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CCJ do Senado aprovou mudança na lei ambiental no dia em que CNI sugeriu a Temer “simplificar o licenciamento”
Entidades estão atentas às mudanças que estão sendo articuladas em Brasília (Foto Adriano Rosa)

CCJ do Senado aprovou mudança na lei ambiental no dia em que CNI sugeriu a Temer “simplificar o licenciamento”

A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado Federal aprovou na última quarta-feira, 27 de abril , a PEC 65/2012, que flexibiliza o licenciamento ambiental, o que provocou forte reação em todo Brasil. A medida aconteceu no mesmo dia em que a Confederação Nacional da Indústria (CNI) entregou ao vice-presidente Michel Temer (PMDB) um pacote com 36 propostas, inclusive “simplificar o licenciamento ambiental”. Desde 2006 a CNI propõe mudanças no licenciamento ambiental.

O conjunto de propostas denominado “Agenda para o Brasil sair da crise 2016″ foi entregue a Temer pelo presidente da CNI, Robson Braga de Andrade, mesmo antes da definição pelo Senado sobre o pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT). “A saída da grave crise econômica por que passa o país exige a adoção de uma série de medidas na área fiscal e de aumento da competitividade”, justificou o presidente da CNI.

As 36 propostas foram elencadas em oito eixos: “Eficiência do Estado para garantir a sustentabilidade fiscal”, “Assegurar a segurança jurídica nas relações de trabalho”, “Reforma tributária”, “Acelerar o processo de concess ao setor privado na infra-estrutura”, “Priorizar as exportações como motor do crescimento”, “Regularizar as condições de crédito às empresas”, “Inovação” e “Segurança jurídica e regulação”, onde está incluída a Proposta 31, sobre “Simplificar o licenciamento ambiental”.

A ação referente a esta proposta seria “Conferir racionalidade ao processo de licenciamento ambiental por meio da instituição de procedimentos diferenciados e específicos às categorias de enquadramento dos empreendimentos e atividades, considerando sua natureza, porte e potencial poluidor”. E o CNI deu esse justificativa para a proposta: “O aprimoramento do licenciamento ambiental passa necessariamente pelo tratamento diferenciado dado aos empreendimentos, considerando critérios como natureza, porte e potencial poluidor. O estabelecimento de critérios para uma classificação bem elaborada dos empreendimentos e atividades orientará os entes federativos na definição de procedimentos diferenciados, em especial para micro e pequenas empresas e atividades de baixo impacto ambiental e para empreendimentos de infraestrutura, promovendo maior agilidade, segurança e menores custos relacionados ao processo de licenciamento”.

E completou: “Ao considerar a classificação do empreendimento com base em seu porte, potencial poluidor e natureza, o órgão licenciador pode definir procedimentos específicos para o licenciamento ambiental de cada atividade, incluindo o tipo de estudo ambiental, simplificado ou mais complexo, e prazos de análise diferenciados. Deve considerar ainda as especificidades setoriais em razão da sua natureza e das características intrínsecas ao seu processo produtivo. Especial atenção deve ser dada para atividades de interesse social ou utilidade pública, como geração de energia, exploração de bens de domínio público e exploração de petróleo e gás”.

É possível perceber, portanto, que a proposta de flexibilização do licenciamento ambiental feita pela CNI, ao vice-presidente Michel Temer, antes da definição do processo de impeachment pelo Senado, tem relação sobretudo a três áreas da economia: geração de energia, exploração de bens de domínio público e exploração de petróleo e gás.

As propostas foram entregues na última quarta-feira, dia 27 de abril, quando a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado Federal aprovou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) de nº 65, de 2012, de autoria do senador Acir Gurgacz (PDT-RO) e relatoria do senador Blairo Maggi (PR-MT), com importante alteração na legislação ambiental brasileira. Uma mudança que, para a Associação Nacional de Órgãos Municipais de Meio Ambiente (ANAMMA) representa “um retrocesso na legislação ambiental sem precedentes na história do Brasil”, como noticiou a Agência Social de Notícias (ver aqui).

A PEC 65, ao acrescer o parágrafo 7º ao artigo 225 da Constituição Federal de 1988, estabelece que, a partir da simples apresentação de um Estudo Impacto Ambiental (EIA) pelo empreendedor, nenhuma obra, objeto de licenciamento de licenciamento ambiental, pública ou privada, poderá mais ser suspensa ou cancelada, a não em face de fato superveniente.

A consequência prática é que, com essa mudança, é afastado o tradicional processo em três fases do licenciamento ambiental atualmente estipulado na legislação brasileira. Na primeira fase, quando é elaborado Estudo de Impacto Ambiental, é emitida a Licença Prévia, que atesta a viabilidade da obra. A Licença de Instalação caracteriza a segunda fase. E por último a Licença de Operação, que atesta o cumprimento, no decorrer da obra, que esta observou todas as condicionantes e restrições impostas pelas licenças anteriores. A flexibilização, nos termos aprovados pela CCJ do Senado, acontece dessa maneira de uma forma muito mais radical do que pedia a CNI.

Setor energético tem especial atenção por parte da indústria (Foto Adriano Rosa)

Setor energético tem especial atenção por parte da indústria (Foto Adriano Rosa)

Desde 2006 – Na realidade, há pelo menos dez anos a CNI defende mudanças no processo de licenciamento ambiental. Em agosto de 2006, o Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) realizou reunião em São Paulo, para discutir, com representantes do empresariado e sociedade civil, questões ligadas ao licenciamento ambiental.

Nesse encontro, a CNI apresentou várias propostas de mudança no licenciamento ambiental em vigor no Brasil. Quanto ao Estudo de Impacto Ambiental (EIA), a Confederação Nacional da Indústria observou, por exemplo, que ele deveria ser “instrumento de tomada de decisão, que integre as variáveis ambientais, econômicas, sociais e tecnológicas”. O EIA também deveria, na visão da CNI, “Promover a adoção de métodos e técnicas nos processos produtivos para se obter o produto com menor impacto ambiental possível” e, ainda, “Viabilizar a atividade econômica, apontando mecanismos para sua instalação com menor impacto ambiental”.

A CNI fez, então, uma série de críticas à forma como o EIA, na sua ótica, vem sendo praticado no Brasil: “Ganha uma dimensão desproporcional”, “Desvirtua-se da sua função preventiva” e “Contamina-se com o processo cartorial do licenciamento”, entre outras.

Quanto ao processo de licenciamento ambiental como um todo, a CNI também manifestou várias críticas à forma como vem sendo praticado no Brasil. Na sua opinião, o licenciamento “tem aplicação dissociada de todo um programa de desenvolvimento econômico-social, fazendo análises pontuais” e “Ganha feições de um instrumento de negociação para preencher lacunas advindas do enfraquecimento institucional”.

Ainda em 2006, a CNI promoveu o I Encontro Nacional da Indústria (ENAI), quando propôs claramente a simplificação do licenciamento ambiental no Brasil, com o objetivo de que “harmonize as exigências para a obtenção das licenças ambientais nos Estados, incluindo a definição de critérios de inserção de condicionantes sociais e os seus limites”.

O workshop sobre Meio Ambiente, realizado durante o ENAI 2006, concluiu que “O elevado número de normas e sua complexidade, ao lado do poder discricionário dos órgãos públicos, são os principais obstáculos a serem removidos”. Entre os desafios elencados, estavam “Rever os marcos regulatórios de meio ambiente” e “Simplificar os procedimentos de obtenção de licença ambiental”.

A temática vem fazendo parte, portanto, da agenda da CNI há pelo menos dez anos, e voltou a ser discutida em ENAIs posteriores. E agora a Confederação volta ao tema, na oportunidade de eventual impeachment da presidente Dilma e de posse do vice-presidente Michel Temer. (Por José Pedro Martins)

 

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