesta a Anistia Internacional.

Em 24 de maio de 2017, continua a organização, “pelo menos 49 pessoas ficaram feridas, entre as quais oito policiais militares e um homem atingido por arma de fogo, depois que a polícia usou a força de modo excessivo contra manifestantes na capital, Brasília. Dezenas de milhares de pessoas protestaram contra o Presidente Temer em uma manifestação que acabou em choques com a polícia e danos a edifícios públicos. Nos dias seguintes, o governo federal convocou e Exército para fazer o policiamento da área”, destaca a Anistia Internacional.

Artigo 21

1. Todo ser humano tem o direito de tomar parte no governo de seu país diretamente ou por intermédio de representantes livremente escolhidos.
2. Todo ser humano tem igual direito de acesso ao serviço público do seu país.
3. A vontade do povo será a base da autoridade do governo; essa vontade será expressa em eleições periódicas e legítimas, por sufrágio universal, por voto secreto ou processo equivalente que assegure a liberdade de voto.

Os dados sobre a presença feminina nos cargos eletivos ratificam que ainda permanece enorme desigualdade no Brasil. Segundo a Inter-Parliamentary Union (IPU), sediada em Genebra, na Suíça, o Brasil ocupa o 152º lugar em um ranking de 190 países, em termos de participação de mulheres na Câmara dos Deputados. Apenas 10,5% das vagas de deputados federais são ocupadas por mulheres, muito abaixo da média mundial, de 23,6%.

Para o jornalista e cientista político Dermi Azevedo, o Artigo 21 da Declaração Universal dos Direitos Humanos “define a democracia representativa e participativa como modelo “ideal” de estabelecimento do regime democrático”. Contudo, o que se vê na prática, lamenta, “é a representatividade básica da classe política manchada pelo verdadeiro comércio e compra de votos”.

Todo ser humano, como membro da sociedade, tem direito à segurança social", diz o Artigo 22 da Declaração Universal dos Direitos Humanos" (Foto Adriano Rosa)

“Todo ser humano, como membro da sociedade, tem direito à segurança social”, diz o Artigo 22 da Declaração Universal dos Direitos Humanos” (Foto Adriano Rosa)

Artigo 22

Todo ser humano, como membro da sociedade, tem direito à segurança social, à realização pelo esforço nacional, pela cooperação internacional e de acordo com a organização e recursos de cada Estado, dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento da sua personalidade -

Sábado, 14 de julho de 2018. A Treze de Maio e outras ruas do centro de Campinas acordam como sempre. Antes que as principais vias de comércio popular da cidade sejam tomadas pela multidão, dezenas de moradores de rua vão se levantando aos poucos, depois de sobreviver a mais uma noite gelada.

Uma cena chama a atenção. Na porta de uma loja dedicada à música, e ao lado de uma imagem pichada do maestro Antônio Carlos Gomes, principal referência artística local, um cidadão continua dormindo, alheio aos pouco mais de 10 graus que fazem na manhã do dia em que a cidade comemora mais um aniversário.

Segurança social é tudo o que os moradores de rua, de Campinas ou outra grande cidade brasileira, aparentemente não têm. Mas a Constituição Federal, em seu artigo 196, é clara: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

Fórum da População em Situação de Rua busca ampliar o debate e dar visibilidade ao tema em Campinas (Foto Adriano Rosa)

Fórum da População em Situação de Rua busca ampliar o debate e dar visibilidade ao tema em Campinas (Foto Adriano Rosa)

Artigo 23

1. Todo ser humano tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego.
2. Todo ser humano, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho.
3. Todo ser humano que trabalha tem direito a uma remuneração justa e satisfatória que lhe assegure, assim como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana e a que se acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social.
4. Todo ser humano tem direito a organizar sindicatos e a neles ingressar para proteção de seus interesses.

O dia 11 de novembro de 2017 tornou-se uma data tristemente histórica para os trabalhadores brasileiros. Naquele dia entrou em vigor a Lei 13.467, com os termos da reforma trabalhista proposta pelo governo do presidente Michel Temer e aprovada pelo Congresso Nacional. “A reforma derrubou vários direitos que vinham sendo defendidos por documentos como a Declaração Universal dos Direitos Humanos e consagrados pela legislação brasileira”, lamenta Antônio Augusto Queiroz, diretor de Documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP).

“A“Reforma” Trabalhista, materializada pela Lei 13.467/2017, foi pensada para reduzir custos do empregador, ampliar o lucro e a competitividade das empresas, além de facilitar a precarização das relações de trabalho e o enfraquecimento da representação sindical. Só vale a lei de proteção ao trabalhador quando o acordo ou a convenção coletiva não dispuser em sentido diferente”. Assim o DIAP resumiu a nova lei, no primeiro parágrafo da cartilha “Reforma trabalhista e seus reflexos sobre os trabalhadores e suas entidades representativas”.

Em 62 páginas o documento, editado pouco depois da publicação da nova legislação, comentou os vários efeitos diretos sobre os direitos dos trabalhadores no Brasil. Flexibilização de direitos trabalhistas previstos legalmente, resguardados apenas os que estão escritos na Constituição Federal; ampliação das possibilidades de terceirização e pejotização (contratação do trabalhador como pessoa jurídica e sem vínculo empregatício); criação de novas formas de contratação, especialmente o autônomo exclusivo e o intermitente; restrições de acesso à Justiça do trabalho; e retirada de poderes, atribuições e prerrogativas das entidades sindicais – estes foram apenas alguns dos impactos negativos elencados pelo DIAP (aqui).

Dados do Observatório Digital de Saúde e Segurança do Trabalho (aqui), iniciativa da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e Ministério Público do Trabalho (MPT), permitem um painel das condições de trabalho no Brasil. Desde 2012, segundo o Observatório, foram registrados 4,2 milhões de acidentes de trabalho no país, com a ocorrência de mais de 15.600 mortes. Foram mais de 34 mil casos de amputação decorrentes de acidente de trabalho e mais de 530 mil casos de fraturas.

Por sua vez, o Observatório Digital do Trabalho Escravo no Brasil (aqui), também resultado de parceria entre OIT e MPT, revelou que entre 2003 e 2017 foram registrados 43.696 resgates de trabalhadores em situação de escravidão no país.  Os municípios com maior prevalência de resgates foram Confresa/MT, com 1.348, seguido de Ulianópolis/PA (1.288), Brasilândia/MS (1.011), Campos dos Goytacazes/RJ (982) e São Desidério/BA (967). O Pará liderou o ranking, com 9.918 pessoas resgatadas, seguido do Mato Grosso, com 4.356 cidadãos resgatados da condição análoga a trabalho escravo.

Artigo 24


Todo ser humano tem direito a repouso e lazer, inclusive a limitação razoável das horas de trabalho e a férias remuneradas periódicas -

A reforma trabalhista, nos termos da Lei 13.467/2017, também afetou o direito ao repouso e lazer, alerta o diretor de Documentação do DIAP, Antônio Augusto Queiroz. Ele cita a cartilha “Reforma trabalhista e seus reflexos sobre os trabalhadores e suas entidades representativas”, na página 41: “É assegurado ao trabalhador, em qualquer atividade contínua, cuja duração exceda seis horas, um intervalo para alimentação ou repouso, que poderá ser reduzido. Antes da “reforma”, o intervalo era de, no mínimo, uma hora, e, no máximo, de duas horas diárias, podendo ser superior por acordo entre as partes. Com a nova lei, acordo ou convenção coletiva poderá reduzir esse intervalo para 30 minutos. E nas jornadas situadas entre 4 e 6 horas, é obrigatório um intervalo de 15 minutos. Exceto em situações que não prejudiquem a saúde e que sejam vantajosas para o trabalhador, como nos casos de refeições servidas no local de trabalho ou próximo ao serviço e o empregado puder deduzir esse tempo de sua jornada normal, não se deve aprovar acordo ou convenção coletiva com essa finalidade. Destaque-se que o período de 30 minutos não atende às necessidades físicas de recomposição, trazendo riscos ao trabalhador”.

Jane Valente é referência nacional e internacional em serviços de acolhimento familiar (Foto Martinho Caires)

Jane Valente é referência nacional e internacional em serviços de acolhimento familiar (Foto Martinho Caires)

Artigo 25


1. Todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e à sua família saúde, bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis e direito à segurança em caso de desemprego, doença invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle.
2. A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozarão da mesma proteção social.

O direito à saúde é constantemente ameaçado no Brasil, como demonstram as milhares de vítimas anuais das Doenças Tropicais Negligenciadas, assim classificadas pela Organização Mundial da Saúde e também conhecidas como doenças da pobreza. Foram, por exemplo, 1,6 milhão de casos prováveis de dengue no Brasil em 2015 e 1.483.623 casos em 2016. O Brasil também se destaca por ser o segundo país com maior número de casos de hanseníase (foram 25,2 mil casos em 2016) no mundo, atrás apenas da Índia, e o país com 90% dos casos de leishmaniose na América Latina, conforme a Organização Panamericana da Saúde.

O drama enfrentado pelos portadores da Doença de Chagas é um emblema do sofrimento que as Doenças Tropicais Negligenciadas ainda causam em território brasileiro. “Quando eu me agachava, era um terror ter que levantar”, lembra Osvaldo Rodrigues da Silva, que soube muito tarde ser portador da doença.

A descoberta veio por volta de 1985, quando teve um Acidente Vascular Cerebral (AVC) e os exames revelaram a Doença de Chagas. “É uma doença invisível e por isso muito traiçoeira”, resume Osvaldo, que passou a se tratar na Unicamp e diz ter melhorado muito.

O mesmo não pode afirmar, porém, de muitos de seus amigos, co-fundadores, em 2000, da Associação dos Portadores da Doença de Chagas de Campinas e Região (ACCAMP). “Vários dos ex-diretores infelizmente já morreram. Mas vamos continuar a luta”, afirma Osvaldo.

Desafios continuam, também, na garantia dos direitos das crianças e adolescentes, apesar dos vários avanços em termos legais, após a promulgação da Constituição Federal de 1988. Como nota a assistente social Jane Valente, especialista em violência doméstica contra a criança e o adolescente pelo Laboratório de Estudos da Criança (Lacri) da Universidade de São Paulo (USP), a década de 1980 foi caracterizada pela importante participação dos movimentos sociais em um processo que inaugurou uma série de novas relações na sociedade pela via dos direitos, culminando com a nova Constituição pós-ditadura.

Com o novo texto constitucional, destaca Jane Valente, “são ampliados os direitos e garantias individuais em várias áreas”. Na sequência, a aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) em 1990, ratificando a Convenção dos Direitos da Criança de 1989, “amplia a direção na implantação de serviços, programas e ações em benefício dessa população. Destaca-se o avanço da Educação passando a ser considerada como dever do Estado, a criação na Saúde, do Sistema Único de Saúde (SUS), também do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), que junto com a saúde e a previdência social compõe a política de seguridade social”.

Um ponto relevante na proteção dos direitos da infância e juventude, ressalta, são os estudos nacionais e internacionais confirmando que a institucionalização deve ser evitada no caso das crianças mais vulneráveis, eventualmente afastadas de seus lares, e este tema, amparado pelo Marco Legal pela Primeira Infância, aprovado em 2016, “apresenta recentes mudanças significativas ao Estatuto da Criança e do Adolescente, ampliando o direito de cuidado desde a gestação, tentando evitar a retirada de bebês e de crianças até seis anos de idade”.

Autora do livro “Família Acolhedora – As relações de cuidado e de proteção no serviço de acolhimento” (Paulus), Jane sublinha que, a partir da aprovação da Política Nacional de Assistência Social (PNAS/2004), o acolhimento familiar, assumindo o caráter de serviço público continuado, passa a ser regulamentado para a sua implementação em todo o território nacional.

Além disso, lembra a especialista, o serviço de acolhimento em família acolhedora foi também reafirmado com a mudança provocada pela aprovação da Lei nº 12.010/09, que alterou o ECA e pela qual os serviços de acolhimento em famílias acolhedoras passaram a ter preferência ao acolhimento institucional (artigo 34 § 1º). A partir da lei 13257/16,  que dispõe sobre políticas públicas para a primeira infância, foi também regulamentado o recurso para as famílias acolhedoras, em forma de bolsa auxílio,  para os gastos com a criança e o adolescente.

Existe, portanto, todo um aparato legal para a consolidação da família acolhedora, para receber crianças em situação de alta vulnerabilidade, mas na prática é diferente, lamenta Jane. “Na atual conjuntura do país, existindo poucos serviços dessa natureza, a segunda opção costuma ser a regra: as crianças e adolescentes que recebem medida protetiva de separação dos pais, por proteção, são encaminhadas a serviços de acolhimento institucional (abrigamento). Porém, órgãos de defesa nacionais e internacionais apontam a partir de renomadas pesquisas os malefícios da vida em instituição, em todos os aspectos do desenvolvimento humano”, reitera a especialista, consultora da Rede Latino-Americana de Acolhimento Familiar (Relaf).

O último censo nacional dos serviços de acolhimento apresentados pelo Ministério de Desenvolvimento Social (MDS, 2018), salienta Jane Valente, revelou a existência de 30.952 crianças e adolescentes acolhidos, sendo somente 1.075 em famílias acolhedoras.

Garantia da educação infantil ainda é um drama  no Brasil (Foto Adriano Rosa)

Garantia da educação infantil ainda é um drama no Brasil (Foto Adriano Rosa)

Artigo 26


1. Todo ser humano tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior, esta baseada no mérito.

2. A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos do ser humano e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz.
3. Os pais têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus filhos.

O direito à educação também não tem sido verificado em plenitude no Brasil, apesar dos avanços já verificados. Por exemplo, a meta nº 9 do Plano Nacional de Educação (PNE), instituído pela Lei n. 13.005, de 2014, estipulou a redução da taxa de analfabetismo para 6,5% em 2015 e a sua erradicação até 2024. Em 2016, contudo, a taxa nacional de analfabetismo das pessoas de 15 anos ou mais de idade foi estimada em 7,2%, o equivalente a 11,8 milhões de analfabetos, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD), do IBGE. Na Região Nordeste a taxa de analfabetismo em 2016 era de 14,8%.

A PNAD Contínua evidenciou desigualdades marcantes. Para as pessoas brancas de 15 anos ou mais de idade, a taxa nacional passou de 4,2% para 4,0%, entre 2015 e 2016, enquanto que entre as pessoas pretas ou pardas, ela caiu de 9,9% para 9,3%.Marcelo das Histórias: pela Cultura Viva Comunitária (Foto Martinho Caires)

Marcelo das Histórias: pela Cultura Viva Comunitária (Foto Martinho Caires)

Artigo 27


1. Todo ser humano tem o direito de participar livremente da vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar do progresso científico e de seus benefícios.

2. Todo ser humano tem direito à proteção dos interesses morais e materiais decorrentes de qualquer produção científica literária ou artística da qual seja autor.

Universitários dialogando com a cultura griô, orquestra de violinos na favela da Mangueira (RJ), mídia livre, quilombolas trabalhando com cultura digital, pontinhos de cultura para crianças – estes foram alguns ingredientes da teia da Cultura Viva, que passou a ser esvaziada no governo de Michel Temer, após o impeachment da presidente Dilma Rousseff.

Cultura Viva é o conceito que evoluiu e se tornou política pública em vários países do continente a partir da experiência implementada na gestão de Gilberto Gil no Ministério da Cultura, no governo de Luis Inácio Lula da Silva. O apoio e a valorização de projetos e produtos culturais nascidos das comunidades são um dos pilares do Cultura Viva, destaca Marcelo Ricardo Ferreira, o Marcelo das Histórias.

Coordenador do Ponto de Cultura Nina e da Rede Usina, ambos de Campinas, Marcelo foi um dos organizadores do III Congresso Latino-Americano de Cultura Viva Comunitária, realizado entre os dias 20 a 26 de novembro de 2017 em Quito, no Equador. Para Marcelo das Histórias, a Cultura Viva Comunitária é uma resposta e um roteiro a seguir, para a superação do paradoxo que marca a riqueza artística e cultural do Brasil.

“O Brasil é um país bem contraditório é explícito na sua vida cultural e científica. Para uma parcela bem pequena da população brasileira que lucra e usufrui da globalização de consumo e comportamento, podemos supor que exerce seus direitos culturais e o acesso aos benefícios científicos. Mas se olharmos com rigor para a história de nossa nação e os seus resultados presentes, veremos que a maioria da nossa população tem seus direitos culturais e científicos suprimidos de forma brutal”, ressalta Marcelo.

O advogado Paulo Mariante em reunião do Conselho Municipal de Direitos Humanos de Campinas (Foto José Pedro S.Martins)

O advogado Paulo Mariante em reunião do Conselho Municipal de Direitos Humanos de Campinas (Foto José Pedro Soares Martins)

Artigo 28

Todo ser humano tem direito a uma ordem social e internacional em que os direitos e liberdades estabelecidos na presente Declaração possam ser plenamente realizados -

Para muitos defensores dos direitos humanos, a existência e a permanência de uma ordem internacional marcada pela assimetria no respeito aos direitos básicos de cidadania são uma das causas fundamentais das violações que continuam sendo cometidas em grande parte do planeta.

Para o advogado Paulo Tavares Mariante, Conselheiro Suplente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana de São Paulo (CONDEPE), de fevereiro de 2011 a março de 2013, é preciso considerar que a Declaração Universal “encontra limites bastante objetivos em uma ordem econômica injusta, num sistema capitalista concentrador de riqueza e espoliador da classe trabalhadora e da maioria dos povos pelo planeta”.

Artigo 29


1. Todo ser humano tem deveres para com a comunidade, na qual o livre e pleno desenvolvimento de sua personalidade é possível.

2. No exercício de seus direitos e liberdades, todo ser humano estará sujeito apenas às limitações determinadas pela lei, exclusivamente com o fim de assegurar o devido reconhecimento e respeito dos direitos e liberdades de outrem e de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar de uma sociedade democrática.
3. Esses direitos e liberdades não podem, em hipótese alguma, ser exercidos contrariamente aos objetivos e princípios das Nações Unidas.

Todos, indivíduos, sociedade e governos, têm o dever de defender os direitos humanos, mas para o fundador e presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos, Jair Krischke, essa missão enfrenta maiores dificuldades considerando que “no Brasil o maior violador desses direitos é o Estado”.

É o Estado brasileiro, “considerando a União, os governos estaduais e municipais, que viola os direitos humanos básicos porque não cuida das crianças, porque abandona os idosos a sua própria sorte, porque não cuida da educação e nem da saúde”, continua. “Estamos atrasadíssimos nisso e então todos temos o dever de cobrar do Estado, do presidente da República, dos governadores e prefeitos, seja de que partido for, para que os direitos previstos em documentos como a Declaração Universal e na própria Constituição Federal sejam respeitados”, completa Krischke.

Parada do Orgulho LGBT, no centro de Campinas: luta por direitos avança em vários espaços (Foto José Pedro Soares Martins)

Parada do Orgulho LGBT, no centro de Campinas: luta por direitos avança em vários espaços (Foto José Pedro Soares Martins)

Artigo 30


Nenhuma disposição da presente Declaração poder ser interpretada como o reconhecimento a qualquer Estado, grupo ou pessoa, do direito de exercer qualquer atividade ou praticar qualquer ato destinado à destruição de quaisquer dos direitos e liberdades aqui estabelecidos -

Acadêmicos e defensores dos direitos humanos consideram que o artigo 30 da Declaração, assim como os outros 29, dependem muito de uma reforma no próprio sistema internacional de proteção aos direitos humanos. Este seria um grande desafio para o século 21.

O líder indígena Ailton Krenak é mais cético. “O que nós temos visto não é o respeito à Declaração Universal dos Direitos Humanos ou, no caso brasileiro, à Constituição. Pelo contrário, é por exemplo o avanço do genocídio do povo Kaiowá-Guarani e a continuidade de práticas anti-indígenas, apesar de todos os alertas nas Nações Unidas, que não conseguem fazer nada diante do poder dos Estados Unidos e das corporações”, denuncia Krenak.

O presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos (MJDH), Jair Krischke, entende ser muito saudável, para o presente e futuro da democracia brasileira, o resgate dos conceitos associados a direitos humanos. “Em todos os nossos países vizinhos, como Argentina e Uruguai, há um respeito muito grande com a noção de direitos humanos. No Brasil, não. Aqui direitos humanos ganharam um sentido pejorativo e muito disso se deve à ação de comunicadores de rádio e televisão que há muito tempo vinculam direitos humanos com direitos de bandidos, distorcendo e esvaziando completamente o seu significado”, protesta Krischke. Para ele, grande parte da tarefa de recuperação da essência dos direitos humanos no Brasil está nas mãos dos profissionais que praticam o jornalismo ao pé da letra, com investigação profunda, espírito crítico e contextualização dos fatos.

 

 

Sobre ASN

Organização sediada em Campinas (SP) de notícias, interpretação e reflexão sobre temas contemporâneos, com foco na defesa dos direitos de cidadania e valorização da qualidade de vida.

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